O Tribunal de Justiça do Reino Unido, por meio da Justiça do Trabalho (Employment Tribunals), reconheceu nesta semana que os motoristas do Uber são funcionários da empresa, com vínculo empregatício — e não autônomos ou agentes empresariais, como afirmava o Uber.
A ação foi proposta por motoristas do Uber contra a principal controladora do aplicativo, com sede na Holanda, e também contra duas filiais que operam no Reino Unido: Uber London Ltd. e Uber Brittania Ltd.
Com a vitória, os motoristas têm agora direito às proteções garantidas pela legislação trabalhista do Reino Unido.
Desde sempre o Uber se apresentou como mero prestador de serviços ligados à tecnologia, mas o argumento não convenceu o Tribunal.
De acordo com o portal jurídico Jota:
O Tribunal adverte que qualquer organização (i) que gerencie uma empresa em cujo “coração” está a função de transportar pessoas em veículos motorizados, (ii) que opere em parte por meio de companhia que procura se desviar das responsabilidades “reguladas” aplicáveis aos transportadores privados – ou seja, os PHV – Private Hire Vehicle – operators – mas (iii) que exija dos motoristas e passageiros que concordem, por meio de contrato, que ela não provê o serviço de transporte e (iv) recorra, em seus documentos e cláusulas contratuais, a ficções, linguagem torcida (twisted language) e novas terminologias (brand new terminology) merece certo grau de ceticismo.
Ao aprofundar o mérito, o Tribunal considerou ser claro que a Uber oferta serviço de transporte e emprega os motoristas para esse fim, chegando a afirmar que a defesa da empresa, procurando negar tal fato, teria algo de ridículo: “The notion that Uber in London is a mosaic of 30,000 small businesses linked by a common platform is to our minds faintly ridiculous.”
Abaixo matéria do Nexo Jornal.
***
A decisão da Justiça britânica sobre o Uber e o impacto na economia de compartilhamento
Corte trabalhista decide que a empresa deverá arcar com salário mínimo e pagamento de férias de motoristas, entre outros benefícios
no Nexo Jornal
Uma corte trabalhista britânica decidiu na sexta-feira (28) que motoristas do Uber são funcionários da empresa de caronas pagas, e não apenas prestadores autônomos de serviços.
Isso significa que, a partir de agora, os donos do aplicativo deverão arcar com direitos trabalhistas, como salário mínimo, feriados e outros benefícios. O Uber afirma que vai recorrer.
A decisão é de primeira instância e vale, inicialmente, apenas para dois motoristas, com apoio da União de Trabalhadores Gerais e Municipais (GMB, na sigla em inglês). A partir dela, porém, os outros cerca de 40 mil motoristas ligados à empresa no Reino Unido poderão exigir os mesmos benefícios.
Assim como no Brasil, atualmente eles assinam um contrato no qual concordam com os termos da empresa para trabalhar como prestadores autônomos de serviço. Ou seja, sem vínculo empregatício e arcando com seus próprios custos e riscos.
Apenas em Londres, 2 milhões de passageiros utilizam o Uber. A empresa tem sede em San Francisco, nos EUA, e está presente em 480 cidades de 70 países.
A decisão é relevante não só no caso das caronas pagas. Ela diz respeito a discussões regulatórias que podem vir a afetar outras multinacionais do Vale do Silício, como a AirBnB, voltada para o aluguel de residências.
O que disse a Justiça do Reino Unido
Na decisão, os juízes afirmam que o Uber deve ser encarado como o empregador de motoristas porque:
- Os entrevista e contrata
- Controla com exclusividade informação-chave, como o sobrenome, o contato e o destino dos passageiros
- Define a rota que deverá ser utilizada
- Exige que motoristas aceitem trabalhos e não os cancelem, sob a pena de deslogá-los do aplicativo
- Define a taxa e impede que ela seja renegociada entre passageiro e motorista. “A suposta liberdade de concordar com uma taxa mais baixa é, obviamente, sem nenhum valor”, afirma a decisão
- Impõe condições como tipos de carros, instrui como os motoristas devem fazer seu trabalho e controla suas performances – através de um sistema de notas, por exemplo
- Não inclui motoristas sobre decisões relativas a descontos
- Lida com reclamações feitas contra motoristas
“A noção de que o Uber em Londres é um mosaico de 30 mil pequenos negócios ligados por uma ‘plataforma’ única é, para nossas mentes, ridícula (…) Os trabalhadores não podem negociar e não negociam com passageiros (…) Eles recebem [pedidos de] e aceitam viagens estritamente nos termos do Uber”
A economia do compartilhamento
Segundo Fabro Steibel, diretor-executivo do Instituto de Tecnologia e Sociedade e professor de economia criativa na ESPM Rio, essas companhias em geral afirmam que oferecem apenas a plataforma on-line pela qual vendedores de serviços – no caso do Uber, motoristas – se conectam a clientes no momento em que eles precisam.
