Um “julgamento” dotado de significados, quase nenhum positivo

(Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado)

(Comissão do impeachment do Senado. Foto: Agência Senado)

 

Por Ricardo Azambuja, correspondente do Cafezinho no Senado

No início da sessão desta sexta-feira (26), da etapa final do julgamento de Dilma Rousseff, o advogado de defesa da presidenta, o ex-ministro da Justiça José Eduardo Cardozo, pede a suspensão da testemunha de defesa Esther Dweck. “Percebo que haverá uma intenção de desqualificar, aí sim, pessoalmente, a professora Esther Dweck. Eu não vou expor a figura de uma professora universitária a um tipo de execração política por represália, portanto a defesa retirará a testemunha Esther Dweck”, afirmou.

Durante a audição da primeira testemunha de defesa, o economista Luiz Gonzaga Belluzzo, ocorre outra confusão envolvendo os senadores rivais Ronaldo Caiado (DEM-GO) e Lindbergh Farias (PT-RJ), o que faz com que o ministro do STF e presidente da sessão final do processo de impeachment, Ricardo Lewandowski, desligue os microfones por cinco minutos. Lindbergh reclamou da fala de Caiado. “Esse senador que me antecedeu é um desqualificado. O que ele fez com a senadora Gleisi… Ele disse que ela está aliciando testemunhas”.

Uma nova interrupção acontece após o presidente do senado Renan Calheiros (PMDB-AL) pedir a palavra para reclamar da postura da senadora Gleisi Hoffman (PT-PR). “Ontem, a senadora Gleisi disse para todo país que o Senado não tem moral para julgar a presidente da República. Como a senadora pode fazer uma coisa dessa…”, disse um “surpreso” e incomodado Renan.

Na sequência, o economista Luiz Gonzaga Belluzzo, ouvido como informante e não mais como testemunha, fala que a presidente afastada, Dilma Rousseff, cometeu uma “despedalada”. “Vou tratar isso com um pouco de bom humor, porque eu acho que, em 2015, não houve uma pedalada, houve uma ‘despedalada'”. E continua: “No momento em que a economia estava se contraindo, estava perdendo receita, a presidente fez um contingenciamento de mais R$ 8,5 bilhões em cima de um contingenciamento que já tinha ocorrido, de R$ 70 bilhões”. Belluzzo conclui dizendo que Dilma Rousseff não cometeu crime de responsabilidade e que o afastamento dela é um “atentado à democracia”.

Novela

O julgamento do impeachment no senado parece mais uma novela do horário nobre, sem tantos personagens caricatos como na Câmara dos Deputados, mas digno de um drama televisivo recheado de bate-bocas e palavras como “desqualificado”, “cracolândia”, “burrice infinita”, “hospício”, “baixaria”, um retrato do Brasil padrão Globo. Até o comandante do espetáculo, o presidente do STF (Supremo Tribunal Federal) Ricardo Lewandowski, tem dado a sua contribuição nas conversas com senadores pedindo a aprovação do projeto que eleva o seu salário e dos demais ministros do STF durante os intervalos da sessão. Uma atitude, no mínimo, sem noção.

Mas não poderia se esperar muito de um senado onde o perfil predominante, de acordo com dados da BBC Brasil, é o de homem, branco, com curso superior (Direito é o mais comum), investigado pela Justiça e com boas chances de ser membro da bancada ruralista. Muitos são parte de dinastias políticas de longa data e muitos chegaram à Casa sem receber voto nenhum, por serem originalmente suplentes

Crônica de uma Armação Anunciada

Paralelo ao espetáculo novelesco, na calada das sombras dos holofotes, a PF (Polícia Federal) indicia Lula e sua esposa no inquérito que apura o esquema de corrupção envolvendo o tríplex do Condomínio Solaris, no Guarujá, litoral paulista, por crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e falsidade ideológica. Após o resultado da última pesquisa Datafolha colocar Lula à frente de todos os demais candidatos na corrida presidencial! O indiciamento de Lula e o julgamento de Dilma poderiam alterar o nome do livro de Gabriel García Márquez para “Crônica de uma Armação Anunciada” ou assumir o nome da antiga série de TV da Globo, “Armação Ilimitada”.

A credibilidade em nossas instituições foi para o brejo. Os sistemas político, judiciário e midiático enterraram qualquer esperança em sermos uma sociedade mais justa, moderna e responsável no médio prazo. Eduardo Cunha e seus 40 ladrões estão soltos e ditando as regras. A honestidade exagerada de Dilma a leva a passos largos ao calabouço do impeachment por algozes envolvidos em crimes. Não há muita diferença para a época da ditadura militar em termos de poder oligárquico que tudo pode e está acima da lei, interpretando-a a seu gosto, com a cumplicidade de um judiciário fraco e parcial. A democracia perde e o povo vai pagar a conta do golpe. Porém, ventos vêm e vão, e o que hoje é comemorado por alguns pode virar amanhã um grande tiro no pé.

Ricardo Azambuja:
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