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Espiando o poder: análise diária da grande imprensa
Foto: Pablo Jacob/O Globo
Por Luis Edmundo Araujo, colunista do Cafezinho
O ministro da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima (PMDB), ainda não caiu, continua no cargo de acordo com o desejo do presidente Michel Temer, que por ele não tocaria mais no assunto. Geddel pressionou o então colega na Cultura, Marcelo Calero, a liberar a construção de um espigão na costa da Bahia, repleta de infrações ao meio ambiente, ao patrimônio histórico e ao bom senso em geral. Geddel tinha comprado um apartamento no prédio em questão, e o caso dele não ocupa mais qualquer manchete da grande imprensa nas edições de hoje. Vai em chamada lateral, enquanto as manchetes do Estado, da Folha de São Paulo e do Valor mostram o avanço e a persistência da crise atual, e a do Globo revela, de novo com atraso de seis, sete anos, no mínimo, mais uma travessura do ex-governador Sergio Cabral. Ao lado, em espaço bem maior que o destinado à notícia principal, o jornal carioca diz que “Cidade de Deus pode ter Força Nacional”, e mostra na capa a dor de uma esposa e de uma filha com mais uma morte pela guerra de todo dia no falido Rio de Janeiro, essa do lado policial.
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“Um dia após morte de PMs em queda de helicóptero, sete corpos são achados em mata”, diz o subtítulo na primeira página do Globo. E a foto aí de cima, do pai de um dos mortos encontrados no matagal, assim como a do velório coletivo das sete vítimas, improvisado na principal praça da comunidade, do mesmo fotógrafo, vai nas páginas de dentro. “A crise da segurança pública, agravada pelo estado de calamidade do Rio, ganhou contornos mais dramáticos desde a queda de um helicóptero que matou quatro policiais militares, no sábado à noite, na Avenida Ayrton Senna, em Jacarepaguá” afirma o texto da matéria.
Ainda segundo o Globo, “a região está explosiva desde sexta-feira, quando os conflitos entre traficantes da Cidade de Deus e milicianos da Gardênia Azul viraram uma guerra que tem tirado a paz de moradores do local e de motoristas que atravessam diariamente a Linha Amarela — fechada duas vezes só anteontem.” Na chamada da primeira página, o jornal informa que a “perícia preliminar não constatou marcas de tiros nos destroços” e logo em seguida, depois da vírgula, fecha o texto da capa sobre o assunto mantendo todas as possibilidades ao dizer que a aeronave “pode ter caído por uma pane mecânica ou ter sido alvejada por traficantes”.
O secretário de Segurança Pública do Rio de Janeiro, Roberto Sá, não descarta qualquer possibilidade, e no clima de guerra instaurado o Globo informa que “o ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, disse que a tropa da Força Nacional no estado, que conta com cerca de 500 homens, poderá ajudar nas operações policiais na Cidade de Deus, que está ocupada por tempo indeterminado.” No blog Tijolaço, o jornalista Fernando Brito afirma que “a medida mais lógica, mais racional, óbvia, é tirar as armas de circulação e por fim à banalização dos fuzis que entram pelas fronteiras ou são traficados por marginais dentro da Polícia e até das Forças Armadas.”
“Só que isso não dá manchete em jornal, não dá ibope, não dá gritos histéricos pela intervenção militar”, continua Brito, no texto intitulado “Guerra é coisa de bandido, não de polícia”, para afirmar que a adoção das tais medidas sugeridas por ele também “nem alimenta o ódio, matéria prima sobre a qual brotam, como cogumelos, os demagogos do ‘bandido bom é bandido morto’, bordão do famigerado Sivuca, que ganha uma versão “globalizada” no urro de outro comentarista do Extra. ‘Bolsonaro Trump já 2018!’ Quem sabe sugiram-se muros, cercas, postos de controle, como aos mexicanos?”
E se todo o alto da uma página do Globo é dedicado aos perfis e fotos dos policiais mortos na queda do helicóptero, embaixo vai o título da matéria auxiliar em que “Temer lamenta a morte de PMs, e Anistia critica alta letalidade policial”. Na página ao lado, somente três das sete vítimas do tráfico são identificadas no pé da matéria, onde o pai de uma delas conta que “‘foram cem pessoas lá pegar os corpos. Eles estavam deitados de costas. Meu filho tinha as mãos na cabeça. A maioria tinha tiros nas costas e na cabeça. Eles foram executados e a perícia vai mostrar’, acusou o pastor Leonardo Martins da Silva, pai de Leonardo da Silva Junior, de 22 anos.”
Se a chance de um tiro ter derrubado o helicóptero dos policiais não é descartada, também não pode ser a de que uma pane teria sido o motivo da queda, haja visto o caos financeiro que acomete no momento o estado do Rio de Janeiro. “Esquema de Cabral teve propina paga no exterior”, diz a manchete do Globo a mostrar um dos motivos principais da penúria atual. Nos dois subtítulos, o jornal informa que “delação da Odebrecht vai revelar depósitos constantes” e que “no governo Cabral, Odebrecht atuou na reforma do Maracanã e na construção do Arco Metropolitano, da Linha 4 do metrô e do Comperj”.
“Garotinho é operado e recebe stent”, diz outra chamada do Globo, sem mais qualquer informação sobre o caso a não ser na página de dentro onde é dito que “o ex-governador Anthony Garotinho fez ontem uma angioplastia, procedimento para desobstruir artérias, e implantou um stent, tubo que tem o objetivo de evitar novas obstruções”. Garotinho estava com uma artéria entupida durante as cenas deprimentes de sua reação à transferência para Bangu. A transferência foi considerada desnecessária pela própria Justiça Eleitoral, que autorizou o ex-governador a retornar ao hospital, e diante do estresse daquela ocasião o ex-governador poderia, de fato, sofrer um infarto.
