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Ministério Público no Brasil: de instituição essencial à democracia a agente de insegurança das liberdades públicas

Charge: Vitor Teixeira por Marilia Lomanto Veloso A autonomia universitária se faz nos termos da Constituição Federal. Mas isso parece não impactar no Ministério Público Federal. Causa espanto e merece repulsa, a RECOMENDAÇÃO Nº 75, DE 4 DE ABRIL DE 2016, assinada pelos Procuradores da República Ailton Benedito de Souza e Cláudio Drewes José de […]

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Charge: Vitor Teixeira

por Marilia Lomanto Veloso

A autonomia universitária se faz nos termos da Constituição Federal. Mas isso parece não impactar no Ministério Público Federal. Causa espanto e merece repulsa, a RECOMENDAÇÃO Nº 75, DE 4 DE ABRIL DE 2016, assinada pelos Procuradores da República Ailton Benedito de Souza e Cláudio Drewes José de Siqueira, dirigida à Universidade Federal de Goiás, no propósito arrogante, infeliz, desastrado e imprudente, além de contrario ao princípio da razoabilidade, de impedir que a comunidade acadêmica se manifeste livremente sobre questões que importam à própria essência da democracia que o Ministério Público tem por função politica, social, institucional defender.

A RECOMENDAÇÃO antidemocrática e incipiente de desautorizar o debate sobre o impedimento da Presidente Dilma Rousseff, quer contra, quer a favor, ao contrario do que sugerem os representantes do Ministério Público federal, é um insulto ao artigo 127 caputda Constituição Federal de 1988, quando, antes de proteger a ordem jurídica e o regime democrático, volta-se contra esses institutos fundamentais à construção da sociedade livre, igual, justa, constituída por sujeitos que protagonizam sua própria história.

Não só aviltante o documento, como uma denúncia explicita do vazio de conhecimento dos signatários da peça infectada na sua origem, quanto ao papel histórico das universidades, desde sua criação, como centros de saberes universais, espaços pensados para além da discussão meramente técnica, evacuada de conteúdo político, como almeja a avareza da historieta que marca a RECOMENDAÇÃO. Ou porque não interessa aos Procuradores da República reconhecerem e respeitarem a autonomia político-pedagógica da universidade, ou porque de fato o horizonte dos signatários da peça não alcança os séculos recuados onde raízes das universidades estariam nos filósofos gregos ministrando aulas em seu próprio jardim, na perspectiva de compreensão e modific ação do mundo que os cercava, escapa ao texto a razoabilidade mínima para enxergarem as universidades como foruns de debates, de difusão de ideias, de florescimento de cultura, de saberes que dialogam para a transformação da realidade.

O Brasil recuou para a adolescência democrática, com graves instabilidades exaltadas pela mídia, com a trama jurídica estabelecida com a cumplicidade do Poder Judiciário, do Ministério Público, da Policia Federal, que extrapolam de suas funções enquanto sistema de segurança e justiça, enveredando por arriscadas escolhas ideológicas fatais `à ordem democrática. Nesse palco de eclosão de sentimentos e de pensamentos, a judicialização da política exaspera os conflitos, exigindo o debate público sobre os rumos políticos de nosso país, ameaçado por forças contrarias à legalidade do processo que legitimou Dilma Rousseff na Presidencia da República.

A universidade, nesse contexto, se apresenta como o espaço político, pedagógico onde essas questões precisam ser debatidas. A comunidade acadêmica tem, mais que direito, o dever de abrir suas comportas de acúmulo de saberes, de produção de conhecimento científico, de compreensão do mundo para dialogar com todos os setores da sociedade sobre o Brasil, inclusive, permitindo a formação da opinião pública alicerçada em subsídios respaldados no compromisso com a ética, com a ordem democrática, com as liberdades públicas. Aliado a essa intervenção mais que legitima, é função social da universidade, compilar e debater a partir de  elementos sólidos e confiáveis que confrontem as informações tendenciosas dos meios de comunicaçã o que não primam pela democratização essencial à credibilidade de suas notícias.

Nesse momento de graves riscos para nossa democracia, não cabe ao Ministério Público frustrar o debate legitimo e de inconfundível imprescindibilidade para a necessária compreensão do cenário convulsivo que está implantado no país, com a contribuição, a propósito, dessa instituição  tão ausente historicamente da efetiva prática das atribuições que a Carta Politica de 1988 lhe concedeu.

Quer silenciar as universidades, porque enquanto Ministério Público, não cumpriu, ao longo  de sua existência institucional, senão o papel de órgão acusador que insiste em reivindicar e consolidar. Quer silenciar as universidades, porque ao longo de seu tempo quedou-se em silencio diante do arbítrio e da violação a direitos da classe trabalhadora, de homens e mulheres, jovens, idosos, crianças que marcham em busca de terra para dignificar suas vidas e morrem abatidos pelas balas disparadas ou pelo latifúndio ou pelas forças policiais, sem que o Ministério Público se mova em direção à defesa desses sujeitos excluídos.

