Ato da Cultura pela Democracia entra para a história na capital carioca
Por Ninja
O ato cultural em defesa da democracia reconquistada, que ocorreu nesta segunda-feira (11) na capital carioca contou com a participação de dezenas de artistas e intelectuais. De Chico Buarque, Beth Carvalhon e José Celso a Otto, Tico Santa Cruz e Leonardo Boff; além de representantes de movimentos sociais populares, originários, culturais e estudantis. De Stédile e Boulos a Sônia Guajajara e Carina Vitral; e também com o ex presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
O cantor Flávio Renegado disse que há pouco tempo pôde entender o que é democracia e justificou: “Na comunidade não tem democracia, tem abuso da polícia”. Renegado completou sua fala dissertando sobre o que leva a elite brasileira a apoiar o golpe: “negro na universidade incomoda, mulher no poder incomoda”. Tico Santa Cruz, também músico, falou de democratização da mídia e que não existe democracia quando cinco famílias controlam todas as informações que chegam aos brasileiros.
O ato foi em favor da democracia, mas com ácidas críticas ao atual governo. A liderança indígena Sônia Guajajara mandou o recado dizendo o que é democracia para os povos indígenas, e que é preciso, e muito, avançar, mas que esse avanço deve ser feito pelo atual governo, e não por aqueles que pedem o impeachment da presidente Dilma Rousseff – que são, justamente, os que querem acabar com os povos originários no país. “Nós sabemos o que é opressão, nós sabemos o que é violência, nós sabemos que só com luta é que vamos conseguir aprimorar a verdadeira democracia. E o que é uma verdadeira democracia para nós? É a inclusão social, é a inclusão nos espaços de poder, é ter indígena lá, é ter mulher lá, é ter negro lá, é ter os mais pobres lá, isso que é a democracia. Estamos aqui para exigir que ESSE governo olhe para os povos indígenas. Para que olhem para nossas terras. Demarcação Já!”.
Uma sociedade construída pela religião ensina seu povo o que é pecado ou não afirmou Doralyce que continuou seu discurso ao falar dos indígenas, da periferia, da reforma agrário e dos senhores de engenho: “O verde e o amarelo aparecem quando é jogo do Brasil, enquanto na favela neguim acorda com fuzil na cara. A gente come carne todo dia, o índio mora numa palafita e eu te pergunto que sentido faz não ter reforma agrária no Brasil. Isso é herança dos senhores de engenho, barões do café e da cana de açúcar, das Odebrecht e Queiróz Galvão do Brasil que fomentam e alimentam impondo a condição servil. Pela reforma política já!”
Democracia como flor, com amor, foi assim que o intelectual Leonardo Boff deu o tom: “A democracia tem a natureza da flor, ela é frágil, mas ela tem a força, a força de sua beleza, a força de seu perfume. Essa democracia está sendo ameaçada agora, especialmente por aqueles que estão atualizando a casa grande, que são esses que sempre dominaram o nosso país”.
O Ministro Juca Ferreira com seu espaço colocado à fala ressaltou que a cada dia mais pessoas se manifestam contra o golpe que se tenta articular no país, que a cada dia os que são manipulados pelos meios de comunicação de massa são menores em nosso país. “Eles tentam dar um caráter legal ao golpe que estão preparando, mas ao mesmo tempo estimulam o ódio no povo brasileiro, a incivilidade política, a regressão e namoram abertamente com o fascismo. É preciso não só combater o golpe, mas restabelecer uma maturidade política que o povo brasileiro já conquistou. De saber divergir, de saber respeitar o outro e avançar na democracia”, finalizou o ministro.
O ator Wagner Moura, que não pôde estar presente no ato e que é um dos que assinantes do manifesto da cultura pela democracia que, junto com Leonardo Boff, Chico Buarque, Fernando Morais e Eric Nepomuceno, convocavam a classe artística e intelectual do país para o perspectivo ato mandou um vídeo que compunha seu discurso:
Eu quero declarar meus votos, eu nunca votei na Dilma, votei na Marina. Teria votado na Dilma no segundo turno contra o Aécio, mas não estava no Brasil. Mas 54 milhões de outros brasileiros o fizeram. Eu tenho ouvido falar muito sobre a nossa frágil democracia e é impossível não concordar com isso porque se a nossa democracia não o fosse, não estaria correndo o perigo que está correndo agora. É frágil, é jovem, não é plena, não é plena para quem mora na favela, para os indígenas, para os negros, mulheres, homossexuais, mas ela avançou muito e o governo Lula e Dilma tem muito a ver com isso. Então temos que avançar mais e não retroceder!
O que está rolando em Brasília agora é uma evidente tentativa de retrocesso das conquistas dessa jovem e frágil democracia. Uma tentativa de golpe, uma volta às formas de resolver suas diferenças políticas.
Em 2012 houve um golpe de estado no Paraguai, então não é uma paranoia da esquerda como tentam falar os legalistas que atacam principalmente os artistas. Nós, artistas, sempre estivemos na vanguarda da democracia, mesmo por uma questão de sobrevivência, já que não existe arte sem democracia. Tentam retirar nossa liberdade de uma forma canhestra, calhorda, mentirosa.
Gerações mais novas, que eu julgava menos politizadas, me provaram que eu estou errado, foram às ruas, lutaram, e isso é ótimo! Um artista politizado é um pleonasmo, porque é da natureza da arte essa função política. Temos muita força com o que dizemos, o que pensamos.
Então, é natural que tenha muita gente querendo calar a nossa boca, mas não vão conseguir. Com muita serenidade vamos mostrar para esses caras que os artistas brasileiros defendem a democracia. Não vai ter golpe!
