Globo aciona pistoleiros para enganar leitores sobre imprensa internacional

04/03/2016 - PORTO ALEGRE, RS - Ato em defesa da democracia, do LULA e contra o golpe, na Esquina Democrática. Foto: Guilherme Santos/Sul21

Como era de se esperar, a Globo, porta-voz oficial do golpe, iniciou uma operação de propaganda para evitar que a opinião pública brasileira seja influenciada pela imprensa internacional, que, em sua grande maioria, tem denunciado o golpe midiático no país.

O objetivo é óbvio: garantir que o golpe transite sem sobressaltos no Senado.

Para tal, acionou um de seus mais astutos pistoleiros, Pedro Doria, que publica artigo hoje no Globo que é uma obra-prima de mentira e manipulação:

O texto é um contra-ataque direto e confesso (os blogs são citados) aos “blogs”, em especial a este Cafezinho, visto que alguns dos editoriais da imprensa internacional mencionados foram publicados apenas por aqui.

Como seria de se esperar vindo da Globo, é um modelo de desonestidade, sobretudo porque, diferente do Cafezinho, não dá link nem traduz nenhum dos editoriais, artigos ou reportagens mencionados. O leitor não pode conferir nada por si mesmo. Tem de acreditar na palavra do articulista da Globo.

Trechos:

 

Um dos textos mais citados é “A razão real pela qual os inimigos de Dilma Rousseff querem seu impeachment”, publicado pelo jornal britânico “The Guardian”. É um artigo de opinião avulso, assinado por David Miranda. Não é a opinião do jornal. É a opinião de um cidadão brasileiro.

Sim, é a opinião de um cidadão brasileiro…

Por aí se vê o vira-latismo da Globo, menosprezando o artigo no The Guardian por ser a opinião de um “cidadão brasileiro”.

Ora, o artigo foi publicado com destaque, em português e em inglês. E o jornal não publicou nenhuma opinião de cunho golpista, nem jamais publicou, em outra ocasião, nenhum artigo em português. Conclui-se, obviamente, que o Guardian abrigou com muita simpatia a opinião de um… cidadão brasileiro.

Milhões de brasileiros tem saído às ruas, no Brasil e no mundo inteiro, denunciando o golpe. Comunidades de juristas, intelectuais, escritores, artistas, trabalhadores, sindicalistas, estudantes, tem lançado manifestos e organizados debates para denunciar o golpe. Mas a opinião de cidadãos brasileiros, pelo jeito, não tem importância para a Globo…

Chico Buarque, Gregorio Duvivier, Wanderley Guilherme dos Santos, Wagner Moura, Fernando Morais, oito mil juristas, são todos “petralhas” e sua opinião não tem significado nenhum, não é Dória?

Neste link, você achará centenas de organizações, quase todas importantes e qualificadas, que se manifestaram expressamente contra o golpe.

O secretário geral da OEA se manifestou contra o golpe. A UNASUL se manifestou contra o golpe. Há grupos de juízes e promotores públicos que se manifestaram contra o golpe.

Para a Globo, porém, nenhuma dessas manifestações existe, porque não existe golpe, certo?

Aliás, ainda no que toca ao Guardian, Doria esqueceu de mencionar outras coisas:

1) que o dono do Globo, João Roberto Marinho, foi humilhado mundialmente pelos comentaristas do Guardian.

2) que David Miranda escreveu uma tréplica genial para o dono da Globo no Intercept, selando em sua testa, com fogo, a marca de golpista.

Em seguida, Doria faz um malabarismo para explicar o pedido de desculpas feito pelo Le Monde, por ter acreditado na mídia brasileira. Maquiavelicamente, Doria dá um jeito de publicar em seu artigo apenas o título do artigo pelo qual justamente o Le Monde pede desculpas.

Outro trecho:

As mesmas críticas generalizadas às instituições políticas brasileiras estão no editorial mais recente, publicado pelo americano “The Miami Herald”. “Os brasileiros não devem se distrair. O crime que trouxe o país abaixo é roubo por parte de quem ocupa cargos públicos. Que sigam atrás dos bandidos e deixem para os eleitores o destino de políticos incompetentes.” Para os editorialistas, a incompetente é Dilma, e bandidos, os políticos envolvidos em corrupção.

