Temos a honra de apresentar aos leitores a mais nova colunista do Cafezinho, a advogada feminista Cristina Biscaia, pré-candidata a vereadora no Rio de Janeiro pelo Psol.
Este é o primeiro texto dela no blog, sobre mobilidade urbana, um dos problemas mais terríveis das grandes cidades brasileiras.
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Rio de Janeiro: purgatório do trânsito e do caos
Por Cristina Biscaia, a mais nova colunista do Cafezinho.
Lembro-me como se fosse hoje, quando eu cursava a sétima série do que chamávamos na época de ginásio, quando meu professor de geografia Toledo disse que um país desenvolvido era um país que investida em transporte e mais especificamente em ferrovias. Vejo como num filme sua imagem desenhando o mapa dos Estados Unidos, como exemplo de uma nação que teria cruzado o país de norte a sul e de leste a oeste com ferrovias, nos riscos que ele fez no mapa todo na horizontal e na vertical.
As Olimpíadas do Rio de Janeiro tiveram como apelo o que traria de legado para cidade em termos de infraestrutura, transporte e desenvolvimento. O evento se aproxima e o canteiro de obras que se tornou nossa cidade, está longe de ter fim e tampouco teremos a garantia que o legado verdadeiramente irá existir após o fim dos Jogos Olímpicos.
A escolha da cidade para sediar o evento ocorreu em outubro de 2009 e já se passaram quase sete anos desde então e parece irreal que os planejamentos estruturais que fizeram parte do portfólio da candidatura da nossa cidade, não estejam prontos ainda e mesmo que venham a ficar, não há garantia que as obras tenham sido concluídas com segurança e qualidade.
A cidade que se torna sede de uma olimpíada precisa pensar em mobilidade, que significa: transporte de qualidade e em curto espaço de tempo. Não consigo acreditar que a solução para a melhoria da mobilidade carioca seja o BRT, ainda que seja uma linha de ônibus expressa e que circula na zona oeste, mesmo assim, acho uma solução pouco eficaz.
Por outro lado, a extensão da linha 4 do metrô até a Barra da Tijuca, deverá contribuir para uma diminuição do trânsito, mas não sabemos ao certo quando efetivamente estará disponível para o uso do morador carioca. Vale lembrar que a escolha do trajeto foi amplamente discutida e optaram por uma obra que não era a melhor opção para a população.
Temos ainda a criação do veículo leve sobre trilhos – VLT, que poderia também se chamar de veículo lento sobre trilhos e que na primeira semana de funcionamento já apresentou uma pane elétrica e parou de funcionar. Tal alternativa de trânsito ligará o Aeroporto Santos Dummont até a Rodoviária Novo Rio, mas andando a 15km/h, resta saber quanto tempo levará a viagem de um ponto ao outro.
Enquanto essas obras do BRT, VLT e da linha 4 do metrô não ficam prontas, o carioca tem vivenciado o purgatório e o caos no transito da nossa cidade. Se locomover no Rio de Janeiro virou uma tarefa de paciência e de exercício de equilíbrio, porque qualquer um está sujeito a perder a sanidade a qualquer momento, haja vista que as ruas fecham e mudam de mão de um dia para o outro e sem nenhuma comunicação eficaz com a população.
Recentemente tive a oportunidade de assistir palestras do Professor David Harley da New York University e compreendi que os grandes centros, hoje, se desenvolvem para atender ao capital, às grandes empreiteiras e às máfias dos transportes.
Há alternativas de transporte que poderiam ser criadas e que, não sabemos por qual razão, são engavetadas. A primeira dela seria a criação de uma barca que ligasse o Aeroporto Internacional Antonio Carlos Jobim ao Santos Dummont. Na mesma linha de transporte fluviais, existiu um projeto que criaria diversas estações na Lagoa Rodrigo de Freitas (ilustração acima) para permitir a ligação dos bairros em seu entorno de forma rápida e sem impactar no trânsito.
Meu sonho era poder andar a cidade toda de bicicleta e estava ansiosa para poder estrear a parte da ciclovia que ligaria a Barra da Tijuca até a zona sul, passando pela ciclovia Tim Maia que já estava em funcionamento. Quando houve a queda de parte de sua estrutura pensei que terei que adiar meu sonho, até que essa via seja realmente segura para circularmos.
Quando a Prefeitura do Rio de Janeiro criou a parceria com o banco Itaú para instalar as estações de bicicletas em diversos pontos da cidade, pensei que estaríamos começando a nos tornar uma cidade de primeiro mundo, mas quantos quilômetros de ciclovia foram criados desde que essa parceria começou?
Além disso, a cidade não cria parceria entre os ônibus e o metrô para que as bicicletas possam ser transportadas, não temos sinalização específica e tampouco há uma educação no trânsito que estimule o respeito aos ciclistas. Eu diria hoje para meu professor Toledo, que além de ferrovias, um país desenvolvido é um país de ciclovias, desde que sejam seguras.
O atraso e o caos do transporte do Rio são o retrato do nosso país, que considera um avanço social que as pessoas de baixa renda possam viajar de avião. Porém, ao mesmo tempo, perdem boa parte da nossa produção nas estradas precárias e mal conservadas que cortam nosso território. Mas há quem diga que asfalto é obra que não aparece, que não dá visibilidade política para seus gestores.
Um país com a extensão territorial que o Brasil tem, precisa repensar o transporte como o sustentáculo do seu desenvolvimento ligando certos centros urbanos com ferrovias como Rio-São Paulo, Curitiba-Florianópolis, Aracajú-Maceió, Recife-João Pessoa e todas outras que fossem viáveis geograficamente.
Uma metrópole como o Rio deve centrar todos os seus esforços para aumentar o metrô para a zona norte e baixada, além de criar uma linha que chegue até a Ilha do Governador para facilitar o acesso dos turistas à zona sul. Mas esgotamos as chances de sediarmos novos eventos internacionais por aqui e com o fim do financiamento empresarial de campanha não sabemos quais interesses irão prevalecer daqui por diante.
Espero que o bem estar da população e a melhoria do trânsito, impactando diretamente na qualidade de vida das pessoas seja a prioridade de qualquer governo, mas nem todos tiveram a sorte de serem alunas do Mestre Toledo e o nosso verdadeiro desenvolvimento pode estar longe de chegar.
Cristina Biscaia é advogada, Mestre em Propriedade Intelectual pela Universidade de Augsburg (Alemanha), integra a #partidA feminista.