O mais nostálgico dos esportes

Por Luis Edmundo Araujo, editor de esporte do Cafezinho

A paixão do brasileiro pelo automobilismo vem do tempo do Circuito da Gávea, de quando os pilotos eram muito mais loucos que os de hoje em dia, e o público, entrando e saindo da pista à medida que passavam as baratinhas, pra se amontoar às dezenas a um passo do penhasco, com o mar batendo nos rochedos lá embaixo, também. Havia a figura notável da francesa Hellé-Nice, modelo erótica, dançarina e piloto, mas eram os reis italianos como Carlo Pintacuda, que venceu o Grande Prêmio Cidade do Rio de Janeiro em 1937 e 1838, ficou conhecido como o “herói da Gávea”, inspirou até marchinha do carnaval de 1950 e passou o cetro a um brasileiro legítimo, ainda que de sobrenome, lógico, italiano, como o nosso primeiro campeão mundial.

Os 14 anos que separam a última corrida de Chico Landi, em 1956, da primeira de Emerson Fittipaldi, em 1970, parecem uma eternidade se comparados com o que veio logo a seguir, com o surgimento de Nelson Piquet em 1978, ainda antes do fim da carreira de Emerson, durante a aventura da Copersucar, a equipe 100% nacional que se em termos de resultados não passou de um segundo lugar celebrado ensandecidamente, no mesmo lugar onde hoje o Parque Olímpico está prestes a receber os Jogos de 2016 , acabou de certa forma influenciando significativamente os rumos da Fórmula 1. Fittipaldi estava na McLaren, onde tinha conquistado seu segundo título mundial, em 1974, quando decidiu sair para mergulhar no sonho da Copersucar e abriu vaga para o inglês James Hunt, campeão mundial em 1976, protagonizar a rivalidade dos opostos com o austríaco Niki Lauda (tricampeão em 75, 77 e 1984), tão bem retratada naquele que talvez, quem sabe, seja o melhor filme já feito sobre o tema.

Irreverente, provocador, debochado por demais, Nelson Piquet já era bicampeão mundial, em 1981 e 1983, quando entrou em cena, em 1984, Ayrton Senna, primeiro com a pequena Toleman, fazendo história na chuva, depois na Lotus e, enfim, na McLaren onde, sob as bençãos de Galvão Bueno, virou o grande ídolo nacional, tricampeão mundial em 1988, 90 e 91, ainda com o tricampeonato de Piquet logo ali, em 1987. Havia o francês Alan Prost, o inglês Nigel Mansell (os outros dois da foto aí de cima), um pouco ainda de Niki Lauda e o Brasil parava toda manhã de domingo, às vezes à tarde, pra ver o mais global dos pilotos, namorado da Xuxa, empunhar a bandeirinha nacional ao som da marcha da vitória inaugurada por Piquet, que saudou também a última vitória dele, novamente se dando bem em cima de Mansell.

A marcha foi tocada ainda para Rubens Barrichello e para Felipe Massa, que por muito, muito pouco não mudava o rumo da história, mas acabou sem o título mundial, assim como o Rubinho, que serviu de escada ao alemão Michael Schummacher, heptacampeão, e quando teve a chance de ser campeão, perdeu de novo para o companheiro de equipe, no caso o inglês Jason Button.  O resultado foi que neste domingo teve corrida da Fórmula 1, na Alemanha, o inglês Lewis Hamilton ganhou e, a não ser os verdadeiramente aficcionados pela coisa, quase ninguém aqui no Brasil percebeu. Sem a paixão doida, desregrada das curvas por dentro do que hoje é a favela da Rocinha, contornando o Morro Dois Irmãos de outra favela, o Vidigal, à beira-mar pela Avenida Niemeyer; sem os ídolos que vieram bem depois disso, o automobilismo, pelo menos no Brasil, vive de seu passado glorioso, curioso. É, portanto, pelo para nós, brasileiros, o mais nostálgico dos esportes.

 

luis.edmundo@terra.com.br

Luis Edmundo: Luis Edmundo Araujo é jornalista e mora no Rio de Janeiro desde que nasceu, em 1972. Foi repórter do jornal O Fluminense, do Jornal do Brasil e das finadas revistas Incrível e Istoé Gente. No Jornal do Commercio, foi editor por 11 anos, até o fim do jornal, em maio de 2016.
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