Um provável legado histórico dos golpistas

(Pop Picasso/Imagem de Koz Palma)

 

 

Por Ricardo Azambuja, colaborador do Cafezinho

 

A ignorância nem sempre foi vencida pelo tempo. Alguns de nossos “heróis” na História não passavam de salafrários cruéis antes de virarem estátuas e nomes de rua, venerados em livros didáticos escolares. A forma como a história passada foi deturpada provém de uma coleta de dados insuficiente e seletiva sobre determinado acontecimento em prol de um interesse maior.

O mundo digital do nosso século trouxe um elemento novo ao relato histórico: a imediata gravação dos fatos e opiniões em imagens e palavras com acesso público. Isso é fatal para as mentiras abstratas contadas no calor do momento, para as tentativas de falsear a História.

Os acontecimentos de hoje, 31 de agosto de 2016, contarão com uma análise mais profunda e imparcial dos fatos no futuro, sem a hipocrisia do presente. Poderá ser tarde para consertar danos causados, mas não para descrever os personagens do golpe. Suas atitudes e conluios deixarão marcas, estigmas carregados por gerações, talvez envergonhando descendentes e conhecidos. Talvez não. Sempre haverá os que seguirão pelo mesmo caminho. Mas estes terão que se adequar aos novos tempos, provavelmente mais intransigentes com desvios de conduta.

A grande mídia? Seguirá se adaptando aos seus interesses, como sempre. Em 1964, ela defendeu a ditadura militar. Em 1983, favoreceu o pedido das Diretas Já. No final do século passado, fez o mea-culpa por ter apoiado os militares. Hoje, participa do golpe parlamentar. Amanhã, quem sabe? Talvez nem exista mais uma grande mídia haja vista o decréscimo contínuo de ibope, o desmascaramento de suas armações ilimitadas e o crescimento vertiginoso de meios de comunicação alternativos. A única certeza é a de que não escapará de um julgamento baseado na análise comparativa das suas notícias com a dos blogs independentes e da mídia internacional. Sua parcialidade e manipulação servirão como exemplos de um péssimo jornalismo em faculdades de comunicação e no meio profissional.

O judiciário tentará livrar-se do peso da decisão passada travestindo-se de mero cumpridor das leis definidas por um Congresso espúrio. Passará a bola para o legislativo. Os inescrupulosos políticos. Sobre eles recairá a grande culpa pelo atentado à democracia em pleno século XXI. Serão execrados, mais do que seus antecessores golpistas de 1964, Carlos Lacerda, Magalhães Pinto e Adhemar de Barros. Com menor nível intelectual e nenhuma vergonha na cara, permanecerão gordos e ricos em seus paradisíacos refúgios, deixando benesses para garotas mais novas até o destino findar com sua felicidade artificial entrecortada por pesadelos de consciência.

E os batedores de panela brancos e cheirosos, vestidos com camisetas da CBF, cópias autenticadas da TFP (Tradição, Família e Propriedade) de 1964? Boa parte sentirá o peso da própria ignorância sobre suas necessidades mais básicas: salário, saúde e educação. Uma minoria continuará a viuvez com tempos mais obscuros. O resto seguirá se iludindo em preconceitos e respostas complexas como a famosa e repetitiva: “mimimi esquerdista”.

 

Ricardo Azambuja:
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