(Charge: Adam Zyglis/ The Buffalo News)
Americanexit
por Fernando Rosa, em seu blog
As grandes placas tectônicas do capitalismo mundial moveram-se nervosamente nas últimas horas. A eleição norte-americana escancarou a crise do neoliberalismo financeiro mundial como alternativa para os Estados Unidos e para o mundo. Uma espécie de Americanexit, a vitória de Donald Trump também traduz a mais profunda divisão da sociedade na história dos Estados Unidos.
O eleitor votou com Trump pela volta do “sonho americano”, da industrialização, dos empregos no país. Na porta da Ford, em Michigan, que anunciava transferência do parque industrial para o México, ele ameaçou taxar em 35% a importação dos carros. Como disse Michael Moore, Trump foi o “mensageiro” da insatisfação do “Cinturão Industrial” e seus trabalhadores.
Hillary Clinton perdeu a eleição pela evidência de suas relações com o sistema financeiro e com a indústria bélica que, em 15 anos e cinco guerras, consumiu US$ 4,6 trilhões. Também pelos apoios ao NAFTA e ao Tratado Transpacífico e outras políticas comerciais que destruíram milhares de empregos norte-americanos. Ela foi candidata a xerife do mundo, enquanto Trump defendeu os americanos.
A vitória de Trump, ou qualquer que fosse o resultado, não significa solução à vista, mas o aprofundamento dessa divisão nacional e mundial. Diante da reação do “mundo produtivo” de Trump, o sistema financeiro reagirá ferozmente, ampliando ainda mais a crise. Resta saber se ele terá condições políticas para resistir as pressões de Wall Street, do Pentágono e da indústria bélica, e impor suas ideias.
Ao contrário de temer (sem trocadilhos) suas consequências, o resultado da eleição de Trump traz um elemento positivo para a geopolítica mundial, presente nas suas declarações de campanha. A vitória do candidato republicano indica um processo de distensão internacional, especialmente em relação ao Oriente Médio, a Europa e a Rússia. No caso do Brasil, a situação dos golpistas entreguistas que apoiaram Hillary Clinton (vejam o vídeo abaixo) tende a se complicar.
É importante destacar a derrota da estratégia de guerra imediata contra a Rússia, com sistemáticos ataques ao presidente Putin, adotada por Hillary Clinton. Mal terminou a eleição, Putin defendeu “um diálogo construtivo entre Moscou e Washington” para corresponder “aos interesses dos povos dos nossos países e de toda a comunidade internacional”. Em vários momentos, Trump afirmou, por exemplo, que não gastaria mais dinheiro com a OTAN.
Acompanhando a mídia internacional, a mídia brasileira repetiu o ritual do “jornalismo de guerra” na defesa de Hillary Clinton. Durante a campanha eleitoral, trataram de ridicularizar e/ou demonizar o candidato republicano, incluindo a divulgação de notícias falsas. Frente a iminente derrota de sua candidata, passaram ao “jornalismo de terror”, tentando intimidar o mundo com “quebradeira” das Bolsas de Valores e do “mercado” – o financeiro, claro.
A eleição nos Estados Unidos também está prestando um grande serviço ao debate político e ideológico no mundo e, em particular no Brasil. O “nacionalismo” norte-americano flagrou a contradição de boa parte da esquerda brasileira que, ao invés de apoiar uma política de defesa da Nação, preferiu render-se ao neoliberalismo e a Hillary Clinton. Se o grande Império quer defender a sua economia, onde está o “crime” em defender a Nação brasileira?
A burguesia brasileira, que já anda chorando o “pato morto”, deveria também aprender a lição dos norte-americanos. Em vez de aliar-se ao rentismo predador e meter parte de sua classe na cadeia, deveria pensar no Brasil e somar-se em um esforço comum para industrializar o país. Não bastasse os problemas já existentes, imaginem os Estados Unidos elevando a taxa de juros e repatriando as suas indústrias.
Além da distensão política, a eleição norte-americana também pode significar um avanço na afirmação de um mundo multilateral, fundamental para a América Latina e para o Brasil. Ao contrário da globalização neoliberal, temos vocação para um internacionalismo solidário, com desenvolvimento e paz. Com independência e soberania, o caminho do Brasil é integrar-se solidamente ao BRICS, ao Mercosul, ao Continente Africano e outros fóruns econômicos e sociais.
Os golpistas nativos entraram num barco furado ao trocar as relações comerciais do país pela ideologia barata dos MBLs e outros “ideólogos”. Antigos e maiores parceiros como China, Rússia e países do Mercosul foram secundarizados pelo alinhamento servil aos Estados Unidos. A ponto de tentarem criminalizar a exportação de capitais nacionais, no caso da atuação das empreiteiras nos países africanos.
É hora, portanto, de ampliar a mobilização, afastar os golpistas do comando do país, e aproveitar essa oportunidade histórica que se abriu. Para isso, é urgente a construção de um amplo movimento, como disse Lula – popular e patriótico, comprometido com industrialização, desenvolvimento da ciência e da tecnologia, com a defesa nacional, promoção do mercado interno, garantia de empregos e a democracia brasileira. Façamos o Brasil cumprir sua vocação de Grande Nação.
Atenção ao tempo 6min52seg, quando o ministro das Relações Exteriores, José Serra, declara o voto à candidata derrotada de Hillary Clinton