Por Pedro Breier, correspondente policial do Cafezinho
O ex-Casseta & Planeta Helio de la Peña sintetiza o pensamento do coxinha médio brasileiro após as prisões de Sergio Cabral, Garotinho e, antes deles, Eduardo Cunha.
Toda a crítica à lava jato cairia por terra com a prisão de alguns políticos de outros partidos que não o PT.
Em tempos de ódio político exacerbado e nervos à flor da pele, vamos tentar mostrar para os nossos amigos coxinhas, com calma e argumentos, que a coisa é bem mais complexa do que isso.
A prisão de figuras do PMDB – depois do golpe consumado e do derretimento do PT nas eleições – não muda um milímetro do que a lava jato fez de 2014 até as últimas eleições municipais: serviu de munição política para a direita derrubar o governo, trucidar o PT e destruir a reputação de Lula, líder nas pesquisas para as eleições de 2018.
Vazamentos seletivos (todos contra o PT) para a imprensa conservadora, que só podem ter partido da PF ou do MPF, utilizados para tentar influenciar as eleições de 2014 e depois para criar um clima de ódio ao governo e ao PT, clima este necessário para o sucesso do golpe; perseguição doentia a Lula, acusações surreais com bases pífias, espetáculos midiáticos autoritários e ilegais, como nos casos da condução coercitiva e da divulgação dos áudios; prisão de petistas sem base legal às vésperas das eleições municipais com a clara intenção de influenciar no pleito.
Nada disso some com a prisão de políticos de outros partidos. O governo eleito caiu, os derrotados na eleição estão no poder e o PT derreteu em boa parte graças à lava jato.
Quem quer uma justiça realmente justa, democrática, republicana, não pode achar normal que uma operação seja usada como munição pesada para atacar apenas um partido por tanto tempo.
Mas dizer que as críticas à lava jato se resumem a “é uma operação para perseguir o PT” é desonestidade intelectual. Há ao menos mais três críticas pesadas e consistentes à operação.
A primeira se refere à destruição de grandes empresas brasileiras, especialmente as empreiteiras.
E aqui não se trata de ‘defender’ as empreiteiras, que certamente incorreram em diversas ilegalidades para terem mais lucros, exatamente como faz praticamente qualquer grande empresa do mundo.
A diferença é que nos escândalos descobertos em grandes empresas de países como Alemanha ou EUA se teve todo o cuidado para preservar as empresas (responsáveis, afinal, por porcentagens consideráveis dos PIBs dos países) e consequentemente os empregos, punindo os executivos.
Destruir a economia nacional em nome do combate à corrupção é de uma estupidez inacreditável.
Nem mesmo se as empreiteiras estrangeiras que tomarão conta do espaço deixado por Odebrechdt, OAS e demais forem poços de ética, o que evidentemente não é o caso.
A segunda crítica irrefutável à lava jato trata dos seus métodos ‘medievalescos’, como definiu Teori Zavascki.
Prisões para investigar, para delatar e para execrar diante da opinião pública não são aceitáveis.
As prisões de Cunha, Garotinho e Cabral têm a mesma base frágil das prisões de petistas: são prisões antes do julgamento, ou seja, antes de que seja declarada a culpa do réu, sem que ficasse demonstrado que o preso estava atrapalhando as investigações (a prisão de Cabral foi sustentada até com trecho da Bíblia). Cunha claramente tentou atrapalhar as investigações, mas foi preso muitos meses depois, o que torna a prisão apenas ridícula. Todas espalhafatosas, midiáticas, simplesmente o estado policial mostrando seus músculos.
Então chegamos à terceira crítica além da seletividade anti-PT, talvez a mais relevante: a aliança da lava jato com a mídia corporativa.
Muitos diziam, de fato, que a lava jato iria parar no PT, mas boa parte dos analistas de esquerda previu que não seria assim, pois quando se dá poder demais ao sistema de justiça – que tem todo o aparato repressivo nas mãos – fica muito difícil controlá-lo.
E é o que estamos vendo. A lava jato agora concentra sua artilharia no PMDB, sob os holofotes da mídia conservadora. A parceria continua firme e forte. A Globonews inclusive passou o dia de hoje falando da aliança de Sérgio Cabral com Dilma, que na verdade não existe: Cabral apoiou Aécio em 2014 e orientou voto pelo impeachment, como lembrou Dilma em nota.
Por enquanto nada respingou no PSDB, apesar de Aécio ter sido citado por vários delatores como integrante dos mais variados esquema de corrupção, além de Serra e seus 23 milhões na Suíça. É o partido da direita orgânica, ligado umbilicalmente ao oligopólio midiático.
Mas as duas, mídia e lava jato, estão em sintonia no desejo de enquadrar a classe política, tutelá-la, submetê-la.
A mídia faz o trabalho diuturno de destruição da reputação dos políticos, para depois alçar o justiceiro Moro e seus templários do MPF à condição de salvadores da nação, que resolveriam todos os nossos problemas, causados pelos malditos políticos.
Ora, isso é péssimo.
Só a política pode corrigir a política: mais participação popular, mais informação livre, mais educação de qualidade, mais consciência para o povo.
Não é empoderando uma mídia reacionária e absurdamente concentrada na mão de meia dúzia de milionários, além de juízes e promotores que não respeitam direitos fundamentais e agem tresloucadamente, ajudando a afundar a economia do país, que vamos resolver qualquer coisa.
Isso é apenas o poder migrando dos representantes que bem ou mal foram eleitos através do voto direto da população para um punhado de pessoas poderosas não eleitas por ninguém.
Espero ter demonstrado que as críticas à lava jato vão muito além da simples perseguição ao PT (que claramente existe), amigo coxa.
Não precisa nem ser de esquerda para se juntar aos críticos da ascensão de um estado policial/midiático no Brasil.
Basta ter bom senso.