Pablo Villaça: não é impeachment e nem é um julgamento por crime de responsabilidade, é golpe!

Brasília - Senadores cumprimentam o relator, senador Antônio Anastasia, após aprovação do relatório em plenário (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

por Pablo Villaça, no Facebook

Não é impeachment e nem é um julgamento por crime de responsabilidade; é um golpe e o processo é puramente político e econômico.

A imprensa do mundo inteiro (com exceção da brasileira, cúmplice dos golpistas) denunciou a farsa do impeachment. Mas não é golpe.

Mais da METADE da população brasileira enxerga o “impeachment” como um processo que contém irregularidades. E maioria absoluta deseja novas eleições. Mas não é golpe.

Um ex-governador notório pelas tais “pedaladas” se torna relator de um processo sobre estas e diz que são crimes. Mas não é golpe.

Um ex-governador, ex-deputado, candidato derrotado e senador campeão de menções em delações discursa falando sobre “honestidade” e “impunidade”. Mas não é golpe.

Os peritos chamados pelo próprio Senado concluem que não houve crime e são ignorados. Mas não é golpe.

Diversas testemunhas da defesa tiveram suas convocações para depor negadas pela comissão do “impeachment”. Mas não é golpe.

O número de sessões é reduzido para acelerar o processo a fim de garantir que o vice-presidente golpista possa ser confirmado no cargo antes que sua popularidade despenque ainda mais. Mas não é golpe.

FHC, em entrevista à Al Jazeera, admitiu que não houve crime e que o julgamento é político – e também que boa parte dos senadores votou por “oportunismo”. Mas não é golpe.

A LÍDER do “governo” Temer na Câmara, Rose de Freitas, assumiu publicamente que “não houve isso de pedaladas”. Mas não é golpe.

O processo de Eduardo Cunha, aliado próximo a Temer (o Pequeno), já dura TREZENTOS dias e foi mais uma vez adiado para que não ocorra antes da votação do “impeachment” e o comprometa. Mas não é golpe.

O vice golpista, desde que tomou o poder, publicou MPs que consistem exatamente nas tais pedaladas e o TCU as aprovou sem problemas. Mas não é golpe.

O braço direito de Temer, Romero Jucá, foi GRAVADO conspirando para derrubar Dilma para barrar a Lava-jato. Mas não é golpe.

O programa de governo eleito por 54 milhões de pessoas foi abandonado por Temer, que partiu na direção oposta e imediatamente – ainda interino! – deu início a privatizações, corte de direitos dos trabalhadores e de programas sociais. Mas não é golpe.

Senadores que logo após a votação inicial na Casa indicaram dúvida sobre o “impeachment” foram abordados por Temer para “negociar” a posição – e Romário, por exemplo, ganhou o direito de indicar a diretoria de Furnas. Mas não é golpe.

A PM e a Força Nacional estão reprimindo todas as manifestações contra o “impeachment” e a favor do “Fora Temer”. Mas não é golpe.

O STF, que supervisiona o “impeachment” e teve o aumento de salário de seus juízes vetado por Dilma, foi imediatamente premiado com o reajuste quando Temer tomou o poder, num impacto de 58 bilhões de reais para as mesmas contas públicas que o golpista afirmara que iria reduzir. Mas não é golpe.

Os candidatos DERROTADOS na última eleição passaram a integrar o “governo” que derrubou aquele eleito pelo povo. Mas não é golpe.

Temer manobrou descaradamente não só para viabilizar o impeachment, mas para confirmá-lo, chegando a ter um aúdio com DISCURSO DE POSSE vazado antes mesmo do primeiro julgamento e confirmando, com isso, que estava fazendo o possível para tomar o lugar da Presidenta da qual era vice. Mas não é golpe.

E é golpe, enfim, porque se trata de interromper as políticas públicas eleitas pela maioria da população nas últimas quatro eleições. A venda do campo de Carcará, que valia quase 23 bilhões e foi entregue por 8 bilhões, é a repetição exata do processo de privataria de FHC que viria a ser rejeitado pelo povo. Da mesma maneira, as declarações de Temer sobre aumentar a idade de aposentadoria para 70 anos, eliminar (ops, perdão: “flexibilizar”) a CLT e entregar a definição dos direitos de cada empregado aos seus patrões são a mais pura manifestação de uma política interessada apenas em agradar a elite.


Para a elite brasileira, por sinal, seu voto deveria valer mais do que o daqueles que não fazem parte dos 10% mais ricos – e, com o golpe, mais uma vez ela provou que “democracia” é um conceito nulo em um país que tem uma mídia preocupada não com a ética e a veracidade do que publica, mas com os interesses aos quais atende.

A elite brasileira é do tipo que considera “errado” um voto que não seja no candidato comprometido com seus interesses. E que se acha no direito de “corrigir” o “erro” como bem entender.

A elite brasileira, enfim, é esta que vocês podem ver na imagem do tweet que acompanha este post. São pessoas como esta que agora estão no poder.

Não vivemos mais em uma democracia. Este é o retrato do Brasil em 2016 e pelos próximos sei-lá-quantos anos.

E hashtags não mudarão esta realidade.

Pablo Villaça é um crítico cinematográfico brasileiro e editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil

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