por J. Carlos de Assis
A tevê Globo apresentou na noite de terça-feira, em seu circo jornalístico das 20h, uma longa exposição sobre como nós, brasileiros, passamos a marca de R$3 trilhões em dívida externa no último mês, o que dá a um bebê que acabou de nascer dívida espantosa de R$ 15 mil. A pseudo-reportagem apresentada no circo global coincidiu com a votação em segundo turno da estupidez orçamentária conhecida como PEC-241, a qual, como todos sabem, se destina a controlar as contas públicas mediante congelamento de gastos públicos por 20 anos.
Decididamente, não quero perder tempo em explicar em detalhes a farsa que cerca as opiniões globais sobre dívida pública e o comportamento de picadeiro com que a maioria dos deputados votou pela aprovação da PEC. Basta dizer que, ao longo de toda a matéria, não se menciona nenhuma vez o peso dos juros extorsivos estabelecidos pelo Banco Central para engordar a dívida. Só no último ano, foram R$ 650 bilhões de juros e amortizações embutidos nos R$ 3 trilhões. Ao longo do tempo, quase toda a dívida resultou de juros.
Bom, agora vou explicar a mágica do endividamento obeso. O capacho da Globo que se apresentou como economista disse que, para ir pagando a dívida, o governo eleva os juros para atender à pressão do mercado. É a lei da oferta e da procura de dinheiro, certo? Errado. O governo paga dívida velha com dívida nova. Os novos títulos são oferecidos no mercado a uma taxa que o governo pode perfeitamente arbitrar. E se o mercado não quiser comprar os títulos? Simples, o governo manda o BC emitir moeda e injetar nas reservas bancárias.
Se é tão simples, por que o governo e o BC não fazem? A razão é que o BC não é uma instância realmente do governo, mas do mercado. Não viram falar que o BC tem que ser independente? Pois é, é isso aí. Tem candidato presidencial, completamente ignorante de economia, que comete essa barbaridade. Na verdade, a razão última para os juros ficarem tão altos, ao ponto da dívida acumulada incomodar tanto a Globo, é a cumplicidade do BC com os especuladores financeiros. Faz isso com a desculpa esfarrapada de combater a inflação.
Podia prestar aqui páginas e páginas de esclarecimento sobre a dívida pública, mas o mais importante a considerar é que, em algum momento, será necessário estancar a sangria dos juros. E como são juros sobre juros, o mercado está razoavelmente em pânico. Daí a necessidade de empurrar goela abaixo do Congresso a PEC-241, a fim de garantir que o corte em despesas reais, fora juros, possibilite cobrir o rombo que vem da parte financeira. É impossível sem uma reforma estrutural no nosso sistema financeiro. Mas tentarão.
Agora que a PEC-241 passou na Câmara, nossa esperança de vida inteligente no Congresso é o Senado. Não só para isso, mas para outras iniciativas da Câmara que se traduzem em ameaça ao povo brasileiro. Com esse objetivo o Movimento Brasil Agora realizará, com apoio de professores e alunos universitários, assim como de movimentos sociais e sindicatos, um seminário na Universidade de Brasília no próximo dia 3, às 19h, com o objetivo de fazer uma análise objetiva da PEC-241 e levar suas conclusões aos senadores.
Esse seminário sobre a PEC-241 é o segundo de um Ciclo de Seminários Universitários-Trabalhistas para a Retomada do Desenvolvimento, sendo que o primeiro será realizado hoje no IFICS/UFRJ, no Largo de São Francisco, Rio. Nesse caso, o tema será a privatização fatiada da Petrobrás, o que constitui sério risco para a desintegração da empresa em seus aspectos produtivos, comercial e operacional. Contudo, se alguém está muito frustrado com a marcha dos acontecimentos recentes na política brasileira, que se acalme. Vamos à forra em 2018!
J. Carlos de Assis é economista, professor, doutor pela Coppe/UFRJ, coordenador do Movimento Brasil Agora, autor de mais de 20 livros sobre economia política, entre os quais “Sete Mandamentos do Jornalismo Investigativo”, Textonovo, SP