Quer silenciar as universidades porque emudeceu, como instituição essencial à defesa da ordem democrática, quando as garantias constitucionais de liberdade, de igualdade, de livre manifestação do pensamento, de reunião pacifica de sujeitos, estão sendo violentamente dilaceradas por togas que se colocam acima de princípios republicanos que fundamentam nossa ordem política, quando deixa de dar um freio à ruptura do sistema de justiça e segurança, incluindo ele próprio, o Ministério Público, com o respeito à dignidade da pessoa humana, aos títulos universais da presunção da inocência, diluindo nossa democracia em doses fatais de imperiosa intencionalidade de formular e executar mudanças que deslegitimam o processo politico de escolha livre da Chefe da Nação.

Quer silenciar as universidades para se afinar com o emudecimento do Ministério Público diante dos milhões de vulneráveis famintos, sem direito a educação, a saúde, a uma casa para morar, a lazer, a cultura, a ocupação de espaços restritos às elites que sempre mandaram no pais e que não suportam conviver com as conquistas sociais experimentadas por esse contingente pobre empoderado minimamente que seja, como reconhece a comunidade internacional que se posiciona a cada momento contra o surto golpista com o que esse Ministério Público pactua.

As comunidades acadêmicas desse país não podem se curvar a essa medida extrema de braço-de-ferro, de intervenção violenta na autonomia da universidade, na liberdade constitucionalmente permitida de reunião pacifica, de manifestação de pensamento, de debate público de ideias, de cumprimento efetivo da função social da universidade. Mais grave, não pode a Universidade Federal de Goiás, e nenhuma outra que venha a sofrer a mesma ameaça, ceder à exigência libertina contida na RECOMENDAÇÃO do Ministério Público Federal de Goiás, de legitimar, no meio acadêmico, a famigerada traição, ostensivamente utilizada pelo judiciário nas suas operações, identificada por delação premiada, para encaminhar nomes de responsáveis por manife stações organizadas nos espaços universitários, contra ou a favor do impeachment da Presidenta Dilma Rousseff.

Todo apoio à Universidade Federal de Goiás, centro acadêmico de excelência, comprometida com o papel da universidade na construção do saber, no diálogo com as organizações e movimentos sociais, pioneira no acesso dos filhos e filhas de trabalhadores sem terra a inclusão pela educação, com a Turma de Direito Evandro Lins e Silva, do PRONERA. Todo apoio à legitimidade da UFG e a todo e qualquer espaço onde pessoas se reunam para discutir o que é melhor para nossa sociedade. Se o Ministério Público não tem capacidade para entender e até mesmo incentivar debates sobre o processo democrático que lhe cabe defender, pelo menos tente não retornar ao silencio que tanto marca sua existência institucional diante da violação de direitos. Liberdade para os debates em nome do Estad o Democrático de Direito, dentro dos espaços democráticos das universidades.

Marilia Lomanto Veloso é Advogada, Professora aposentada da UEFS, Promotora de Justiça aposentada do Estado da Bahia, membro da AATR e da RENAP, Vice residente do Juspopuli, Escritório de Direitos Humanos

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Comentários

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Jó Ge

13/04/2016 - 06h24

Se as ervas daninhas estão prosperando no jardim do MPF é porque o jardineiro não esta cultivando o
solo da Democracia, não esta semeando a Justiça e tampouco irrigando o Estado de Direito.

Castor Filho

12/04/2016 - 23h00

Esses dois BABAQUARAS devem ser DEMITIDOS POR INCOMPETÊNCIA para exercer qquer função no MPF!

Maria Thereza G. de Freitas

12/04/2016 - 16h06

depois da carta do Conselho Universitário da UFG, que foi na lata desses procuradorezinhos de meia tigela, esse artigo é um tiro no peito do MP. E, como esse órgão, além de não cumprir suas funções constitucionais, tornou-se um monstro (palavras de seu criador), proponho #fimdompjá

Rachel

12/04/2016 - 15h16

Maravilhosa. Poderosa. Vou postar no facebook que fiz só para lutar contra esta corrente ditatorial, sem compaixão que ousa pensar que vamos deixar barato.

Sérgio França

12/04/2016 - 14h49

“O Brasil recuou para a adolescência democrática”… Pois é… Esses fraldinhas, bundinhas de mamãe, do Judiciário e do MP, estão acabando com o país! (E nunca lavaram uma roupa no tanque…).

Maria Aparecida Lacerda Jubé

12/04/2016 - 13h48

Obrigada DOUTORA MARÍLIA LOMANTO VELOSO, por me informar que o ministério público tem por dever constitucional defender a democracia. De tão desvirtuado está que, eu pensava que ele tinha por função proteger os corruptos poderosos, que abrem contas ilegais na Suíça, em Liechtenstein, cria empresas offshores através da panamenha Mossack Fonseca, maior lavanderia de dinheiro sujo do mundo, para ocultar seus patrimônios, muitas vezes adquiridos ilegalmente. Agora vejo como eu estava enganada.


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