O liberalismo brasileiro segue os preceitos de Xerxes

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Análise Diária de Conjuntura – 12/07/2016

Não existe nada tão falso como o liberalismo brasileiro. E o golpe serviu para desmascará-lo mais uma vez.

O liberalismo, quando autêntico, tem um lado bom: defende a liberdade e garantias individuais, sobretudo contra o Estado.

Aqui no Brasil é o contrário.

Temos o liberalismo de Xerxes, o rei divino da Pérsia Antiga. A casta burocrática é o nosso Xerxes.

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Uma das provas mais contundentes de que as principais forças do golpe estão no próprio Estado, formadas pelas castas burocráticas, é a gana com que a nova correlação de forças vem flertando com medidas cada vez mais autoritárias, repressivas, que ampliam o poder do Estado e reduzem as garantias e liberdades individuais.

Hoje me deparo com essa manifestação de uma senadora da república:

Há tempos não me deparava com uma cretinice fascista desse quilate! A imagem com a frase foi produzida pela própria equipe da senadora. Ou seja, ela quer, efetivamente, faturar em cima desse sentimento de autoritarismo e brutalidade que a mídia conseguiu cultivar em parte da população brasileira.

Há também um aspecto irônico. O partido da senadora, o PP, é de longe o mais envolvido na Lava Jato, com mais deputados indiciados, presos ou condenados.

A guerra semiótica, contudo, tem suas contradições. Para o vulgo, não é o PP que está envolvido na Lava Jato, e sim o PT.

Na Câmara, corre projeto de lei vinculado às 10 medidas contra a corrupção pedidas pelo Ministério Público Federal, e que, na prática, apenas irá reduzir direitos e garantias de todos os cidadãos brasileiros, e aumentar o poder discricionário do Estado sobre a liberdade de todos.  É um projeto profundamente antiliberal.

Na última edição do “Congresso em Notas”, publicação regular produzida por uma organização acadêmica, distribuída em parceria pelo Cafezinho, há uma observação interessante: nem sequer são apenas 10 medidas. O número foi criado apenas para criar semelhança com os 10 mandamentos bíblicos. São 60 páginas de regras que dão poder ao Estado repressor e tiram direitos de cidadãos, empresas e políticos de se defenderem das conspirações, violências e armadilhas das próprias castas burocráticas.

O golpe dado em Dilma é a prova cabal de que não se deve, em absoluto, conceder mais poder às castas burocráticas. Ao contrário, é preciso reduzir o poder do Ministério Público, do Judiciário e da Polícia Federal, e elevar o poder das defensorias públicas, do legislativo e do executivo. E olha que eu falo isso mesmo diante do legislativo conservador e corrupto que nós temos, porque entendo que, mesmo com tantos defeitos, ainda é um universo filtrado pelo sufrágio universal, e, portanto, colorido pela democracia. Deputados, senadores, prefeitos, governadores, presidentes, não tem cargos vitalícios. Promotores, procuradores, juízes, delegados, sim: tem cargos vitalícios, e não são escolhidos pelo povo.

Outro arbítrio, também denunciado no Congresso em Notas: aproveitando as Olimpíadas, o Senado pode votar e aprovar hoje um projeto de lei que “prevê que homicídios praticados por militares contra civis serão julgados pela Justiça Militar (e não pelo Tribunal do Júri) quando o militar estiver em ‘cumprimento de atribuições que lhes forem estabelecidas pelo Presidente da República ou pelo Ministro de Estado da Defesa’. É uma regra de exceção, que altera o processo penal e confere poderes discricionários ao Presidente e ao Ministro. A justificativa dada são as Olimpíadas. Mas passado o evento, a lei continuará vigendo.”

Naturalmente, é um absurdo. Dá poder de vida e morte ao presidente da república e ao ministro da Defesa, porque eles podem ordenar a repressão militar a movimentos sociais e protestos políticos e, em caso de uma fatalidade provocada por algum abuso por parte do Exército, não haverá julgamento comum, e sim um julgamento militar, com todas as suas características de proteção corporativa ao criminoso.

