Foto: Wilson Dias/ Agência Brasil
Petição é contra os juízes que têm raiva do Lula
Se todos apoiam Moro, nenhum pode julgar Lula!
A propósito da Petição enviada ao Presidente do Supremo, o Conversa Afiada entrevistou um dos signatários, o ex-Ministro da Justiça Eugênio Aragão:
PHA: Ministro, por que essa petição?
Aragão: A petição tem, sobretudo, a função de contrastar com posições corporativas que têm sido tomadas pelos magistrados. Os magistrados, aparentemente indignados pelo fato de que o presidente Lula ousou fazer uso de um recurso previsto no Direito internacional (dentro de um instrumento ao qual o Brasil aderiu e do qual faz parte)…
PHA: O senhor se refere, então, à Associação dos Magistrados e à Associação dos Juízes Federais, que hipotecaram, por esse episódio da ida do Lula à ONU, solidariedade ao juiz Moro?
Aragão: É, é uma situação muito constrangedora. Imagine uma categoria de juízes agindo politicamente desse jeito e rejeitando o direito de petição do presidente Lula contra abusos que se atribuem a um dos seus juízes. Isso significa que todos os juízes que se fazem representar por essas associações, em princípio se tornam suspeitos para atuar em relação ao presidente Lula. Isso mostra claramente o viés do preconceito e o viés, sobretudo, da indisposição e da raiva com que essas categorias com o fenômeno Luiz Inácio Lula da Silva na política brasileira. E por isso mesmo o apelo para uma instância internacional, que é mais isenta.
PHA: Eu posso dizer que essa é uma petição contra a raiva que eles têm do Lula?
Aragão: Isso, pode-se dizer isso.
PHA: O que o presidente do Supremo, Ricardo Lewandowski, pode fazer?
Aragão: Essa questão pode, pelo menos, ser levada ao CNJ ou pode ser o próprio presidente a tomar posição no sentido de reafirmar a legitimidade do instrumento utilizado pelo presidente Lula. Que isso sirva de indicativo para a Justiça brasileira de que ela, sim, deve também se submeter aos tratados internacionais e a seus instrumentos. Portanto, se o Comitê de Direitos Humanos vier a entender que houve abuso e que há, portanto, nítida suspeição pela falta de um juiz imparcial no caso Lula, isso deve ser levado em consideração pelas instâncias jurisdicionais brasileiras.
PHA: Eu entendo do seu raciocínio, então, que esses juízes que subscreveram esses documentos da Associação dos Magistrados e da Ajufe demonstram, como disse o advogado Geoffrey Robertson, que o Lula não pode ser julgado no Brasil com imparcialidade.
Aragão: Exatamente, exatamente! Porque se uma classe inteira se posiciona desse jeito, qual é o juiz que poderá ser contra-majoritário?
PHA: Agora, uma última pergunta, ministro: o senhor acredita que o CNJ seja capaz de tomar alguma atitude? O advogado José Francisco Siqueira Neto usa uma expressão que eu acho muito feliz: “O CNJ se tornou o Dieese da Justiça”, uma espécie de IBGE da Justiça, que fica fazendo estatísticas. O CNJ pode fazer o quê?
Aragão: O CNJ pode dar recomendações. Pode, inclusive, fazer uma declaração pública, através dos seus conselheiros, do seu plenário, de afirmar a legitimidade do uso dos instrumentos internacionais.
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Segue abaixo petição assinada por 64 juristas em apoio a ação movida pelo ex-presidente Lula na ONU:
NOTA EM DEFESA DO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO
Para: Presidente do Supremo Tribunal Federal (STF)
“Politicamente, o objetivo da democracia é a liberação do indivíduo das coações autoritárias, a sua participação no estabelecimento da regra, que, em todos os domínios, estará obrigado a observar. Econômica e socialmente, o benefício da democracia se traduz na existência, no seio da coletividade, de condições de vida que asseguram a cada um a segurança e a comodidade adquirida para a sua felicidade. Uma sociedade democrática é, pois, aquela em que se excluem as desigualdades devidas aos azares da vida econômica, em que a fortuna não é uma fonte de poder, em que os trabalhadores estejam ao abrigo da opressão que poderia facilitar sua necessidade de buscar um emprego, em que cada um, enfim, possa fazer valer um direito de obter da sociedade uma proteção contra os riscos da vida. A democracia social tende, assim, a estabelecer entre os indivíduos uma igualdade de fato que sua liberdade teórica é importante para assegurar”.
