(Foto: Beto Barata)
Por Bajonas Teixeira de Brito Junior, colunista de política do Cafezinho
Um dia antes da abertura oficial das Olimpíadas no Brasil, e apenas cinco dias após a inauguração da linha 4 do metrô, ligando Ipanema à Barra da Tijuca, o TCE (Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro) divulgou suspeitas sobre corrupção bilionária na obra:
“Técnicos do Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ) apuraram que as obras da Linha 4 do metrô (Ipanema-Barra), inaugurada no sábado, podem ter causado prejuízo aos cofres públicos de R$ 2,3 bilhões. A conclusão consta em relatório de auditoria governamental ordinária, feita entre julho e dezembro do ano passado, que foi encaminhada esta semana para a conselheira do órgão, Marianna Montebello, que será a relatora do processo, sem data ainda para ir a julgamento em plenário. O documento, ao qual O GLOBO teve acesso, aponta “ilegalidades graves” nos gastos.”
A sensação de que, em torno das Olimpíadas no Rio, tudo corre pelas vias da corrupção, deve ser um dos motivos que explica a grande mobilização contra o evento. Nos últimos dias, em ocasiões diversas, a tocha foi apagada e se verificaram sérios enfrentamentos entre a população e a polícia em cidades como Angra dos Reis, São Gonçalo, Niterói, em Duque de Caixas, região metropolitana do Rio.
O grande protesto ocorrido hoje na Tijuca, e o novo confronto da PM com os manifestantes, parece que consolida o clima de revolta que deve perdurar até o encerramento.
Começando com a morte da onça, por inépcia e despreparo, que causou comoção e protestos no país, e indo até eventos com mortes que, certamente seriam evitadas não fosse as gambiarras e improvisações para encobrir a dinâmica de maracutais, presenciamos um número suficiente de desastres para temer pela realização dos jogos.
Aqui listamos alguns:
21 de abril – A queda de parte da estrutura da Ciclovia Tim Maia, recém inaugurada, que resultou na morte de duas pessoas:
29 de junho – Dois paraquedistas morreram em ensaio para formar o símbolo das Olimpíadas.
29 de julho – Cai um helicóptero da Polícia Rodoviária Federal na sede do palácio do Governo, felizmente sem vítimas:
26 de julho – Colidem dois jatos que faziam voos de treinamento próximo à área dos eventos. Um dos pilotos está desaparecido e provavelmente morreu no acidente.
29 de julho – Ocorre um choque entre veículo do VLT, recém inaugurado, e um ônibus.
29 de julho – O prédio da delegação das Austrália teve que ser evacuado em razão de princípio de incêndio. A situação já era preocupante dias antes, com reclamações da chefe da delegação à respeito de vazamentos, infiltrações e fios expostos.
30 de julho – A rampa da Marina da Glória recém inaugurada, segundo os organizadores do evento devido a ventos fortes e ressaca, desmoronou e terá que ser inteiramente reconstruída.
Essa lista, que certamente não é exaustiva, é suficiente para preocupações. Um evento de massa de grandes proporções parece exigir e merecer uma organização à altura. Mas ao que tudo indica ninguém deve esperar por isso. Segundo matéria da Folha hoje, até a festa de abertura das Olimpíadas foi definida pelos seus diretores como uma “gambiarra”:
“Um dos momentos mais aguardados de uma Olimpíada, a festa nacional foi feita à base da ‘gambiarra’, definiu a equipe estelar de diretores criativos: os cineastas Fernando Meirelles, Andrucha Waddington e Daniela Thomas.”
O mesmo conceito também se aplica ao momento cerimonial do desfile das delegações:
“Antes, haverá o desfile de delegações, outra ‘gambiarra’. Tradicionalmente, elas circundam uma pista de atletismo. Como o Maracanã não tem, as 11 mil pessoas cruzarão o centro do campo saindo por lados opostos, como um Y.”
A este nível do espetáculo, a ‘gambiarra’ pode até preocupar menos, e mesmo ser exaltada como expressão da desenvoltura e da cultura da improvisação local. Pode ser que a gambiarra brilhe, sem dúvida. O problema é que nos níveis mais profundos e mais decisivos, a gambiarra parece imperar de modo ainda mais implacável, e envolver riscos muito maiores. Assim, a empresa que cuidava da segurança do evento foi, sem quê nem por quê, em cima da hora, dispensada pelo ministro da Justiça, Alexandre de Moraes segundo matéria da Folha:
“O ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, anunciou nesta sexta-feira (29) que a empresa Artel Recursos Humanos, contratada para prestar serviços de segurança durante os Jogos Olímpicos do Rio-2016, foi afastada.
A companhia seria responsável por fazer a revista e o controle de entradas e acessos em instalações olímpicas. Segundo Moraes, entretanto, ela não apresentou os 3.400 funcionários que deveriam assumir essa missão.”
O que podemos esperar? A irresponsabilidade não mostra ter nenhum limite e os organizadores parecem estar muito aquém da capacidade e da seriedade necessárias. Nessas condições, em que não se pode confiar na infraestrutura, na logística, nem na organização (sem falar na segurança), a única coisa que resta é cruzar os dedos e rezar.
Bajonas Teixeira de Brito Júnior – doutor em filosofia, UFRJ, autor dos livros Lógica do disparate, Método e delírio e Lógica dos fantasmas, e professor do departamento de comunicação social da UFES.