Por Tadeu Porto*(@tadeuporto), colunista do Cafezinho
Aquele jantar de domingo, pré PEC do fim do mundo, parecia mais a “Festa de Babette”, um banquete onde o benevolente presidente usurpador quis agradar pouco mais de 200 deputados única e exclusivamente pela gratidão da harmonia sinfônica entre o executivo e o legislativo.
Coisa linda de se ver.
Claro, sei que posso ter pesado um pouco na ironia, mas convenhamos, quem vê as principais matérias da mídia tradicional brasileira acha que a relação parlamento-governo é o relacionamento de pai e mãe num comercial de margarina: com alta fidelidade e marcado pelo diálogo.
Vejam bem, essa lealdade vem do congresso nacional, aquele mesmo que: 1) elegeu Eduardo Cunha para presidente da câmara; 2) aceitou as manobras do carioca até mesmo no seu próprio processo de cassação; 3) chantageou até não poder mais a presidenta eleita Dilma Rousseff; 4) votou por um impeachment sem ter a noção do que seja crime de responsabilidade; e 5) enterrou a CPI do Carf (oriunda da Zelotes). De repente, esse mesmo legislativo virou um agrupamento de deputados e deputadas comprometidas com a democracia e com o debate republicano entre poderes.
Fala sério.
Pegamos, por exemplo, o “Centrão”, bloco formado e liderado por Eduardo Cunha. Para aprovar algo como uma PEC, é impossível ignorar um grupo de mais de duzentos deputados, se torando, assim, o fiel da balança das vitórias do governo. Nem mesmo a mais ingênua das pessoas consegue acreditar que esses parlamentares viraram santos do golpe para a noite.
O próprio Ministro do TraFiCo (Transparência, Fiscalização e Controle), Torquato Jardim, deixou claro sua opinião sobre o agrupamento pró-Cunha, que foi montado, segundo ele, “em nome da corrupção e da safadeza”. O mesmo fez o Ministro da Defesa, Raul Jungmann, ao comentar a situação do parlamento nacional “que chegou ao fundo do poço”.
Portanto, quando vemos a mídia tratar, com naturalidade, a “fidelidade” que Temer alcançou na sua base, sem questionar o fisiologismo escancarado associado a tal comprometimento, não podemos deixar de nos impressionar com a desfaçatez e a hipocrisia da nossa imprensa hegemônica.
Tudo para proteger, não só um presidente usurpador, mas também um projeto de Brasil que interessa única e exclusivamente a elite política e econômica do país que agora não vai precisar se preocupar com pobres estudando para ter mais senso crítico ou se cuidado para gozar uma vida mais longínqua. A ralé vai voltar para onde nunca deveria ter saído: para o subemprego e a serventia que sustentam os privilégios de uma classe que nunca lavou um banheiro na vida.
Quando falamos de velha política na maior economia da América do Sul, não falamos somente de Brasília, há de se considerar toda essa estrutura social que afasta o povo das principais tomadas de decisões acerca do futuro nacional. E no centro dessa estrutura, não tenha dúvidas, está a mídia mais concentrada, conservadora e canalha do nosso planeta.
Sendo assim, uma nova política nacional passa necessariamente pela diminuição de poder dessa imprensa parcial que blinda o que de pior temos na política nacional, como um vice-presidente da república que utiliza o fisiologismo para trair os votos que o elegeram e impõe uma agenda conservadora que não passaria em nenhum tipo de pleito democrático.
*Tadeu Porto é diretor do Sindicato dos Petroleiros do Norte Fluminense