Por Tadeu Porto* (@tadeuporto) colunista do Blog O Cafezinho
Imaginem, nem que seja por um pequeno instante, a seguinte situação: Dilma assume a presidência e, em entrevista a um jornal de grande circulação, responde a uma pergunta específica com a seguinte frase: “A bancada do PT de Minas está acertando com a Petrobrás. Vou devolver a estatal a eles”.
Oras, parece não ser tão difícil projetar o que aconteceria. Vejamos:
Reinaldo Azevedo escreveria uma coluna do tipo “Horror, horror!! Petralhas querem o Brasil de volta!”; Diego Escosteguy faria um periscope explicando como a presidente pretende retomar o esquema de corrupção; o MBL chamaria uma manifestação contra o ~aparelhamento~ da Petrobras (e pedindo para banir venezuelanas do Miss Universo); Veja e Época publicariam revistas com a Dilma na capa e títulos derivados de “O esquema da Lava-Jato volta”; A Folha daria destaque ao título “Dilma volta a roubar a Petrobras” para depois publicar um erramos no rodapé da caderno Folha Corrida; William Bonner gastaria 20min no JN passando a imagem de um oleoduto escorrendo dinheiro; e, por fim, Aécio Neves apareceria em todas as mídias para se dizer contra esse “absurdo” e que vai fazer o possível para “moralizar o país e acabar com a corrupção e com o PT”.
Agora peguem a mesma abstração que propus no primeiro parágrafo, substituam Dilma por Temer (sei que é difícil, mas é só virtualmente), PT por PMDB e a Petrobrás por Furnas.
O interessante é que o resultado dessa combinação existe no mundo material e aconteceu, há três dias, numa entrevista do vice-presidente decorativo ao Estadão.
Para ser mais preciso, cito aqui o próprio Michel:
“Estamos examinando com calma. A bancada do PMDB de Minas está acertando com Furnas. Vou devolver a estatal a eles. Furnas pode ser mais expressiva politicamente do que o Turismo. Tem Chesf, Eletronorte, Eletrosul, Itaipu…”
No melhor do minerês, prestenção nesse trem: o presidente em exercício, que precisa de votos no senado para se efetivar (e pode compra-los com favores), diz para todo o país ler e escutar que vai aparelhar uma das maiores estatais do país.
E o que acontece na chamada grande imprensa? Quase nada, se não fosse a coluna do Bernardo Mello da FSP. Nenhuma treta foi iniciada e nada de negativo ao governo apareceu, como se nossos veículos de comunicação fossem centros avançados de deboísmo (aliás, aqui vai um exemplo do Reinaldo Azevedo super deboas com delações) .
Quer dizer, existe uma empresa pública – interesse direto da população – sendo investigada por possíveis atos ilícitos de pessoas que já não fazem mais parte da companhia e o chefe do executivo interino afirma, com toda a tranquilidade do mundo, que vai devolver a empresa para as mãos do grupo que pode ter a lesado.
Vale relembrar que a proximidade de Aécio Neves e o PMDB mineiro, em seus tempos de “Lulécio”, foi tamanha a ponto do ex-governador mineiro ser cogitado a se candidatar a presidente ainda em 2010 pelo Partido de Temer (a convite deste). Ou seja, o “mais vulnerável”, o campeão de aparecimento em delações caso de Furnas, o menino que, segundo delatores, levava um terço só para ele (e olha que dividia o resto com um país inteiro e com o maior estado da federação) pode ver seus coleguinhas voltarem a dirigir a empresa no melhor estilo “Vale a Pena Ver de Novo”.
E tudo isso sem nenhum protesto da mídia investigativa, tão entusiasta da maior investigação da história do país, a intocável – pelo menos por enquanto – operação Lava-Jato.
Uma mídia que aceita uma fala bizarra como a de Temer sem demonstrar a população a verdade – que devolver Furnas ao PMDB mineiro é como fumar cigarro para se livrar dos adesivos de tabaco – é muito mais do que golpista, é a materialização do que há de mais canalha nesse perverso jogo político que vivemos.
Tadeu Porto é diretor do Sindicato dos Petroleiros do Norte Fluminense (SindipetroNF)
Leitora Brasileira
18/07/2016 - 11h54
Excelente artigo. É realmente uma situação revoltante essa.