Parte da crise que assistimos hoje nasceu da derrubada da PEC 37, que ajudaria a moralizar e regulamentar as investigações feitas pelo Ministério Público, hoje completamente sem controle. O MP e a grande mídia aproveitaram as manifestações de junho de 2013 para passar a falsa impressão de que os protestos populares eram contra a PEC 37. Ora, as pessoas nem sabiam do que se tratava. O MP gastou uma nota imprimindo faixas gigantes contra a PEC 37, que posicionava no meio das jornadas de junho.

Outro motivo da crise foram as leis anticorrupção sancionadas por Dilma, como a da delação premiada e da punição ao corruptor. Não houve o necessário debate com setores progressistas da área do direito, que alertariam para o aumento perigoso do poder das castas burocráticas.

É ótimo poder prender o corruptor, mas não se pode esquecer que, tão importante quanto isso, é impedir que o Estado não abuse de seu poder para apontar o dedo seletivamente para o corruptor de sua preferência.

Quando à delação premiada, está claro agora que ela deu ao Ministério Público um poder ilimitado de conspiração: porque o procurador pode manipular a delação premiada em suas várias etapas. Pode manipular a própria entrevista com o delator, dando a entender que prefere delação deste ou daquele grupo político. Pode manipular a transcrição da entrevista. Pode vazar o conteúdo da delação antes mesmo dela correr, ou seja, ainda na fase da negociação com o delator: são as delações futurísticas, segundo as quais o delator “irá denunciar sicrano ou fulano”. Pode escolher o que e quando vazar, seguindo uma agenda política ( ou seja, pode conspirar).

A mídia, por sua vez, lucra com a delação, porque também pode dar ênfase neste ou naquele depoimento. Uma delação contra o PT, por exemplo, merece 10 minutos no Jornal Nacional. Uma contra o PSDB, 30 segundos, com direito a 3 minutos de resposta.

É lamentável portanto que estejamos todos abraçando essa mentalidade policial. A gente acusa os adversários de serem “investigados”, de terem sido “delatados”, como se isso significasse alguma coisa. Ora, todo mundo pode ser investigado. Todo mundo pode ser delatado.

No Estado Policial não há mais política: apenas uma batalha de opinião pública entre “investigados” e “não-investigados”. Alguém tem projetos para mobilidade urbana?

Algum político tem opinião franca sobre o futuro do capitalismo, o sentido do socialismo, o alcance das políticas de distribuição de renda, o SUS, a reforma agrária?

Não, imprensa e militância fazem uma guerra de desinformação, sempre com base em vazamentos feitos pela Lava Jato, contra uns e outros.

Enquanto isso, a sociedade, irritada e tensionada, tende a aceitar leis autoritárias, que elevam a repressão e cassam garantias, liberdades e direitos.

Ou seja, em nome dos corruptos, os honestos perdem a sua liberdade!

Sim, porque todos se esquecem do principal, do espírito supremo que rege a doutrina democrática, a liberdade! E o conceito de liberdade que emerge de décadas de crise capitalista e da ruína do totalitarismo comunista não é justamente a liberdade como garantia contra a violência do Estado?

Se a corrupção nasce principalmente da relação promíscua entre empresas privadas e o Estado, como assim iremos combatê-la dando mais poder ao Estado, ou seja, ao agente da corrupção?

Ora, a tentativa de criminalizar a política, em nome do combate à corrupção, é uma falácia, um ardil da própria corrupção, que precisa se aninhar junto a um fonte mais estável de poder: as próprias castas burocráticas.

Quem irá investigar a corrupção no Ministério Público, no Judiciário e na Polícia Federal?

A única maneira duradoura, segura, eficaz, de combater a corrupção é aprofundando a democracia, ou seja, elevando a transparência e dando autonomia não apenas aos órgãos de investigação como também às corregedorias destes órgãos. E sobretudo, criando instrumentos de mais participação popular, para que a própria população monitore as obras, pequenas e grandes, que o Estado faz, supostamente, em seu favor.

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Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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