Fotomontagem: Jornal do Comércio
por Nathália Sanglard
Na última quarta-feira, o Senado, em que 80% são homens brancos, 58% têm ocorrências na justiça e 60% pertencem a linhagens políticas, votou o afastamento de Dilma.
No dia seguinte, cercado de homens brancos, Michel Temer – que, como todos sabem, praticou as mesmas manobras fiscais, as quais, teoricamente, justificariam o impeachment da presidenta – anunciou seu ministério ilegítimo.
Agraciou, mais do que simbolicamente, Bruno Araújo, o 342º parlamentar a dizer sim ao impeachment na Câmara, citado na lista de pagamentos feitos pela Odebrecht, com o ministério das Cidades, e Blairo Maggi, dono de um dos principais grupos de exportação de soja do país, o 41º senador que selou o golpe, com o ministério da Agricultura.
Dos 13 parlamentares que assumiram pastas, apenas dois não têm pendências judiciais, segundo a Transparência Brasil. Dissolvido, o ministério da Cultura virou acessório do da Educação, comandado pelo DEM, partido que se opôs a todas as medidas de universalização do ensino nos últimos anos.
Os ministérios da Igualdade Racial, Direitos Humanos e Mulheres foram extintos, maquiados pelo nome Cidadania, na pasta de Justiça, sob a chefia de Alexandre de Moraes, responsável, em São Paulo, por uma política de extermínio nas periferias e brutal repressão a manifestações, notadamente as de professores e estudantes. Pela primeira vez desde o ditador Geisel, não há mulheres no ministério.
A primeira mulher eleita para a presidência foi afastada para dar lugar a um governo patriarcal, oligárquico, com um projeto neoliberal nefasto, que tem como fundamento aprofundar os vícios das gestões do PT e paralisar ou solapar suas virtudes.
Se o desvio dos governos de Lula e Dilma foi conciliar com os setores mais obscurantistas, a promessa de Temer é governar com e para eles.
As elites que nunca digeriram um ex-metalúrgico no executivo federal, ridicularizando-o como analfabeto que desconhece o plural, que nunca sequer aceitaram falar em presidenta – assim, no feminino -, fingindo ignorar que a língua é terreno de disputa, agora parecem vibrar contentes, com a oratória do vice, o constitucionalista e “poeta”, e com a recondução da mulher, na figura da vice-primeira-dama, ao espaço que desejam: não de protagonismo, mas de adorno embelezador; não de guerrilheira, mas de bela, recatada e do lar; não de articuladora de políticas públicas, mas de promotora de caridade.