Foto: Gustavo Lima/ Câmara dos Deputados
por Theófilo Rodrigues
No imenso rol de péssimas ideias apresentadas como solução para o período imediatamente posterior ao impeachment a convocação de uma nova Assembleia Constituinte figura seguramente em primeiro lugar.
A ideia vem aparecendo cada vez com maior frequência nos debates de economistas ligados ao campo defensor do impeachment. O melhor exemplo talvez seja o de Samuel Pessoa, assessor econômico de Aécio Neves e um dos formuladores do programa de governo tucano em 2014. Pessoa vem defendendo há algum tempo a tese de que a origem da crise financeira estaria na Constituição de 1988. De acordo com o economista a Constituição garantiu direitos sociais demais que o Estado brasileiro não tem condições de manter. Em suas palavras, “o Estado de bem-estar e o nacional-desenvolvimentismo não cabem no Orçamento”.
Contudo, a tese de Pessoa não é aceita apenas pelo programa econômico de Aécio Neves. Em recente participação no programa GloboNews Painel comandado por William Waack, Samuel Pessoa e os demais participantes chegaram ao consenso: é preciso rever imediatamente a Constituição de 88.
A crítica à Constituição não é palavra jogada ao vento apenas em um programa de televisão. Em editorial do jornal O Globo de 14 de setembro de 2015 lemos o seguinte:
“Mas é preciso reconhecer o papel exercido pela Constituição de 1988 na quebra do país. O aspecto negativo da Carta deriva de uma visão ideológica de mundo por meio da qual ela foi redigida, com o Estado sendo colocado sobre a sociedade, no papel de uma espécie de tutor que concentraria o máximo das rendas da sociedade, extraídas por elevados impostos, com a finalidade de distribuí-las para mitigar a pobreza” (O Globo).
Esse é também o alicerce do já amplamente discutido programa de governo de Michel Temer, a “Ponte para o futuro”. Lá encontramos a flexibilização da CLT com o predomínio do negociado sobre o legislado, o fim das vinculações constitucionais com gastos em saúde e educação etc.
Que a revisão da Constituição de 88 faz parte do programa dos atores políticos que hoje defendem o impeachment e que assumirão o governo a partir de meados de maio, não há muitas dúvidas.
O que intriga é observar parcelas honestas da esquerda do espectro político defenderem essa mesma estratégia. De forma ingênua ignoram que a pressão popular não foi capaz de reverter a recente derrota na Câmara dos Deputados onde o governo não conseguiu obter nem 140 votos. Essa parcela da esquerda não percebe que, caso instalada, a Assembleia Constituinte enxugará os direitos sociais presentes na atual Carta Magna, além de aprofundar mecanismos pouco democráticos no sistema eleitoral como o voto majoritário, a cláusula de barreira e a volta do financiamento privado.
Em outras palavras, isso significa que um campo político que possui apenas 25% do Congresso Nacional estaria propondo a instalação de uma Assembleia Constituinte. A desconsideração da realidade concreta soa no mínimo absurdo. Ignorar que a correlação de forças no momento é amplamente desfavorável não parece um bom conselho. A não ser que estejam distribuindo títulos eleitorais para os médicos cubanos e não sabemos…
Theófilo Rodrigues é cientista político