Foto: El Comércio
Por Luis Edmundo Araujo, editor de esporte do Cafezinho
O valente Independiente del Valle, que fez sua estreia na primeira divisão equatoriana há nem bem seis anos, venceu por 2 a 1 ontem o Boca Juniors da Argentina, hexacampeão, no primeiro duelo pela semifinal da Taça Libertadores da América. Os equatorianos jogaram em casa, no Estádio Olímpico Atahualpa, em Sangolqui, cidade a 2,5 mil metros de altitude, bem próxima à capital Quito. Na volta, na mítica Bombonera, basta a vitória simples, por 1 a 0, para o campeoníssimo Boca, mas diante da atuação do Independiente e do golaço da vitória, não dá pra cravar nada. A própria história da Libertadores tem exemplos de sobra de sua veia democrática, ainda que nada amistosa, de vitórias inesperadas de times ditos menores que, inclusive, vêm crescendo nestas três últimas edições do torneio, em que ficou nítida, na frieza dos números, a decadência dos times brasileiros, presentes em todas as decisões desde 2005, mas só até 2013.
Nos primórdios, ainda antes da existência da Libertadores, houve o Expresso da Vitória vascaíno, em 1948, e depois, em 1962 e 1963, havia o Santos de Pelé. A isso se resumiram as conquistas brasileiras em torneios sulamericanos falados em espanhol, não televisionados, até o hiato do Cruzeiro de Zé Carlos, Jairzinho, Palhinha e Joãozinho, em 1976, depois o Flamengo de Andrade, Júnior, Adílio e Zico, em 1981, e o Grêmio de De Léon, Mazaropi e Renato Gaúcho, em 1983. Seguiram-se então nove anos de seca, sem um brasileiro sequer na final, raramente na semifinal até o São Paulo de Telê Santana quebrar o jejum em 1992, repetir a dose no ano seguinte e, com o vice de 94, seguido do Grêmio de Felipão, engatar quatro decisões seguidas para o futebol brasileiro, que ficaria de fora de apenas três delas, em 1996, 2001 e 2004, até o início desta nova seca não de fato percebida, ainda, até porque pode ser cortada pela raiz por um milagre são-paulino.
Se não houver milagre em Medellín, se o São Paulo não conseguir a improvável reversão da derrota por 2 a 0 em pleno Morumbi, será o terceiro ano seguido sem brasileiro na decisão da Libertadores, o que não ocorre desde a seca encerrada há 24 anos por Raí, Cafu e cia. E tudo começou no fatídico ano do 7 a 1, quando a elite, esperançosa de uma vitória nas urnas, limpa, de seu impoluto candidato Aécio Neves, urrava palavrões dos camarotes vips contra a presidente Dilma Rousseff. No ano da Copa o Cruzeiro foi o representante brasileiro a ir mais longe na Libertadores e não passou das quartas-de-final, a primeira vez em 23 anos sem um brasileiro sequer na semifinal. Nesse ano o Atlético Paranaense, o Botafogo e o Flamengo foram eliminados na primeira fase, por times como o Léon do México, o Union Española do Chile e o The Strongest, da Bolívia. O Botafogo ficou atrás inclusive do também eliminado em seu grupo Independiente del Valle, esse mesmo que agora está a um empate da decisão.
Enquanto o Brasil ferve com o golpe e as consequências dele também para o futebol nacional, enquanto a CBF chafurda em meio às denúncias de corrupção, às investigações do FBI envolvendo a Fifa e direitos de transmissão de eventos transmitidos há décadas, a maioria com exclusividade, pela Rede Globo, enquanto os times daqui sofrem, também, com a crise insuflada para o golpe, pelo golpe, o Independiente del Valle aproveita o vácuo deixado há já três anos pelos clubes brasileiros e faz sua história particular na Libertadores, como já o fizeram o próprio Guarani, em 2015, e o Nacional do Paraguai em 2014, todos times sem títulos, sem nem um décimo do orçamento milionário dos grandes clubes brasileiros que no ano que vem, no sorteio dos grupos da Libertadores, voltarão a ser tratados, pela mídia nacional principalmente, como grandes, francos favoritos ao título.
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