A ameaça autoritária que paira no Mercosul

Discurso do ministro José Serra na cerimônia de transmissão do cargo de ministro de Estado das Relações Exteriores. Brasília, 18 de maio de 2016 Foto: Jessika Lima/AIG-MRE

Foto: Jessika Lima/AIG-MRE

por Jeferson Miola

O impedimento da posse da Venezuela na presidência pro tempore do MERCOSUL é um golpe à democracia do MERCOSUL, porque significa a ruptura das regras previstas nos instrumentos jurídicos e legais do bloco. É um golpe à democracia comunitária que tem o objetivo estratégico de sabotar e debilitar o MERCOSUL para satisfazer os interesses de Washington.

O desrespeito dos governos da Argentina, Brasil e Paraguai à Constituição e à Lei básica do MERCOSUL – o Tratado de Assunção e o Protocolo de Ouro Preto – é uma evidência assombrosa da ameaça autoritária com viés fascista que transborda da dinâmica interna dos países para o plano regional e continental.

O autoritarismo ultrapassa as fronteiras nacionais, e assume a personalidade de um bloco histórico supra-nacional, que se identifica e se articula organicamente na convergência das políticas de restauração neoliberal pretendidas por estes governos de direita.

A ideia que legitima esta ofensiva fascista é uma só: a de que simples maiorias ocasionais se convertem em instância de Poder, situadas acima da Lei e acima da Constituição. Por este princípio fascista, não é necessário respeitar-se as leis e as regras estabelecidas; não há mais previsibilidade e estabilidade jurídico-institucional, porque basta a imposição das vontades e dos desejos momentâneos de maiorias circunstanciais.

Esta ideia “mágica e sedutora” da legitimidade das decisões majoritárias é um veneno mortal à democracia: as Leis não mais governam e protegem as sociedades, porque as sociedades passam a ser governadas pelas vontades e pelos desejos de eventuais maiorias.

É exatamente isso o que está acontecendo no Brasil. A imposição do impeachment da Presidente Dilma sem fundamento legal e jurídico é uma arbitrariedade que denota o caráter totalitário que assume uma maioria parlamentar ocasional – “a assembléia geral de bandidos”, como a imprensa internacional chama a Câmara dos Deputados.

O impeachment não passa de uma farsa, de um mero pretexto cínico empunhado por uma maioria eventual justamente porque não se ampara em elementos jurídicos e fatos determinados, mas unicamente na capacidade desta maioria impor sua vontade, mesmo que em afronta ao Estado Democrático de Direito.

A obstrução do direito legal e legítimo da Venezuela exercer a presidência pro tempore do MERCOSUL viola a democracia comunitária, e significa a extensão da lógica fascista verificável nas dinâmicas nacionais, para o âmbito regional.

A institucionalidade do MERCOSUL, nascida no período de governos ultra-liberais pós-ditatoriais, incorporou o princípio do consenso entre os Estados-parte – e não o de decisões majoritárias – para o procedimento deliberativo no bloco.

A posição ideológica de José Serra, o chanceler usurpador do Brasil, de ataque à Venezuela e ao direito internacional, é uma guinada perigosa na rota na diplomacia brasileira. Esta guinada inaugura um precedente muito ruim, que desperdiça a confiança e seriedade conquistadas pelo Brasil no sistema das nações.

A estrutura permanente do Itamaraty, sempre a postos para invocar o “caráter de Estado” [e não de governo] da Chancelaria, está chamada a se pronunciar a respeito desta violência que comete seu chanceler usurpador, sob pena de contribuir para o aviltamento do ativo moral e geopolítico que o Brasil conquistou no mundo a partir do governo Lula.

Os governos reacionários de Macri, Temer e Cartes representam a ameaça mais nociva à institucionalidade comunitária nos 25 anos de existência do MERCOSUL.

Estes são os ares sombrios que começam soprar no MERCOSUL, e que poderão alcançar o continente sul-americano para finalmente atingir toda a América Latina.

É preciso intensificar a resistência democrática e expandir a luta contra os golpistas e os fascistas para além das fronteiras nacionais.

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