Por Tadeu Porto*(@tadeuporto), colunista do Cafezinho
A revista é a mesma, a canalhice também (talvez tenha aumentado) e o espaço de tempo entre os fatos é quase simétrico: são, aproximadamente, oito anos exatos que separam duas edições da revista Veja – a 2076 e a 2492 – de conteúdo semelhantes, envolvendo ataques a ministro do supremo.
Qualquer cidadão ou cidadã brasileira com o mínimo de crítica, a essa altura da história, já tem noção da sujeira aprontada pela plutocracia nacional na Operação Satiagraha, por isso, vou tomar a liberdade de não explicar com detalhes o ocorrido e focar na questão da Lava-jato em si. Se alguém por ventura quiser saber mais sobre o caso, deixo aqui uma ótima análise do Nassif como referência, e o indispensável livro do Rubens Valente, Operação Banqueiro, que está uma pechincha de menos de R$20,00 no Google Books.
Bom, Gilmar Mendes talvez seja uma das piores figuras públicas da história recente do Brasil. Um juiz da suprema corte que não tem vergonha de falar fora dos autos e de fazer política abertamente (com direito a churrasco pra comemorar abertura de mercado de carne) mesmo sem passar pelo crivo da democracia direta não deveria sequer ser levado a sério pela população em geral . Mas ele é, claro, com ajuda da mídia mais concentrada e conservadora do planeta.
Entretanto, como já diria o dito popular, quem fala demais dá bom dia a cavalo e, nesse sentido, Mendes passou do ponto nos esclarecimentos que deu ao Globo e ao Estadão, deixando claro o seu objetivo de destruir a operação Lava-Jato. Vejamos:
Gilmar escancara sua indignação com a operação “No contexto de incensamento da Lava Jato e seus operadores já há coisas muito, vamos dizer assim, exageradas” e seu desejo de fazer alguma coisa sobre os excessos cometidos “…tem que se colocar um limite nisso”.
Além disso, o ministro argumenta que o STF tem ferramentas para atuar contra a Lava-Jato “Isso não vai prosseguir assim, a gente tem instrumentos para se colocar freios…” e [pra facilitar ainda mais meu raciocínio] cita a operação Satiagraha nos dois jornais: “Isso lembra o nosso delegado herói, que fazia interceptação telefônica sob o argumento de que agia com bons propósitos…” e “Em momentos passados, eu mesmo vivi aquela coisa da Satiagraha… De vez em quando se tem esse tipo de situação”.
Pra finalizar, o ex Advogado Geral da União de FHC ainda manda o papo reto sobre o que “enterro” que vai tentar promover “Isso já ocorreu antes no Brasil. O cemitério está cheio desses heróis. … Estamos preocupados, mas está dado o recado.”
A recado se assemelha com um artigo cientifico: tem resumo, objetivo, introdução, método e conclusão (incrível como um membro do judiciário fala tanto com a mídia), ou seja, a advertência está mais do que feita. Todavia, falta ainda combinar com a Procuradoria Geral da República que de boba não tem absolutamente nada e pode não querer participar na brincadeira.
Por exemplo, sabe-se que o golpe planejado por Temer tem como desejo, entre outras coisas (como entregar o país a preço de banana), realizar um “pacto com supremo, com tudo” para “delimitar” a Lava-Jato onde está, ou seja, deixar o PT levar a culpa e livrar o resto dos partidos.
Contudo, as gravações e vazamentos dos áudios de Sérgio Machado com Jucá, Calheiros e Sarney, e o pedido de prisão desses por parte do MP, arrastaram o PMDB (e o Aécio que aparece em todas as conversas) para o centro da Lava-Jato, fazendo com que a única solução cabível para a existência do governo usurpador é o fim da operação como um todo.
Portanto, das muitas teorias que apareceram sobre o caso Toffoli-OAS, meu palpite [longe de ser verdade absoluta, obviamente] é de que Gilmar, de certa forma, fez chegar uma pseudo delação à Veja, como talvez fez com os grampos sem áudio na mesma revista no ano das olimpíadas de Beijing. Sendo assim, acredito ser coerente a declaração que o Janot deu a EBC, argumentando que o vazamento parece ser “…um fato que alguém vendeu como verdadeiro”.
Nesse sentido, considerando como válida a minha teoria da conspiração do momento, abre-se uma disputa sem volta entre o supremo e o governo golpista contra o Ministério Público e a Polícia Federal. Nada que Jucá não tivesse adiantado numa resposta a uma pergunta induzida do Machado (vale lembrar que o ex-presidente da Transpetro estava gravando e, praticamente, forçou a resposta) “Acabar com a classe política para ressurgir, construir uma nova casta, pura….” e explicaria o ódio que Renan Calheiros tem por Janot.
E se o tempo é o senhor da razão, hoje essa disputa ganhou mais um capítulo interessante: a prisão do presidente do PSDB de Goiás. Afinal, as relações entre Policarpo Jr (aquele que assinou a matéria sobre os grampos da ABIN em Gilmar em 2008) e Demóstenes Torres ex-senador goiano (e que “conversa” com o ministro na mesma matéria da Veja), nunca foram segredo para ninguém depois dos áudios que vazaram na operação Monte Carlo que levou a prisão do bicheiro Carlos Cachoeira.
Pois bem, Demóstenes e Gilmar (que já protagonizaram outras controvérsias) foram juntos a formatura de Marconi Perillo, governador do estado de Goiás. Sem contar, claro, as outras relações “republicanas” entre o ministro e o governador, como o pedido de ajuda entre os dois e as doações que o IDP de Gilmar recebeu do governo goiano.
Perillo, do PSDB-GO, é atingido em cheio pela dobradinha PF e MP, um dia depois que seu (talvez) amigo Mendes, deu declarações nada amistosas contra as instituições. Esse timing perfeito, eu já vi ocorrer também na Lava-Jato.
Coincidência? Pode ser… Mas eu já peguei minha pipoca pra assistir essa treta de perto.
*Tadeu Porto é Diretor do Sindicato dos Petroleiros do Norte Fluminense.