O Globo é uma usina de mentiras e manipulação. O editorial do Miami Herald, publicado no Cafezinho, é totalmente distorcido. Ora, o Herald diz que Dilma tem “as mãos limpas de corrupção”. Esse é o trecho mais importante, omitido por Doria. Repito aqui trecho do editorial do jornal de Miami:

“A única maneira do Brasil sair mais forte é o de continuar a contar com as instituições democráticas para julgar o crime e remover os legisladores corruptos do poder. As violações de Dilma, se verdadeiras, são graves, mas impeachment é arma grande demais para se usar para punir por meras questões contábeis.

Os brasileiros não devem ser enganados. O crime que deprimiu o país é o desvio de dinheiro público. Vão atrás dos bandidos, e deixem que os eleitores decidam nas urnas o destino dos políticos incompetentes.”

Ou seja, Pedro Doria mentiu. O Miami Herald afirma, com todas as letras, que as violações de Dilma (se verdadeiras, pondera o jornal), não são passíveis de um impeachment, que “os brasileiros não devem ser enganados”, que as autoridades deveriam ir atrás dos bandidos (ou seja, Eduardo Cunha e os sonegadores), e que os eleitores deveriam decidir o destino dos políticos incompetentes nas urnas.

Outro trecho do artigo de Dória.

Há também uma série de manifestações avulsas de opinião. Dentre as mais populares dos blogueiros governistas está a entrevista concedida pelo jornalista americano Glenn Greenwald a Christiane Amanpour, da CNN. Greenwald, que vive no Brasil e é casado com com o autor do artigo do “Guardian”, é também um premiado e respeitado jornalista que se especializou na difícil relação entre direitos civis e tecnologias digitais. Nas redes sociais, é um crítico contumaz da solução do impeachment. À CNN, disse que “plutocratas veem agora uma chance de se livrar do PT por meios antidemocráticos.” Cita, como contexto, o extenso envolvimento de inúmeros deputados, a começar pelo presidente da Câmara, com escândalos de corrupção. Mas, mesmo quando questionado diretamente por Amanpour, evitou o termo “golpe”.

Que cara de pau, hein, Dória!

A esta altura, com a presidenta já praticamente afastada pelo golpe, o qualificativo preconceituoso de “governista”, que o Globo sempre tentou pespegar nos blogs do campo progressista, já não cola mais. Governista volta a ser O Globo, como foi durante os 21 anos de ditadura, e durante todo o ciclo neoliberal.

Portanto, você, Pedro Doria, é que é um colunista “governista”. O Cafezinho hoje está mais para blog de oposição.

Olhe as manchetes acima de sua coluna, Dória, todas blindando e defendendo Michel Temer. Quem é governista?

Na CNN, Glenn e Amanpour não usam o termo golpe, mas precisa? Se eu descrevo um assalto na rua, preciso usar o termo “assalto”? Não basta descrever que alguém puxou a bolsa de uma senhora e saiu correndo?

Ambos, Glenn e Amanpour, deixam bem claro que o processo de impeachment é surreal, porque uma presidenta honesta, sem crimes, foi derrubada por um punhado de bandidos, com ajuda dos meios de comunicação (leia-se Globo).

Doria continua sua xaropada golpista:

A análise mais favorável à presidente foi assinada pelo correspondente da principal revista de língua alemã, a “Der Spiegel”, e publicada em seu site. Jens Glüsing é o único a criticar a Operação Lava-Jato, de acordo com uma versão traduzida, afirmando que “o sucesso subiu à cabeça (do juiz Sérgio) Moro”. Ele atribuiu “aos partidários de Lula” a advertência de que se prepara “um golpe frio contra a democracia brasileira”.

Mentira! O título da reportagem fala em “golpe frio” (Crise de Estado no Brasil: o golpe frio)! O título, veja bem! É evidente que é também a opinião da revista!

Jens Glüsing critica a Lava Jato porque é um dos primeiros a começar a entender como a operação se tornou uma das ferramentas do golpe.

A matéria termina com essa pérola:

(…) E nenhum compra a ideia de que há um golpe em curso.

É muita cara de pau, sobretudo porque o Globo jamais traduziu ou expôs esses artigos para seus leitores. A primeira referência que traz sobre eles, agora, é apenas para distorcê-los ou inverter inteiramente o sentido de cada um.

A imprensa internacional em peso tem denunciado o golpe no Brasil. Pode não usar a palavra golpe, mas fala em ilegalidades no processo, denuncia a mídia brasileira, enfatiza a inocência da presidenta Dilma e acusa os deputados de serem delinquentes em busca do poder.

Deus tenha piedade de nós! Até quando suportaremos uma imprensa tão diabolicamente golpista!

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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