Qual é a moral desse Senado para julgar a presidente?

Plenário do Senado Federal durante sessão deliberativa extraordinária para votar a Denúncia 1/2016, que trata do julgamento do processo de impeachment da presidente afastada Dilma Roussefff por suposto crime de responsabilidade. Em pronunciamento, senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR). Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado

Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado

por Jeferson Miola

“Aqui não tem ninguém com condições de acusar ninguém. E nem de julgar! Por isso que a gente diz que é uma farsa.

Qual é a moral desse Senado para julgar a Presidente da República? Qual é a moral que têm os senadores aqui para dizer que ela é culpada, pra cassar?

Quero saber!

Qual é a moral que vocês têm? Gostaria de saber! Que a metade aqui não tem! Se tivessem, se tivessem moral, Presidente, se tivessem moral, se tivessem, e quisessem de fato, se tivessem, Sr. Presidente …”.

Questão de ordem apresentada pela senadora Gleisi Hoffmann no tribunal de exceção do impeachment.

O relógio do golpe anotava 11 horas e 32 minutos deste dia 25 de agosto de 2016. Estava em andamento a sessão de abertura do Tribunal de Exceção da farsa do impeachment no Senado da República. Precisamente neste momento a senadora petista Gleisi Hoffmann desafiou seus pares com uma pergunta mortal: “Qual é a moral desse Senado para julgar a Presidente da República?”.

Os imorais, ao invés de responderem à senadora, partiram para xingamentos e ofensas com a mesma truculência com que violentam a Constituição para perpetrar o golpe de Estado jurídico-midiático-parlamentar.

Apesar disso, a evolução dos trabalhos do Tribunal de Exceção daquele instante em diante evidenciou que a pergunta da senadora Gleisi fazia todo o sentido.

O relógio do golpe andou. Quando alcançou as 14:35 horas, o testemunho-chave indicado pelos golpistas, o procurador do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União, Júlio Marcelo de Oliveira, foi desmascarado como militante partidário que se disfarçou de “técnico do TCU” para forjar um parecer de oposição à Presidente Dilma.

Este personagem hipócrita teve um papel decisivo na montagem da farsa do impeachment: foi ele quem inventou a nova hermenêutica jurídico-fiscal fabricada sob medida para a confecção da denúncia que o PSDB encomendou a Janaína Paschoal por R$ 45 mil.

Depois a peça fraudulenta foi usada por Eduardo Cunha, sócio do Michel Temer na conspiração, para iniciar a farsa do impeachment na “assembléia geral de bandidos”, que é como a imprensa internacional chama a Câmara dos Deputados – outra Casa legislativa que também não tinha moral para julgar a Presidente da República.

Em seguida, a peça fraudulenta do “técnico do TCU” se tornou o pilar de sustentação do relatório manipulado do senador tucano Antonio Anastasia.

Apesar da suspeição gritante do “técnico do TCU”, os golpistas continuam o julgamento que, vivesse o Brasil em pleno Estado de Direito, teria de ser totalmente anulado.

O relógio do golpe, contudo, continuou avançando. Quando alcançou os primeiros minutos da madrugada do dia 26 de agosto, outra fraude dos golpistas foi desmascarada: o segundo testemunho de acusação, o auditor do TCU Antonio Carlos D´Ávila, confessou ter ajudado o “técnico do TCU” na montagem da farsa; foi co-autor da fraude que forjou a “nova hermenêutica”.

A gravidade moral e jurídica deste comportamento é facilmente entendida na analogia feita pelo advogado de defesa da Presidente Dilma, José Eduardo Cardozo: “É como se um juiz ajudasse um advogado a preparar o documento que seria remetido a ele. É gravíssimo!”.

Quanto mais o relógio do golpe avança, mais razão tem a senadora Gleisi: esse Senado não tem moral para julgar e, menos ainda, para condenar e cassar a Presidente da República.

O déficit moral da maioria golpista não decorre unicamente do fato de que quase 40 deles deveriam ser impedidos de julgar porque são réus ou investigados por corrupção e outros crimes; mas também porque eles agem de modo imoral e parcial para condenar a Presidente. Promovem um julgamento de exceção, injusto e fraudulento, no qual testemunhos falsos são incensados como gênios inventores de uma nova e casuística hermenêutica jurídico-fiscal.

Falta moral a um Parlamento com uma maioria que derruba uma Presidente que não cometeu nenhum crime de responsabilidade, que não responde a nenhum inquérito e que não é ré em nenhum processo judicial. Falta moral a um Parlamento convertido em tribunal de exceção no qual uma maioria circunstancial impõe fascistamente sua condição majoritária para usurpar o poder pisoteando a Constituição e a Lei.
A moral, todavia, é uma das vítimas mortais deste momento de delírio fascista que o Brasil está atravessando. Mas esse é um mero detalhe, que não faz o menor sentido para os golpistas que abastardam a democracia.

Redação:
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