Lamentavelmente, desde que o governo progressista e da classe operária assumiu o poder com a eleição do Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva em 27 de outubro de 2002 (exercendo a Presidência da República por dois mandatos), as elites e a oligarquia, inconformadas com a ascensão da esquerda ao poder, iniciaram uma verdadeira caçada ao Presidente Lula com o apoio da grande mídia.
Embora tenha deixado a presidência da República há cerca de seis anos, Luiz Inácio Lula da Silva continua sofrendo ataques preconceituosos e discriminatórios. Agora as ofensas estão acompanhadas de uma tentativa vil de criminalizar o ex-presidente.
Por quê Lula? Porque ele é filho da miséria; porque ele é nordestino; porque ele não tem curso superior; porque ele foi sindicalista; porque foi torneiro mecânico; porque é fundador do PT; porque bebe cachaça; porque fez um governo preferencialmente para as classes mais baixas e vulneráveis; porque retirou da invisibilidade milhões de brasileiros etc. Lula é reconhecido internacionalmente como um lutador dos direitos dos trabalhadores para o desenvolvimento social do país, combatente das desigualdades sociais, especialmente, da miséria.
Fosse Luiz Inácio Lula da Silva um homem de posses, sulista, “doutor”, poliglota, bebesse vinho e tivesse governado para os poucos que detêm o poder e o capital em detrimento dos que lutam sofregamente para ter o mínimo necessário para uma vida com dignidade, certamente a história seria outra. Grande parte daqueles que rejeitam Lula o fazem pelo que ele representa e pelo que ele simboliza. Os poderosos e plutocratas nunca suportaram ser governados por um homem do povo, com a cara e o jeito do povo brasileiro. Do mesmo modo que a elite, boa parte das classes média alta, não aceita ver pobres, negros e a classe operária saindo da invisibilidade para frequentar lugares antes exclusivos das classes dominantes.
Esse mesmo “ódio” contra os excluídos (negros e miseráveis) é, também, direcionado a Luiz Inácio Lula da Silva quando ele passa de coadjuvante a protagonista, e ocupa a presidência da República. O “ódio” a Lula e ao povo reflete-se nos ataques aos programas sociais do governo como Bolsa Família, ProUni, Luz Para Todos etc. Essa odiosidade foi transferida para a sucessora de Luiz Inácio Lula da Silva, a Presidenta da República Dilma Vana Rousseff que é vítima de um golpe parlamentar que afrontou a democracia brasileira.
Algumas ações tomadas contra Lula, especialmente pelo juiz Federal Sérgio Moro, demonstram claramente o viés parcial e autoritário das medidas que atentaram contra os direitos fundamentais, dele Lula, de seus familiares e até mesmo de seus advogados de defesa.
Assim, depois de ser levado a depor coercitivamente (em 04 de março de 2016), por ordem do juiz Federal da 13ª Vara Federal de Curitiba Sérgio Moro, depois de ter suas conversas gravadas e divulgadas, inclusive com a Presidenta da República Dilma Vana Rousseff – diálogos divulgados em rede nacional – e depois de ser impedido de assumir o ministério da Casa Civil, Luiz Inácio Lula da Silva é processado indevidamente e sem qualquer lastro probatório que pudesse fundamentar a ação penal, que tem caráter nitidamente político e viciado pela parcialidade daqueles que não se envergonham de rasgar a Constituição da República e atropelar os princípios fundamentais, notadamente, a presunção de inocência e o devido processo legal.
Cumpre ressaltar que, em relação à condução coercitiva do ex-presidente Lula, o ministro Marco Aurélio do STF (Supremo Tribunal Federal) assim manifestou-se:
“Eu não entendo. Um mandado de condução coercitiva só é aplicável quando um indivíduo apresenta resistência e não aparece para depor. E Lula não recebeu uma intimação (…) Será que ele (Lula) quer esse tipo de proteção? Eu acredito que, na verdade, este argumento foi dado para justificar um ato de força. (…) Este é um revés, e não um progresso. (…) Somos juízes, e não legisladores, ou vingadores.”
