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O Brexit, o fascismo e o medo

Foto: Neil Hall/ Reuters por Mauro Santayana, em seu blog Depois de intestina disputa que rachou a sociedade inglesa, cujo ápice foi o emblemático assassinato da deputada trabalhista Jo Cox por um fanático fascista que, ao atacá-la a tiros, gritou “a Grã Bretanha primeiro!”, slogan inspirado, assim como o de “o Brasil acima de tudo!”, […]

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Foto: Neil Hall/ Reuters

por Mauro Santayana, em seu blog

Depois de intestina disputa que rachou a sociedade inglesa, cujo ápice foi o emblemático assassinato da deputada trabalhista Jo Cox por um fanático fascista que, ao atacá-la a tiros, gritou “a Grã Bretanha primeiro!”, slogan inspirado, assim como o de “o Brasil acima de tudo!”, no “Deutschland Uber Alles!”, do hino nazista, o Reino Unido – cada vez mais desunido – votou, finalmente, por sua saída da União Europeia.

O resultado provocou terremotos internos e externos. As bolsas caíram em todo o mundo. O primeiro-ministro David Cameron já marcou data para se afastar do cargo.

E pode levar à desagregação do país, já que a Irlanda do Norte e a Escócia anunciaram que pretendem convocar plebiscitos próprios para decidir, a primeira,  se continua na União Européia, e a segunda, se vai unir-se à República da Irlanda.

Além disso, a libra já caiu mais de 10% com relação ao dólar e ao euro, e os alimentos e as viagens para o exterior ficarão mais caras, porque em alguns produtos, como leite e manteiga, e certos vegetais, por exemplo, mais de 50% do que é consumido na Inglaterra vem do continente, no outro lado do canal.

Comandada pela direita e pela extrema direita, e provocada principalmente pela ignorância característica dos dias de hoje – milhares de britânicos entraram no Google para perguntar, às vésperas do plebiscito, o que era “União Européia” – e pelo medo e a aversão aos imigrantes, a vitória do “Brexit” é mais um poderoso exemplo do comportamento burro, deletério e ilógico do fascismo.

Com a saída da UE, a Inglaterra tende a perder influência na Europa; a enfraquecer-se frente a eventuais adversários extracomunitários; a empobrecer econômicamente, diminuindo seu acesso a um dos maiores mercados do mundo; além de aumentar seu isolamento no âmbito geopolítico e sua histórica dependência dos Estados Unidos.

Uma situação que deveria servir de alerta, no Brasil,  para aqueles que querem acabar com a UNASUL e o Mercosul a qualquer preço e substituí-lo por “acordos” de livre comércio desiguais com países e grupos de países altamente protecionistas, como a própria União Europeia, que contam com capacidade de pressão muito maior que a nossa.

Decepcionada e frustrada com os resultados das urnas, a juventude inglesa reclamou que seu futuro foi cortado, lembrando que os jovens britânicos perderam, entre outras coisas, a chance de trabalhar em 27 diferentes países, e  engrossou um manifesto de 3 milhões de assinaturas que pede a realização de novo plebiscito – hipótese improvável, praticamente impossível de avançar neste momento, diante da indiferença e do egoísmo dos vitoriosos.

Nunca é demais lembrar que o fascismo, também em ascensão na Inglaterra de hoje, rejeita e despreza – apaixonadamente –  o  futuro.

Mesmo quando se disfarça de “novo” e disruptivo, como ocorreu com a Alemanha Nazista, ele está profundamente preso ao passado, como mostrou claramente Mussolini – e também Hitler com seus monumentos, estátuas, bandeiras e desfiles – ao tentar emular, canhestramente, a cultura   greco-romana e repetir – nesse caso, na forma  de tragédia, com as seguidas derrotas militares italianas – a glória perdida da Roma Imperial.

O fascismo – ao contrário do que muitos pensam – não é glorioso, mas medroso.

Fascistas temem, paradoxalmente, aqueles que consideram mais fracos, e por isso são “apolíticos”, homofóbicos, eugenistas, antifeministas, racistas, intolerantes, discriminatorios, xenófobos,  anti-culturais e contrários ao voto obrigatório e universal.

A suástica, girando sobre seu eixo,   reproduz o movimento concêntrico de alguma coisa que se encerra em si mesma, repelindo tudo que venha de fora, como uma tribo ignorante e primitiva, um molusco que fecha velozmente sua concha, ou um filhote de porco espinho ou de tatú que se enrola, tapando a cabeça, ao primeiro sinal de ruído ou de aproximação.