O ator, humorista, roteirista e escritor Gregório Duvivier falou de arma, amor e revolução, e com humor deu o tom de sua fala:
“A grande arma do lado de lá é o ódio contra a gente, mas a gente não pode cair na mesma onda e criminalizar a onda de lá, dizer que tem 2 milhões de fascistas… São 2 milhões de desinformados. Nossa arma tem que ser amor, toda revolução é um ato de amor, caso não seja amor, é golpe.
Não cabe a mim discutir o que é certo. Um impeachment dado pelo Eduardo Cunha é a mesma coisa que um pênalti marcado pelo Eurico Miranda. Esse Congresso é um Congresso de réus. Não dá para deixar nas mãos desse congresso o futuro desse país.
O que une a todos nós é a insatisfação, com tudo que não está sendo feito no país hoje. Então, ao invés de dizer fica Dilma, vamos falar “fica e melhora” e governa para a esquerda. Porque a Dilma foi eleita pela esquerda, porque tinha um projeto de esquerda, então vamos pedir que ela governe para ela. Que governe em nome do projeto que ela foi eleita.”
Os presentes vibraram a cada fala, e em meio a diversos gritos e cantos um fez com que o cantor e compositor Chico Buarque de Hollanda se manifestasse. Símbolo da lua pela democracia, ele deixou a ditadura brasileira registrada em suas composições. Crítico, retratava em suas letras as dificuldades vividas no período da ditadura, trazia a ideia de um futuro diferente, sem repressão militar, e teve seus trabalhos censurados em diversas ocasiões autoexilando-se na Itália em 69 – no período em que o título “anos de chumbo” entrou para a história. Na década de 70 ele voltou ao Brasil, sendo um dos artistas mais ativos na crítica política e na luta por um país de fato democrático. Ovacionado, ele apenas disse: “Eu não ia nem falar, mas cheguei aqui e fiquei todo besta quando vocês cantaram “Chico Eu Te Amo”.
As falas em prol da democracia deram o tom da Fundição Progresso presidida pelo agitador cultural e ator Perfeito Fortuna. Já nos Arcos da Lapa as falas a princípio foram mais políticas, seguidas pelas lúdicas proferidas pelos diversos músicos que fizeram os milhares dos melhores vibrarem no símbolo mais representativo do Rio Antigo, na região boêmica da Lapa.
João Pedro Stédile, liderança do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) convocou a militância a não dormir até o domingo (17), data que será votado o impeachment no Brasil: “no domingo, os morros têm de ocupar a Praia de Copacabana, que é do Brasil, não é dos coxinhas”. Hoje (12), a Furacão 2000 lançou o chamado para um grande baile funk contra o golpe no domingo, no qual estimasse que 100 mil pessoas das comunidades do entorno, como Rocinha, Vidigal e Cantagalo, tomarão uma das praias mais famosas do mundo. Em mesma data manifestantes pró impeachment chamam para ato na mesma orla.
Não havia lugar melhor para discutirmos os rumos do país do que em praça pública. Os ricos discutem nos jantares em hotéis. Direita, burguesia e coxinhas querem reaplicar o neoliberalismo para cortar os direitos dos trabalhadores e as politicas públicas. O outro objetivo é impedir que o Lula volte em 2018. Para barra a direita é preciso que cada um de nós se transforme em militante que não vai dormir daqui até domingo
Liderança do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), Guilherme Boulos, frisou que o que está em jogo e será decidido nessa semana é uma perspectiva de retrocesso histórico brutal, cujo pacote que se associa ao golpe é intragável, ataca direitos sociais, o ambiente democrático e a tolerância – o mínimo para o debate político.
O ex presidente Luiz Inácio Lula da Silva, presente no ato, fez uso da palavra em um discurso histórico frente ao povo que se reunia, escutava e vibrava a cada frase:
Eu tinha 18 anos de idade, quando no dia 31 de marco aconteceu o golpe militar. Naquela época as pessoas conservadoras diziam: Os militares vão consertar o Brasil, os militares não vão permitir que os comunistas entrem no Brasil e os militares vão acabar com a corrupção. Era esse o discurso da época. E muita gente acreditou, tanto acreditou que eu lembro da minha mãe, pobre coitada, dando a aliança de casamento dela para a campanha “Ouro pelo bem do Brasil”, que era pra salvar o país. E eu ainda muito jovem, que não tinha muita consciência política, por alguns momentos, acreditei que o Brasil ia melhorar e demorou exatamente 23 anos pra gente recuperar o direito a democracia nesse país.
A gente não mede o brasileiro pela camisa que a gente usa, a gente mede o brasileiro pela garra e vergonha na cara. Essas pessoas precisam aprender com o Lula. Aprendam a esperar. O Lula demorou 12 anos pra chegar lá, e chegou.
Esse país foi o último a conquistar independência. Último a abolir a escravidão, um dos últimos onde mulher teve direito a voto. Esse país só teve sua primeira universidade 400 anos depois de ser descoberto.
A elite acha que pobre tem que ser empregada doméstica, faxineiro. Só eles podem ser médicos e engenheiros. Nós mudamos essa lógica! Antes a universidade era só pra eles. Agora, eu quero que eles sentem num banco com o pobre.
Eu vou passar pra história como o presidente que mais fez universidade nesse país. Fizemos em 12 anos 3 vezes o que eles fizeram em décadas. O pobre brasileiro tem que ter o melhor. Eles não querem dividir o espaço público com o povo. Imagino a raiva que eles tem quando vão pra Bariloche e tem um pobre lá também.
Eu não quero dividir o país entre nós e eles. Porque eu governei um país para TODOS. Eles não gostam de política. Sabe quem fala por eles? O democrata Bolsonaro.
Assista: