Análise Diária de Conjuntura – 11/07/2016
Estávamos na Cinelândia, há pouco mais de um mês, num dos eventos contra o golpe, eu já tinha tomado algumas cervejas, e disse ao amigo, que ouviu com olhos horrorizados, que eu não estava lendo mais nada da imprensa brasileira.
“Estou relendo Shakespeare”, eu disse.
Diante do pesadelo que se tornou a política brasileira, ou melhor, diante do pesadelo que se tornou o noticiário político nacional (que é diferente da política propriamente dita), a melhor maneira de entender a conjuntura é simplesmente não ler e não ver nada produzido pela grande imprensa corporativa.
Explico melhor: o Brasil está mergulhado na guerra híbrida. É uma guerra eminentemente semiótica, sofisticada, e que vitima, assim como uma praia perigosa, os melhores nadadores, ou seja, os leitores mais vorazes da mídia.
A imprensa brasileira se tornou, definitivamente, radioativa: ela não apenas te desinforma, ela deprime, te deixa doente, te transforma num zumbi.
E não é com esse estado de ânimo que você conseguirá analisar objetivamente a conjuntura política nacional.
Quando eu lembro que ministros do STF, incluindo aí os que achávamos os melhores (já devíamos ter desconfiado), como Ricardo Lewandowski, telefonavam para… Merval Pereira, para se justificar em relação a um pronunciamento, uma decisão, então a gente entende muito bem porque houve esse golpe.
O STF foi completamente contaminado pela radiotividade midiática.
Veja a nossa próxima presidente do STF, Carmen Lúcia, recebendo o prêmio Faz Diferença das mãos de José Roberto Marinho.
É como um ministro da suprema corte americana, num governo democrata, receber prêmio da Fox…
Prêmios para juízes viraram moda. É uma forma moderna de propina, bem típica da nossa era midiática. Vale mais que dinheiro, porque, de posse de um prêmio desses, você pode sair por aí vendendo palestras.
Não entendo como não se proíbe juiz de ganhar prêmio!
Prêmio para juiz é a coisa mais antirrepublicana, mais antidemocrática, mais amoral que eu posso imaginar!
Sergio Moro também ganhou o Faz Diferença, claro. E, recentemente, ganhou um prêmio da revista Time, que se teve alguma importância, num passado distante, hoje é um sub-Veja americana, decadente e degenerada, submissa ao que há de mais podre, corrupto e brutal na política dos Estados Unidos.
Não é que você não precisa ler. Ao contrário. Nunca foi tão importante, como hoje, acumular uma boa bagagem de leitura. A informação, hoje, é a única arma à disposição dos povos sob ataque das guerras híbridas.
Mas você precisa ler as fontes certas.
O Brasil, repito, tornou-se agora o epicentro da guerra híbrida mundial, que é baseada sobretudo em manipulação das notícias, objetivando produzir consenso social em favor dos interesses do imperialismo.
Em países com governos fortes, como China e Rússia, a guerra híbrida tem mais dificuldade de ser bem sucedida.
O Brasil é o terreno perfeito.
O governo era fraco. A presidenta, ruim de comunicação pessoal. A esquerda, ingênua e desorganizada.
E a grande mídia corporativa, decadente, abraçou entusiasticamente a oportunidade de vender barato o seu próprio país.
Vejam o caso da Lava Jato.
É incrível como ela consegue pautar todo o espectro midiático nacional.
Quando as acusações contra seu partidarismo começam a se avolumar demais, ela começa a vazar delações contra caciques do PSDB.
É um jogo que ela vem fazendo desde o seu início.
Nada muito explosivo, que possa destruir o PSDB, mas apenas para desmoralizá-lo e intimidá-lo um pouco também, para que ele possa se manter obediente ao núcleo de poder principal: a dupla mídia & Lava Jato.
E também para empoderar a própria operação, preparando o terreno para ataques mais ousados – e mais absurdos, como prender Lula.
É sempre o mesmo método. A esquerda cai como um patinho. Delações contra Serra, Aloysio Nunes, mais uma contra Aécio?
Pronto, viramos todos zumbis de Sergio Moro, entusiastas da Lava Jato.
A Lava Jato, arma principal da guerra híbrida, transformou a opinião nacional inteira, da direita à esquerda, num exército de patetas repetindo suas descobertas.
José Roberto Barroso, em entrevista à Globo, elogiou a Lava Jato nesses termos:
a melhor coisa que os rapazes de Curitiba fizeram foi oferecer um bom exemplo.
(…) uniram-se membros do Ministério Público, Polícia Federal e a magistratura em um pacto de seriedade, de qualidade técnica, de trabalho de patriotismo, para ajudar a enfrentar um problema brasileiro, que é a corrupção”.