Isso, porém, não é sequer cogitado pelo Globo, que publicou e republicou no dia seguinte a imagem de Garotinho se debatendo na maca, a segunda delas ao lado de um minieditorial em que o jornal repudiava justamente a farta exibição das fotos e vídeos envolvendo os ex-governadores. E na edição de hoje, na seção “imagens da semana”, o jornal carioca publica mais uma vez o marido da prefeita de Campos, Rosinha Garotinho, se debatendo na maca, ao lado do colega preso, Sergio Cabral.
Aliado de outros tempos, governador poupado de denúncias ao longo dos quase oito anos em que governou o estado, Cabral ocupa a manchete e a charge da capa do Globo, mais a página inteira da abertura da editora nacional, bem mais espaço, por exemplo, do que o destino ao caso de Geddel, que recebeu a chamada de capa mais embaixo, a dizer que “avaliação ética de Geddel deve ser rápida”. “Presidente de comissão diz que casos rumorosos pedem decisões rápidas. Geddel é acusado de usar cargo em benefício próprio”, completa o texto sobre o tema na primeira página.
Lá dentro, o jornal carioca usa as palavras de “um assessor do presidente” para dizer que “o desgaste é claro. Se o presidente mantiver Geddel no cargo, corre o risco de o assunto se arrastar e ter novos desdobramentos. Se resolver demiti-lo, é mais um ministro que cai, o que nunca é bom para o governo”. A matéria continua contando que “na base aliada, o clima também era de cuidado”, mas não deixou de expressar a vontade de Temer na declaração do líder do PSDB no Senado, Paulo Bauer (SC). “‘O presidente aceitou a demissão do Marcelo Calero e as explicações do ministro Geddel. Então, pelo visto, a decisão já foi tomada’, afirmou Bauer.”
Dona da manchete que denunciou o caso, a Folha dá chamada no alto da capa e vai além na tarefa de mostrar qual o desejo do presidente para este caso ao afirmar que “Temer tentou esvaziar órgão que autoriza construções”. “O presidente Michel Temer (PMDB) quis criar a Secretaria Nacional de Patrimônio Histórico, que tiraria do Iphan a responsabilidade pelo licenciamento de obras” diz o jornal, para emendar informando que, “comprador de imóvel em edifício em área de proteção histórica, o ministro Geddel Vieira Lima (Governo) planejava emplacar colega na nova secretaria, em caso que motivou a renúncia do ministro da Cultura.”
Logo embaixo disso, Vinicius Mota escreve que “o escorpião ferroa mesmo quando o tempo pede recato”, chamando para o artigo de dentro, sob o título “A república em fatias”. “O ‘espírito do fatiamento’, alusão à manobra liderada por Ricardo Lewandowski e Renan Calheiros que deu à luz o impeachment sem pena de inabilitação, parece prestes a fecundar novas criaturas”, diz Vinicius no texto em que cita Geddel, fala também da corrida do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM) pela sua reeleição no cargo e critica Temer pela tentativa de desmembrar os julgamentos dele e da presidenta afastada Dilma Rousseff, ambos da mesma chapa.
É em Geddel, porém, que o texto se concentra, ainda que também não lembre da informação ignorada em todos os jornais da imprensa familiar a não ser o Jornal do Brasil, hoje unicamente digital, onde a colunista Heloisa Tolipan que “porpouco o roteirista Bruno Mazzeo, filho de Chico Anysio, não deixou a coluna passar batido. Escreveu ele: ‘Passando só pra lembrar que Geddel era um dos anões do orçamento. Porque vai que alguém esqueceu…’. É vero: o esquema conhecido como Anões do Orçamento, há uns 20 anos, no qual políticos manipulavam emendas parlamentes com o objetivo de desviarem o dinheiro através de entidades sociais fantasmas ou com a ajuda de empreiteiras, envolveu Geddel”.
E em meio às denúncias e desventuras do governo Temer, a crise avança, pondo fim à história da carochinha de que tudo iria melhorar, instantaneamente, com o impeachment de Dilma. Na manchete a Folha diz que “Banco do Brasil anuncia o fim de 14% de suas agências”. O Estadão trata do mesmo tema e afirma que “Banco do Brasil quer aposentar 18 mil e fechar 402 agências”. No subtitulo, o jornal avisa que o “plano de reestruturação ainda prevê redução de jornada de 6 mil funcionários”. O Valor alerta na manchete que “receita das empresas cai e mostra crise persistente”.
“Somada à inflação, a queda real da receita passa dos 10%”, afirma o jornal de economia, no subtítulo. Nada que tire o otimismo de Ricardo Noblat, do Globo, com os novos tempos. O colunista deixa de lado hoje a história de amor entre Temer e Marcela e, numa coluna bem mas opinativa do que informativa afirma, certamente convicto, que “a sociedade de junho de 2013, das gigantescas manifestações de ruas pelo impeachment, só tem feito avançar. Deixou para trás empresários e políticos do estado em ruína, do capitalismo de laços que resiste a sair de cena para dar lugar a um estado capitalista baseado na livre competição”.
“A corrupção não deixará de existir uma vez que se faça tal passagem. Mas ela será menor se comparada ao seu tamanho atual. Os empresários e políticos do regime ancião estão na contramão da História”, continua Noblat, que no entanto joga um pouco de trevas nos prognósticos de avanços ao dizer que “o governo Michel Temer é um paradoxo. Ao mesmo tempo em que se oferece como ‘uma ponte para o futuro’ é formado por legítimos representantes de um passado que pretende apagar.”
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