No que diz respeito à divulgação das transcrições das fitas ilegais para os meios de comunicação, o juiz Federal Sérgio Moro tentou justificar a medida arbitrária e abusiva no interesse público, apesar disso não ser defensável. O pedido de desculpas feita pelo condutor da Operação Lava Jato foi rejeitado pelo Ministro Teori Zavascki do STF quando por ele analisada ação proposta pela Presidenta Dilma:
“A divulgação pública das conversas é inaceitável… Contra uma regra constitucional expressa (ver parágrafo 22 acima), não é razoável dizer que o interesse público justifica a divulgação ou que as partes afetadas são figuras públicas (como se eles não tivessem direito à privacidade) … é preciso reconhecer a irreversibilidade dos efeitos práticos decorrentes da divulgação indevida das conversas telefônicas”.
Não é sem razão que Luiz Inácio Lula da Silva foi buscar por meio de Comunicação no âmbito do Protocolo Facultativo ao Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos (ICCPR), no Escritório do Alto Comissariado dos Direitos Humanos das Nações Unidas em Genebra, Suíça, a preservação dos direitos fundamentais, dos direitos humanos e do próprio Estado Democrático de Direito – que vem sendo assaltado pelos inimigos da democracia e pelo autoritarismo de agentes do Estado.
Segundo a petição apresentada em 28 de julho de 2016, foram violados os seguintes artigos do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos:
“(i) Artigo 9 (1) e (4) – proteção contra a prisão ou detenção arbitrária
(ii) Artigo 14 (1) – o direito a um tribunal independente e imparcial
(iii) Artigo 14 (2) – direito de ser presumido inocente até que se prove a culpa por lei
(iv) Artigo 17 – proteção contra interferências arbitrárias ou ilegais na privacidade, família, lar ou correspondência, e contra ofensas ilegais à honra ou reputação”.
Causa estranheza, e é objeto de nosso repúdio, as notas emitidas pela Associação dos Magistrados Brasileiros – AMB e pela Associação dos Juízes Federais – AJUFE que, apressadamente e de pronto, criticaram a ação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, por meio de seus advogados, de acionar o Comitê de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU), para que lhe seja garantido julgamento justo e imparcial livre do ódio e do autoritarismo.
Não é despiciendo lembrar que o Brasil é, desde 1992, signatário do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos da ONU e, desde 2009, também do seu Protocolo Facultativo, que prevê expressamente a possibilidade de qualquer pessoa encaminhar comunicação escrita ao referido Comitê, quando se sentirem ameaçadas pela violação dos direitos protegidos pelo Pacto de Direitos Civis e Políticos da ONU.
Assim sendo, e por todo exposto, os abaixo-assinados manifestam publicamente apoio às medidas tomadas pelos defensores do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em seu nome e em defesa das garantias fundamentais como postulados indispensáveis do Estado Democrático de Direito.
Já assinaram:
1- Leonardo Isaac Yarochewsky – Advogado e Professor de direito penal da PUC-Minas;
2- João Ricardo W. Dornelles. Professor de Direito da PUC-Rio e Coordenador-Geral do Núcleo de Direitos Humanos da PUC-Rio;
3- Wilson Ramos Filho, Doutor em Direito, professor na UFPR;
4- Márcio Tenenbaum, advogado RJ;
5- Carol Proner, professora da UFRJ;
6- Claudia Maria Barbosa, professora PUC/PR;
7- Maria Luíza Flores da Cunha Bierrenbach, advogada, Membro da Comissão Justiça e Paz/SP;
8- Tarso Cabral Violin, advogado e professor de Direito Administrativo;
9- Maria Luiza Pereira de Alencar Mayer Feitosa, professora, Doutora em Direito Econômico CCJ- UFPB;
10- Nasser Ahmad Allan, advogado e professor universitário;
11- Maria Luiza Quaresma Tonelli, advogada;
12- Erivan da Silva Raposo, antropólogo e cientista político;
13- Lívia Maria Marques Sampaio. Economista Ba/ Mestre em Comunicação e Culturas Contemporâneas – UFBa;
14 – Moacyr Parra Motta. Advogado/Mestre em Direito Constitucional – UFMG;