O modelo de negócios se baseia em cobrar uma taxa sobre o faturamento de quem trabalha na ponta e lida com os clientes, sem arcar com custos como aquisição de veículos, celulares ou imóveis.
Com isso, terceirizam a responsabilidade por gastos que teriam para ampliar seus negócios, como aquisição de celular ou carros. A empresa pode, assim, crescer rapidamente, diz Steibel.
Para Rafael Zanatta, advogado que pesquisa a regulação de economias de compartilhamento, questionamentos legais sobre a essência do funcionamento de empresas como Uber ou Airbnb devem se tornar mais frequentes à medida que elas deixam de ser vistas como startups que oferecem pequenas facilidades e passam a ser encaradas como gigantes capazes de faturar somas enormes ao redor do globo.
“As pessoas começam a se perguntar por que essas empresas lucram bilhões por ano ao mesmo tempo em que tornam as condições de trabalho mais duras para quem está na ponta”, diz Zanatta.
No Reino Unido, a decisão ocorre no momento em que o departamento de Receita e Costumes, entidade responsável pela coleta de taxas no país, está criando uma unidade especial para investigar companhias com novos modelos de negócio que possam estar criando condições de trabalho desvantajosas para os prestadores de serviço.
Outros locais em que se discute o modelo do Uber
Essa não é a primeira vez que o Uber é questionado legalmente sobre a sua forma de funcionamento.
Atualmente, o vínculo entre motoristas de Massachusetts e Califórnia e a empresa está sendo julgado por uma corte californiana. O direito trabalhista neste Estado deve utilizar como base um teste de 11 perguntas, adotadas desde 1989 em discussões do tipo.
Entre as questões estão se o prestador de serviço realiza alguma outra ocupação para se manter e se usa os equipamentos – no caso, carros – exigidos pela empresa em seu trabalho.
O Uber tentou fechar um acordo de R$ 100 milhões com os motoristas que o processam nesses Estados. Mas ele foi rejeitado pelo juiz responsável em agosto de 2016 por ser muito abaixo dos US$ 854 milhões que a empresa potencialmente pagaria aos milhares de motoristas de Califórnia e Massachussetts caso perdesse a ação, segundo cálculos apresentados pelos autores da queixa.
Em outubro, uma corte em Nova York determinou que dois ex-motoristas do Uber poderiam requerer o seguro-desemprego. Dessa forma, ela não tratou especificamente sobre responsabilidades da companhia para com eles, mas indicou que o Estado os vê como funcionários.
Em dezembro, uma corte do Estado americano da Flórida teve uma decisão divergente daquela de Nova York, e não concedeu benefícios trabalhistas relativos a desemprego para dois ex-motoristas do Uber afirmando que eles eram prestadores de serviços, e não funcionários.
“O Uber não é um empregador para motoristas, assim como uma galeria de arte não é para artistas”, afirmaram os juízes na decisão.
Em sua defesa, o Uber tem argumentado que não é uma empresa de transportes, mas de tecnologia e que os funcionários têm liberdade para definir quantas horas e quando desejam trabalhar.
Para Rafael Zanatta, questionamentos do tipo devem passar a ocorrer na Justiça brasileira assim que uma parcela maior dos primeiros motoristas do Uber deixar a plataforma – ele avalia que não devem processá-la enquanto ainda há vínculos.
Marcus Costa
03/11/2016 - 23h59
Quero fazer um desabafo aqui. Sou militante de esquerda, não sou petista, sou Lula e sofri com o impeachment de Dilma.
Admirava demais o Haddad até a traição que ele cometeu contra os meus colegas de São Paulo.
O aplicativo modinha, o “Led que chegou para substituir a lamparina” (com aval inconteste de todo o povo), a “inovação tecnológica”, já começa a dar sinais de cansaço, de desgaste.
Haddad compactou contra uma classe de trabalhadores com mais de 100 anos de história, de luta, de espaço conquistado a duras penas. E fez isso em favor de quem? Logo de uma empresa Americana que explora seus próprios “parceiros”, na verdade, escravos. Cidadãos desempregados em sua maioria. Outros, movidos por ganância do lucro mais, a despeito de aniquilar toda a classe de trabalhadores.
A Uber vai passar. Não conseguirá subsistir à mentira que propaga travestida de “novos tempos”.
E você, cidadão de esquerda, que hoje vibra com nossa derrocada, prepare-se para a voracidade da Uber e de sua filosofia. Também não escapará. São como formigas corredeiras que onde passam não sobra nada. Está na zona de conforto hoje? Amanhã será outro dia. Temer vai passar, a Uber vai passar. Haddad já passou.
fausto
02/11/2016 - 18h45
Vão dizer que a Inglaterra é comunista.
Antonio Carlos
02/11/2016 - 16h42
Uber é uma empresa de transporte que se diz ser de tecnologia. E quando tiver os veículos autônomos vai conectar ao “carga” ao “ghost driver” ?????
Torres
02/11/2016 - 15h19
Uber vai ser regulamentado e vai perder motoristas e tb público.
O preço vai encarecer e quem vai pagar é o consumidor.