Foto: Mauro Pimentel/ Folhapress
por Denise Assis*
A caminho das urnas, no bairro de Laranjeiras, na Zona Sul do Rio, fui encontrando com a realidade de hoje. Jovens “descoladinhos”, com adesivos do Freixo, casais amuados, com a falta de opção, donas-de-casa quase chutando o seu cachorro de estimação, por não ter um candidato tucano para chamar de seu.
Aconteceu isto, nesta bendita eleição. A esquerda entrou dividida e a direita sem opção consolidada. Crivella não representa a direita elitista na acepção da palavra, pois traz consigo, para apoiá-lo, uma legião de “periféricos”, que suam a camisa nos caixas de supermercados, na direção dos ônibus urbanos e na faxina em casas abastadas. Não é aquele que circula onde o rico está. É a elite demagógica, que mora bem, anda em carros de luxo, mas faz média com os pobres, a quem promete o céu, e uma selfie com Jesus.
Osório, o que seria a cara deles, esculpida em carrara, foi o tucano que não alçou vôo nem mesmo no Talho Capixaba. E, para o eleitor médio, ele em seu discurso já dizia de onde veio e para onde vai: “não sou político, sou empresário”, esquecendo-se de que não é só o Leblon que elege prefeitos.
Restou para a parcela reacionária da Zona Sul, a do cachorrinho, o voto naquele rapaz que, ao quebrar o dente da própria mulher, fez uma trinca indelével em sua biografia. Tanto a mulher que leva uns sopapos calada, no silêncio do apê com vidros à prova de som na Vieira Souto, quanto a que cuida dos filhos e sacoleja num ônibus para cumprir jornada no Centro da cidade sabem muito bem que um tapinha dói sim. Dói na alma. Todas as artimanhas – desde frequentar assiduamente a Zona Oeste, onde o diálogo é com milicianos, e exibir as obras que o Dudu fez, não dariam conta de colar a rachadura na imagem. Foi assim, com a fama de machista e despreparado, o que, aliás, ficou claro durante os poucos debates de que participou que Pedro Paulo levou seus eleitores às urnas.
Enquanto isto, na esquerda, o tombo que o PT levou ainda não foi digerido. Para a juventude e os mais críticos, o voto no Freixo é um ato de revolta e de exibição de uma insatisfação que é de todos. Dos que tentam dar um lustro na estrela e prosseguir, catando os cacos para reerguer o que for possível, e dos que buscam demonstrar com o voto em Freixo, que o partido errou em não dialogar com eles, de não buscá-los para as suas fileiras e levar em conta as suas opiniões.
Os cinquenta e poucos anos que nos separam da ditadura trataram de fazer com que entre um golpe e outro nascessem os eleitores do Freixo: livres, leves e soltos. O bastante para dar a eles independência de opinião e voto.
Enquanto para esses jovens, hoje, votar foi “o troco”, a alegria, para nós, que vivemos sob o tacanho do arbítrio, e tivemos que percorrer o duro caminho da redemocratização, foi a angústia, a dúvida. Continuar fazendo valer a coerência do voto que nos levou ao poder para realizar as mudanças operadas no plano social, ou juntar-nos aos jovens “descolados”? Está difícil afinar este discurso. Enquanto gritamos “Fora Temer”, eles gritam: “Mudanças já”. O importante, porém, é que ninguém perca o foco. Há uma ordem política a ser retomada e um calendário eleitoral a ser cumprido em 2018. Vão nos deixar votar livremente? Esperemos que sim. Do contrário, estaremos jovens e nem tanto gritando juntos: “diretas já”.
*Denise Assis é Jornalista
carlos
03/10/2016 - 15h02
O PT governou melhor mas se comunicou pior. Ponto final. E não faltou aviso.
Ricardo de Faria Godinho
03/10/2016 - 11h59
Quantas vezes mais teremos que ser expulsos do Governo (sim, governo, não Poder), antes de entendermos que esse jogo está sendo jogado no campo do adversário, com a bola do adversário, com o juiz do adversário, com a torcida do adversário – e os que deveriam estar torcendo por nós por engodo e engano torcendo pelo adversário?
Esmeramo-nos quase todos em analisar o que fazer, o como fazer, mas sempre o nosso Norte é a via parlamentar, o caminho que mais de cem anos atrás já se demonstrou impossível de trilhar.
As muitas ditaduras, de lado a lado, com suas injustiças e infâmias sem fim, nos fizeram criar uma crosta de medo à ruptura e ao endurecimento da luta que é difícil de sacudir fora, e que nos faz nos agarrarmos ao formalismo democrático burguês. Bradamos por Estado de Direito como se houvesse um só e único Direito justo e democrático – e burguês, como se vê.
O desleixo com a luta política no seio da classe trabalhadora, o abandono a que se relegou a organização social popular e democrática nos conduziu ao golpe. E nós mantemos nossos olhos todo o tempo cravados na democracia formal burguesa, pensando em eleições antes da organização das massas.