Por Bajonas Teixeira de Brito Junior, editor de política do Cafezinho
Sumo sacerdote coxinha, guia da parte da classe média que tem muita massa por fora e pouco recheio por dentro, figura pública número um para a costura do golpe, de repente Aécio desapareceu como por encanto. Como o gato de Alice, dele ficou só o sorriso no ar, uma lembrança fugaz num vazio pontilhado de interrogações.
E o sorriso sem gato de Aécio está também se desmanchando no ar, deixando no lugar de cada dente sorridente uma interrogação encurvada.
Pois é. Onde havia um Aécio hoje há um enxame de interrogações, que voejam como moscas varejeiras, e cujo zumbido incessante parece chamar o nome do líder, presidente do PSDB e quase presidente brasileiro.
É possível que Aécio esteja bem e gozando de saúde invejável, agachado talvez – “na moita”, como se diz em Minas – atrás de alguma bananeira nativa das Alterosas ou fincada nas areias de Ipanema. Acossado pela timidez, ou pelas denúncias que envolvem seu nome em não sei quantas delações premiadas, o líder parece que optou por empreender a fuga. Recolheu o sorriso na boca, e sem despedir do leitorado nem deixar endereço ou contato (a não ser os de sempre, na redação de O Globo), passou sebo nas canelas, pôs o farnel nas costas, e se mandou por esse mundão afora.
Aécio está trancado à quatro chaves, blindado pelos quatro cantos, e hermeticamente embalado para se manter longe do contato digital da opinião pública. Não se vê, não se ouve, não se divisa sua augusta figura. Ele que, pelo que dizem as denúncias, costumava driblar alguns interdições incômodas das leis com a mesma desenvoltura com que uma enguia escorregaria pelos parágrafos do Código Penal, parece que se recolheu em penitência voluntária.
Mas pode ser que não. É possível que ele tenha querido apenas dar um tempo. A vida é assim, a vida política ainda mais, de repente, a pessoa tem que buscar um tempo para si e para a família.
Mas sendo assim é estanho, porque dá a impressão que Aécio se recolheu, preventivamente, em voluntária prisão domiciliar. Mas, evidentemente, isso não faz sentido, porque generoso como é, Aécio deixaria Aécio soltinho para dar seus rolés por aí e arreganhar o seu sorriso comunicativo pelo país. Nem prisão domiciliar nem internação voluntária.
Mas nada impede, descartada as hipóteses anteriores, uma reclusão autoimposta em busca de desintox longe da embriaguez da política brasileira. Um evento desintox recente se anunciava assim:
Vamos juntos realizar uma faxina completa no corpo e na mente com um time incrível de especialistas? É assim que será o nosso próximo dia 18 de junho. Um sábado inteiro planejado especialmente para que você possa estabelecer uma nova consciência sobre si mesmo, eliminar suas dores emocionais, praticar yoga, aprender sobre alimentação ayurvédica e encontrar pessoas que compartilham com você a busca por mais equilíbrio, felicidade e autoconhecimento.
Mas o evento já passou e a Globo não nos deu nenhum notinha sobre a presença do Aécio por lá. E pelo número das delações de que é alvo, se forem todas ou algumas delas verdadeiras, de fato um sábado de desintox não teria muita serventia. O ideal, para sua “faxina completa no corpo e na mente”, seria uns vinte anos de recolhimento à bem da coisa pública.
Enquanto o mistério perdura, e as bananeiras da orla de Ipanema não são vistoriadas, teremos que conviver com a ausência de Aécio. Politicamente Aécio pode estar na UTI, respirando através de aparelhos (O Globo, O Estado de Minas, etc.). Não voltará, ao que tudo indica, a conduzir multidões de boiadas fantasmas para os currais eleitorais. Ou voltará?
Na verdade, se o golpe passar da interinidade para a perenidade, se o poder da Globo se afirmar em toda a sua majestade, como parece provável nesse momento, a hipnose zumbi exercida sobre as multidões robotizadas poderá facilmente trazer Aécio de volta do além túmulo.
Vivemos num admirável mundo novo em que tudo é possível para a mídia. Pior que os andróides de Blade Runner, que agiam sozinhos e, principalmente, pensavam sozinhos, a nossa classe média coxinha não possui luz própria. Sem a mídia ela não pensa nem age. E, é claro, também não vota.