Da mesma forma que faziam, patologicamente, os soldados   nazistas, educados no temor da “contaminação” judaica, cigana ou bolchevique, que se comportavam como diligentes técnicos de dedetização tentando conter uma epidemia, fechando-se a qualquer razão ou sentimento, ao matar récem nascidos e crianças de três, quatro, cinco, seis anos de idade, escondidas debaixo da cama, ou trancadas na derradeira escuridão das câmaras de gás, da forma mais fria e repulsiva, como se estivessem exterminando, simplesmente, pulgas, percevejos e ratos, ou esmagando ovos de barata.

O Brexit – a saída da Inglaterra da União Européia – é mais um perigoso aviso, entre os muitos que estão se repetindo, nos últimos tempos – como sinais proféticos – do próximo retorno de um fascismo alucinado e obtuso.

Um retorno que se dá, e se torna possível, mais uma vez, pela fraqueza e indecisão da social democracia, a existência de uma pretensa massa de “defensores” do Estado de Direito e da liberdade, amôrfa, apática, inativa; e de uma esquerda que apenas espera, de braços cruzados, também encerrada, em muitos países do mundo, em seus próprios sites e grupos, disfuncional, estrategicamente confusa, passiva, inerme e dividida, sem reagir ou defender-se quando atacada, nem mesmo institucionalmente, como um letárgico  bando de carneiros pastando ao sol.

O medo fascista está de volta.

E não se limitará à Inglaterra.

Se não for contido o avanço de sua imbecilidade ilógica, por meio do recurso ao bom senso e à inteligência, outros países da UE, tão xenófobos quanto racistas, seguirão o reino de Sua Majestade em seu caminho de  intolerância, isolamento e fragilidade.

Porque o fascismo só avança com a exploração do medo e do egoísmo.

O medo de quem se assusta com o outro, repele o que é diferente e rejeita o futuro e a mudança.

O egoísmo daqueles que preferem erguer muros no lugar de derrubá-los; que se empenham em separar no lugar de unir; que escolheriam, se pudessem decidir, matar a fecundar, saudando a morte, como fazem em muitos países do Velho Continente e em outros lugares do mundo, jovens e antigos neonazistas de coração estéril, com a artrítica, tremente, mão espalmada levantada,  no ressentimento raivoso de uma velhice amarga, que cultiva e adora o deus do ódio no lugar de celebrar a vida, o amanhã, a alegria, o encontro e a diversidade.

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Comentários

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Alec

03/07/2016 - 16h31

Se a esquerda não tivesse feito tanta cagada na economia isso nunca teria acontecido.

    Antonio Castilhos

    03/07/2016 - 20h48

    é sempre reconfortante culpar a esquerda pelas burrices da direita. Sair da CE é uma burrice infinda, sem desculpa.

Pedro Augusto Pinho

01/07/2016 - 15h29

EUROPA, BREXIT E BRASIL

Passado o primeiro impacto do resultado do
plebiscito de 23 de junho, no Reino Unido (UK), que aprovou a saída daquele
país da União Europeia, precisamos analisar com cautela e consistência o que ele
representou e quais as possíveis consequências daquela manifestação popular.

O aspecto mais midiaticamente exposto foi da
xenofobia e do racismo que teria motivado a maioria absoluta dos eleitores
britânicos. Não há como negar a presença estrangeira no país que dominou grande
parte do mundo – “onde o sol nunca se punha” – por quase um século e, por
cálculo econômico, concedeu a asiáticos, africanos, islâmicos o passaporte
britânico. E, observe também, como a imprensa em geral vem criminalizando,
desde o 11 de setembro de 2001, os muçulmanos, ora como terroristas, ora como
aproveitadores dos benefícios sociais existentes nos países europeus, ora, até
com a má e parcial leitura de sua religiosidade, como “intrinsecamente maus”.

Ignorar o reflexo desta campanha na mente da
numerosa e intelectualmente precária classe média de qualquer país é torpe,
como o é a quase absoluta comunicação de massa do século XXI. O aspecto
xenófobo e a insularidade ajudaram à exclusão do UK.

Mas o aspecto mais amplo está na precariedade
da vida dos assalariados e dos despossuídos, quer britânicos quer europeus e em
quase todo mundo. Esta precariedade, no meio de um mundo sempre mais rico, é
fruto de três décadas do domínio absoluto das políticas nacionais pelo
capitalismo financeiro internacional, que denomino “banca”.

Cabem algumas reflexões sobre este governo da
banca. Há um dado estatístico
significativo e com relação à Europa: o número de ricos e pobres. Logo após a
II Guerra Mundial, para um rico havia 12 pobres; em 1980, quando a maré
neoliberal inicia trajeto para o domínio mundial, já estava 1 para 82; agora se
calcula 1 para 530. Este é um dois dois objetivos fundamentais da banca: a
concentração de renda. O outro é a transferência dos ganhos de todos os
segmentos da economia – indústria, comércio, transporte, comunicação de massa
etc – para o sistema financeiro.

