Folha de SP faz denúncia – Manifestantes reprimem PMs durante protestos

(Foto: Mídia Ninja)

Por Bajonas Teixeira

Nem sempre os jornalistas usaram teclados para escrever, já houve tempo em usavam penas. Nessa época o ditado “pela pena se conhece o pássaro” fazia sentido e era familiar. A Folha inovou mais uma vez com um upgrade no ditado que agora pode soar assim: pelo cassetete se conhece o editor.

Sob o pretexto de denunciar ódios insuflados por Dilma – “Dilma insufla o ódio nas ruas e vai morar em Ipanema” –, o secretário de Redação da Folha, ele sim metamorfoseado em escriba da PM, quer fazer a apologia da repressão e, de quebra, dar aos policiais uma motivação suplementar (como se precisasse) para que se defendam melhor, da próxima vez, dos manifestantes.

O argumento é simples e cômico: policiais são proletários e negros que, lutando por direitos e portando apenas bombas de gás lacrimogêneo e rifles de tiros de borracha, são duramente reprimidos por uma elite de manifestantes (gente muito bem remunerada) que os oprime e massacra no asfalto. Para se defenderem, as vítimas fardadas, isto é, os proletários armados (eles não tem chefes, superiores, patrões, coronéis, nada) dão tiros, jogam bombas, afinal, é uma questão de vida ou morte.

O estranho, mas isso deve ser só aparência, é que a impressão que se tem, assistindo os vídeos, é de que quem está batendo, agredindo e violando o direito constitucional à livre manifestação é a PM. Mas não, o certo, como nos esclarece o secretário de redação da Folha é o contrário: os manifestantes é que estão violando o sagrado direito da polícia de ferir, prender e lançar bombas a esmo. Vejamos:

“Ninguém se iluda com críticas furiosas da esquerda ao menor sinal de excesso na repressão. A preocupação com a integridade das pessoas —somente das que se chocam com a polícia, nunca das que são vítimas da brutalidade militante — é mero pretexto de uma disputa de poder.”

Que pessoas são vítimas da brutalidade militante? Alguém perdeu um olho arrancado por manifestantes? Ou, ao menos, recebeu pancada, foi violentamente sacudido, sentiu o efeito moral de um cassetete brandido por manifestantes?

Ou será que as vítimas são vitrines de bancos que, por distração, ou excesso de humanismo, o jornalista confunde com pessoas? Nesse caso, é mais fácil compreender que essas pessoas-vitrines tenham sido vítimas dos manifestantes. Por exemplo, a foto escolhida para ilustrar a matéria, em que um sujeito, bailarino profissional ou acrobata, lança uma cadeira (de onde saiu?) contra uma vitrine. Coincidentemente do Bradesco.

 

Fica difícil decidir se é uma propaganda paga do Bradesco, ou se temos que aceitar que esse enquadramento tão profissional da marca Bradesco foi fruto do acaso. Estranhamente também, o manifestante, num manifestação com 100 mil, aparece sozinho. É o único solista de passeata do qual se tem notícia. Aliás, não, há outro, mas esse está fora do foco, é o fotógrafo, a única testemunha ocular, ao que parece.

Nesse espetáculo raro, ainda outro detalhe chama a atenção: a cadeira, do tipo improvável de se encontrar numa calçada na frente de uma agência bancária (terá o performer trazido de casa?) é lançada de uma distância que, mesmo que o bailarino se esforçasse ao máximo, jamais chegaria a atingir a vitrine, e menos ainda, a quebra-la.

Depois, é engraçada a pose do sujeito que lança um objeto contra a vitrine. Parece por demais ensaiado e coreografado. Não só o enquadramento, mas também a pose, o ângulo e, enfim, tudo, lembra um acaso cuidadosamente preparado. Faltou só coadjuvantes, algo estranho, quando ao lado havia cem mil manifestantes disponíveis. Novamente, estranhas ausências se fazem presentes.

Emitir opinião é uma coisa. Caluniar e instigar ódios e revanches, isso não se pode aceitar, é péssimo jornalismo. Leia-se:

“A esquerda brasileira, da velha e da nova geração, não sepultou a violência política. Nas derivações subletradas do marxismo de hoje, o culto da revolução —o banho de sangue que abriria caminho para o mundo pacificado— deu lugar ao prazer estético da depredação e do confronto provocado com a polícia.

O comitê central circula os alvos: empresários, imprensa, parlamentares, procuradores e juízes são atingidos dia e noite pela acusação de “golpistas”. As tropas de assalto nas ruas entendem o recado e partem para a ação. Dilma Rousseff pronuncia a fatwa e vai morar em Ipanema.”

Essas mal traçadas linhas de rancor, e, mais ainda, essa mal intencionada apologia da violência contra jovens, muitos menores e mulheres, por tropas treinadas para combate e fartamente armadas, nos envergonha hoje à primeira leitura. É fácil imaginar com que carga de desprezo  serão lidas no futuro.

Agora mesmo, apenas três dias depois, quando ficou claro que 19 jovens presos o foram da forma mais arbitraria, e isso dito pelo juiz que os libertou, o artigo do secretário de redação da Folha já se tornou uma obra prima do jornalismo submisso à serviço do estado policialesco. É o que, em face dessa tentativa de legitimar a brutalidade policial, se deduz do elogio ao juiz, feito pelo advogado criminalista Marcelo Feller, advogado de seis dos jovens detidos:

“Foi uma decisão dura e corajosa. A Polícia não tem o direito de prender ninguém sob pretexto de uma suposta e futura prática criminosa. Isso não é ação de um Estado Democrático de Direito, e sim de um Estado policialesco”.

É bom ter presente que os disparos e as borrachadas desferidas pelo jornalismo policialesco podem ser tão letais contra aquelas dadas pelas forças repressivas. Não é de estranhar que um jornalismo que humaniza vitrines, coisifique as pessoas e as veja como alvo normal de choques repressivos.

Bajonas Teixeira:
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