15- Gisele Cittadino – Professora da PUC-RJ;
16- Gisele Silva Araújo – Doutora/Mestre em Sociologia, Bacharel em Direito e Ciências Sociais, Professora da Unirio;
17- Juliana Neuenschwander Magalhães – Professora da Faculdade Nacional de Direito UFRJ;
18- Rômulo de Andrade Moreira – Procurador de Justiça na Bahia e Professor de Direito Processual Penal na Faculdade de Direito da Universidade Salvador – UNIFACS;
19 – Magda Barros Biavaschi – Desembargadora aposentada do TRT4, professora convidada e pesquisadora CESIT/UNICAMP;
20 – Manoel Moraes professor universitário, cientista político e defensor de direitos humanos;
21 – Daniel torres de Cerqueira. Professor universitário. Mestre em direito UFSC;
22 – Sérgio Luiz Pinheiro Sant’Anna, Procurador Federal e Professor de Direito Constitucional da UCAM;
23 – Pedro Estevam Serrano, professor da PUC/SP;
24 – Luiz Carlos da Rocha, advogado e Mestre em Direito;
25 -Maria Goretti Nagime. Advogada, professora e mestranda em Sociologia Política na UENF;
26 – Sergio Graziano, advogado e professor da Universidade de Caxias do Sul (RS);
27 -Daniela Felix, Advogada e Professora Cesusc, Mestre em Direito PPGD/UFSC;
28 – Marcelo Cattoni – Professor da Faculdade de Direito da UFMG;
29 – Maria Helena Barros de Oliveira advogada, pesquisadora e chefe do Departamento Direitos Humanos e Saúde da Fiocruz;
30 – Emerson Lopes Brotto, Advogado e Mestre em História (UPF);
31 – Wadih Damous – Deputado Federal e Advogado;
32 – Marcos Rocha, doutor em Políticas Públicas e Formação Humana (UERJ) e professor de direitos humanos;
33- : Ipojucan Demétrius Vecchi, advogado, professor de direito do trabalho da UPF;
34 – Denise Assis, jornalista;
35 – Marilia Kairuz Baracat, advogada, mestre em direito;
36 – Meiriene Cavalcante Barbosa, jornalista, mestra e doutoranda em educação pela Unicamp;
37 – Eugênio José Guilherme de Aragão, ex-ministro da Justiça e professor de Direito Internacional Público da UnB;
38 – Marcelo Neves, professor titular de Direito Público da Faculdade de Direito da UnB;
39 – Manoel Volkmer de Castilho, ex-Consultor-Geral da União e ex-Juiz Federal da 4a. Região;
40 – Juarez Estevam Xavier Tavares, professor titular de Direito Penal – UERJ;
41 – Cecilia Caballero Lois, Professora Associada da Faculdade Nacional de Direito/ UFRJ;
42 – Gustavo Ferreira Santos, Professor de Direito Constitucional da UNICAP e da UFPE;
43 – Jefferson Martins de Oliveira, Advogado sindical;
44 – José Carlos Moreira da Silva Filho – Professor no Programa de Pós-Graduação em Ciências Criminais da PUC-RS e Vice-Presidente da Comissão de Anistia do Brasil;
45 – Virginius Lianza da Franca, advogado;
46 – Geraldo Prado, professor UFRJ;
47 – Francisco Celso Calmon Ferreira da Silva, advogado e consultor organizacional;
48 – Marta Guerra, advogada – RN;
49 – Luiz Moreira Gomes Júnior, mestre em filosofia, doutor em Direito, professor da PUC-RJ, ex-Conselheiro do CNMP;
50 – Zora Motta, Arquiteta;
51- Stella Bruna Santo, advogada;
52 – Rodrigo Botelho Campos, economista;
53 – Lilian Ribeiro, advogada SP;
54 – Sueli Aparecida Bellato, advogada;
55 – Carmen da Costa Barros, advogada;
56 – Mariana de Lima e Silva, antropóloga, Brasília – DF;
57 – Faní Quitéria Nascimento Rehem, professora UEFS;
58 – Juarez Cirino dos Santos, advogado e professor do Instituto de Criminologia e Política Criminal;
59 – Flávio Crocce Caetano, advogado, ex-Secretário Nacional da Reforma do Judiciário;
60 – Lucimara Morais Lima, advogada;
61 – Marthius Sávio Cavalcante Lobato, advogado, professor, mestre e doutor em Direito, Estado e Constituição pela UnB; estágio pós-doutoral em Direito Público pela Universidade de Paris III;
62 – Carlos Vasconcelos, Subprocurador-Geral da República;
63 – Wagner Gonçalves, advogado e Subprocurador-Geral da República aposentado;
64 – Alvaro Augusto Ribeiro costa, ex-Advogado Geral da União, advogado e Subprocurador-Geral da República aposentado;
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