Estes dois objetivos resultam no desemprego,
no subemprego, na redução dos gastos sociais e da previdência e na pauperização
que se observa a olho nu em todo mundo, inclusive no “mundo desenvolvido”.
Ignorar que esta condição existencial não tenha influído no plebiscito é fazer
pouco caso da inteligência alheia. Mas esta percepção se confunde com os
discursos oficiais e com a intensa e constante propaganda dos veículos de
comunicação. Veja, por exemplo, a “austeridade”, o “controle dos gastos”, o
“rigor fiscal”, palavras e expressões que induzem à compreensão de ações
sérias, responsáveis e consequentes mas que, na verdade e efetivamente, podem
ser traduzidas por: vamos transferir a receita dos salários, das aposentadorias
e pensões, dos lucros empresariais, do valor dos alugueis para os juros, ou
seja, todos os ganhos devem ser maximamente concentrados no pagamento dos
juros. E aí se acrescenta a desinformação que dá a falsa impressão que são as
despesas com as pessoas que precarizam a situação econômica; No orçamento brasileiro
de 2014, o pagamento dos juros e amortização da dívida representou 45,11% das
despesas e o segundo maior item destas foi a previdência social com menos da
metade, 21,76% (Auditoria Cidadã).

E, neste aspecto, o Reino Unido e a Europa
Continental em nada diferem do Brasil. E na mal informada e acrítica classe
média e mesmo em parcelas das classes mais favorecidas fica aquele vago e
impreciso sentimento que “é preciso mudar tudo”, “a corrupção é o grande mal”.
Realmente, mas quem é mais corrupta do que a banca que acolhe e procura todo
dinheiro dos tráficos de drogas, de pessoas, dos ilícitos diversos, dos caixa
2, com os braços abertos de seus “paraísos fiscais”, onde o coloca a salvo da
justiça e dos tributos.

Voltemos ao Brexit. É apontado como vitória
da direita. A direita soube, realmente, como em outros momentos da história, aproveitar
a precariedade da economia para incentivar o sentimento quase natural do
nacionalismo dos povos. E a esquerda, perdida desde o desmanche da União
Soviética e da conversão da China à economia de mercado (!), caiu nas garras da
banca pelo discurso pacifista e solidário da União Europeia. Isto leva-a a
apoiar o sistema financeiro internacional com o Partido Trabalhista britânico,
os Partidos Socialistas francês, espanhol e até o grego, vítima de um artifício
contábil para sua escravização à banca, ou seja, à dominação política.

Mas penso que a banca não foi derrotada, como
alguns analistas estão compreendendo. As “crises”, que somam nove desde 1990,
foram os instrumentos para consecução dos objetivos da banca. De 1990 até 2000,
tivemos quase uma por ano, distribuídas pelos continentes: Europa, Ásia e
América Latina. Com o mecanismo das crises, a banca cresceu, concentrou renda e
dominou quase todos os governos nacionais, pois não foram os imprevistos e irresponsabilidades
das economias e governos que as provocaram.

A “crise” de 2008, a mais forte e ampla até
agora, teve seu epicentro na maior economia mundial, os Estados Unidos da
América (EUA), na primeira moeda das trocas internacionais (o dólar) e com o
intervalo de sete anos em relação à anterior (2001, na Argentina). Como este
processo é uma bicicleta, precisa continuar permanentemente para se equilibrar,
meu entendimento é que estamos às vésperas de mais uma “crise”, já passados
oito anos. E onde melhor do que na ainda rica Europa, do euro, a segunda moeda
internacional. Não estaria o Brexit acendendo o pavio desta “crise”?

Diversas outras questões são colocadas nesta
separação: o projeto de unificação dos mercados de capitais europeu não
submeteria o Reino Unido a eventual mudança de rumo da Alemanha? Ou uma fuga à
pressão da banca por indesejável regulação pelo Congresso Europeu dominado por eventual
direita nacionalista? E o interesse da Federação Russa, como apresentado, com
objetiva competência, em matéria do site Dinâmica Global (https://dinamicaglobal.wordpress.com) ?

Vê-se, portanto, que o Brexit é muito mais
complexo do que a manifestação da extrema direita nazista.

E o Brasil, frágil politica e economicamente,
com um governo não escolhido pelo povo e uma imprensa oligopolista e familiar, tudo
deturpando e muito desinformando, sofrerá mais uma vez?

Pedro Augusto Pinho, avô, administrador
aposentado


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