Pacto de patriotismo? Viajar aos EUA, às expensas públicas, para entregar informações contra a Petrobrás ao Departamento de Estado americano?
Destruir as maiores indústrias de engenharia do país?
Atacar o centro de pequisas da Petrobrás?
Paralisar a fabricação do nosso submarino nuclear?
Isso é pacto de patriotismo?
Além do mais, Barroso sabe muito bem que PF, judiciário e MP não podem “se unir”. A luta nunca pode ser apenas contra a corrupção, e sim contra o autoritarismo, que se infiltra o tempo inteiro no aparelho do Estado. Para isso existe separação de poderes. Senão não havia sentido existir um Judiciário, uma PF e um MP: podíamos ter um órgão só, como na Pérsia de Xerxes.
É impressionante a pusilanimidade, a covardia, de nossos ministros do STF. Quando penso nisso, entendo melhor o golpe: quem mandou o PT nomear esses covardes?
O Instituto dos Advogados Brasileiros divulgou uma nota de repúdio.
Mas não é suficiente.
Qual o resultado da Lava Jato? 1) golpe de Estado; 2) um novo governo infinitamente mais corrupto, cheio de ministros investigados; 3) vitória dos partidos e parlamentares mais corruptos e reacionários; 4) vitória da mesma mídia nascida do mesmo status quo que gerou toda essa corrupção; 5) desorganização de setores estratégicos da economia nacional, como petróleo, energia nuclear, hidrelétricas, etc; 6) aumento no desemprego provocado pela desorganização desses setores; 7) desmoralização do partido político que sempre apresentou os menores índices de corrupção parlamentar, o PT, um dos partidos trabalhistas mais importantes do mundo.
A lista de irregularidades da Lava Jato é gigantesca. O ministro Barroso será um dos que irão julgar os recursos. O mínimo que ele podia fazer é se abster de elogios levianos contra uma operação que tanto mal causou o país.
Barroso também fala que as empresas “pensarão duas vezes” antes de fazer caixa 2 nas próximas eleições. Ora, Barroso! Tanto estudo para retrocedermos a Lei de Talião… Olho por olho, dente por dente?
As declarações de Barroso cumprem, naturalmente, um objetivo: blindar-se, abrigar-se junto ao quentinho da mídia, e da própria Lava Jato: afinal, a aliança entre Lava Jato e mídia é o núcleo de poder mais importante no Brasil hoje.
Quem pode, pode, quem não pode, se sacode.
Há outras fontes importantes de poder, mas essa é, com certeza, a mais perigosa: qualquer autoridade, jornalista, cidadão, que ousar criticar a Lava Jato se torna, automaticamente, alvo da operação.
Até mesmo delegados da polícia federal, como se viu na última etapa da Lava Jato, destinada especificamente a intimidar qualquer setor de dentro da própria PF que ouse criticar a operação.
Vejam o caso do juiz do STJ, Marcelo Navarro Ribeiro Dantas. Foi a melhor nomeação de Dilma para o STJ. Um juiz garantista, corajoso, respeitoso da constituição, disposto a enfrentar o golpe.
Foi o bastante para se tornar alvo do mais violento ataque midiático jamais visto a um ministro do STJ.
Nenhum outro ministro do STJ ou do STF foi em sua defesa.
As acusações eram as mais ridículas possíveis, mas com linguagem incrivelmente pesadas: Navarro teria sido nomeado para “soltar empreiteiros”, estaria “envolvido na Lava Jato”…
Como de praxe, nenhuma prova.
Os próprios ministros do STF também foram vítimas da Lava Jato. Alguns vazamentos envolvendo-os tinham objetivo claro de intimidar a corte. E conseguiram.
Em seguida, Sergio Moro vaza – ilegalmente – áudios em que Lula diz que o STF estaria acovardado. O que faz o STF? Ao invés de reagir duramente à pistolagem de Sergio Moro, critica… Lula, que fez uma crítica à corte num telefonema privado…
Ora, STF não apenas está acovardado, ele se tornou delinquente, golpista. Essas entrevistas de Barroso à Globo, o prêmio da Globo à Carmen Lúcia, a postura de Toffoli chancelando o golpe no Jornal Nacional…
Nojo!
Por que o STF removeu Cunha da presidência da Câmara apenas depois da votação do impeachment na Câmara?
Pensar a política brasileira se tornou um exercício duro demais, por isso o meu cuidado para evitar a contaminação radioativa da mídia.
PS: Estou devendo uma análise de conjuntura, que não fiz na sexta-feira passada. Vou pagar essa “dívida” na quinta-feira, com um material especial que estou preparando…