Temer abraçou os derrotados para obter o poder

Foto: Folha de Vitória

Por Denise Assis

Quando já não tinham mais argumentos para explicar o inexplicável, para defender o indefensável, que é como está soando lá fora até mesmo para os que não nos conhecem – a imprensa internacional, os governos, as lideranças, os acadêmicos e os escritores estrangeiros estão entendendo que houve um golpe — os golpistas vieram com a última. Ou seria a penúltima? Porque sempre tem mais uma.

Agora insistem em bater na tecla de que Temer, o usurpador, teve os mesmos votos que Dilma, pois foi eleito em sua chapa.

Vamos aos fatos.

O senhor Temer foi uma opção de composição de governo que convinha naquele momento a todos. Ao PT, que necessitava de um nome que consolidasse a aliança com o PMDB, o maior partido da base aliada. E ao PMDB, que nunca, jamais, consente em ficar longe de um governo que esteja no comando do país. De preferência, como coadjuvante, para retirar-se sem “dolos”, quando melhor lhe aprouver, sem o ônus da responsabilidade de ser governo.

Para que compusesse a chapa junto com Dilma, foi exibido ao candidato à vaga de vice – no caso, Temer –, todo um programa de governo, para que, ciente do que ia defender, ele o abraçasse. E, em caso de vitória, como aconteceu, seguisse com ele até o final do governo. Caso contrário, isto caracterizaria: traição do programa, das ideias e da confiança do presidente. No caso, uma mulher.

Depois de uma série de tentativas de ser o titular de algum cargo dos vários que concorreu sem sucesso, Temer aceitou ser vice.

O referido senhor, agora sabe-se pelo Wikileaks, antes de trair à presidente, traiu a pátria. Desde 2008 mantém relações perniciosas com a CIA. Trocava informações sobre a nossa soberania com quem deveria manter precavida distância. A despeito deste comportamento, no mínimo pouco cívico, e de seu posicionamento político de ultradireita, Temer abraçou o programa de um governo de esquerda e saiu em campanha com a presidente Dilma Roussef, país afora. Sabedor, por princípio, que a condição para ser vice é esta: ser vice. E, portanto, com poderes limitados. Sua função precípua seria substituí-la em período de vacância do cargo por motivo de viagens, ou havendo óbito ou falta grave.

Como Dilma venceu um câncer antes de tornar-se presidente e assumiu o país vendendo saúde e firmeza, Temer não vislumbrava a oportunidade de assumir sua cadeira. Frustrou-se com a condição e traiu, por fim, à mulher a quem deveria fidelidade. (Não àquela bela, que tem no lar, sob recato), mas à presidenta da República.

Talvez corroído por aquele sentimento de frustração que conheceu ao longo das várias tentativas de chegar a algum cargo na vida, que não fosse o de presidente da Câmara, primeiro expôs sua rejeição numa carta melosa e lamurienta. Depois, rasgou o programa que abraçou e bandeou-se para o outro lado.

Hoje, usa o argumento de que foi eleito com os mesmos 54 milhões de votos que levou Dilma ao poder.

No momento em que aceitou participar do seminário golpista em Lisboa, no momento em que aceitou confabular com Alkimin, Serra, Gilmar, Cunha e demais opositores da presidente, e que insistentemente preferiu a companhia dos que tentavam derrubar Dilma, deu as costas aos 54 milhões de votos da chapa vencedora. Rasgou o projeto de governo que deveria abraçar até 2018 e bandeou-se para o lado dos derrotados, a fim de obter uma vitória à base de golpe e traição.

Neste momento, abriu mãos dos votos que recebeu, pois não mais defenderia o modelo abraçado na eleição. Temer optou por pular o muro da decência, da dignidade e da honradez, para botar a mão numa faixa que não é sua.

 

Rogerio Dultra: Professor do Departamento de Direito Público da Universidade Federal Fluminense (UFF), do Programa de Pós-Graduação stricto sensu em Justiça Administrativa (PPGJA-UFF), pesquisador Vinculado ao INCT/INEAC da UFF e Avaliador ad hoc da CAPES na Área do Direito.
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