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O manifesto dos brasilianistas não foi partidário

Venho, por meio desta singela coluna, apresentar uma versão diferente (a versão da maioria) do que aconteceu na reunião da BRASA por Rosana Pinheiro-Machado, na Carta Capital Quem aqui vos fala é uma pesquisadora, brasilianista e brasileira, que esteve na assembleia da BRASA (reunião da Brazilian Association Studies), a qual foi motivo de destaque no […]

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Venho, por meio desta singela coluna, apresentar uma versão diferente (a versão da maioria) do que aconteceu na reunião da BRASA

por Rosana Pinheiro-Machado, na Carta Capital

Quem aqui vos fala é uma pesquisadora, brasilianista e brasileira, que esteve na assembleia da BRASA (reunião da Brazilian Association Studies), a qual foi motivo de destaque no site da Folha de S.Paulo na quinta-feira 05 de abril, com o título “Manifesto pró-Dilma causa racha entre brasilianistas”.

Venho, por meio desta singela coluna, apresentar uma versão diferente (a versão da maioria) do que a Folha preferiu divulgar.

Vamos aos fatos de forma objetiva. Antes da BRASA, um grupo de pesquisadores da Brown University, incluindo o advogado Renan Quinalha e o Professor James Green, organizou um manifesto de pesquisadores do exterior, alertando para os riscos que a democracia brasileira estava sofrendo.

Centenas de pesquisadores assinaram este manifesto, gerando grande repercussão na mídia brasileira. Durante a BRASA, houve um ato em defesa da democracia na cerimônia de abertura do evento, que contou com a solidariedade de muitos participantes.

Soubemos que a assembleia iria votar uma possível moção da BRASA de apoio ao manifesto. Assim como funciona na democracia: as pessoas pediram a palavra, divergiram, emocionaram-se e, por fim, votaram. A maioria venceu.

Incrível que a Folha de S. Paulo ignora e silencia as vozes da maioria que esteva lá – principalmente as vozes das centenas de pesquisadores brasileiros e que atuam no Brasil. Ao só entrevistar pesquisadores homens, a matéria também ignorou as vozes das pesquisadoras mulheres.

Em primeiro lugar, eu gostaria de concordar com a posição de Anthony Pereira, do King’s College London, a qual Folha se refere em sua matéria. Eu também acho que o texto precisa de melhoras. Discordo com diversos pontos e penso que o manifesto poderia ser mais nuançado.

Esta era a minha posição: votar a favor do manifesto, mas discutir alguns pontos do texto.

Infelizmente, a urgência não deixou que isso acontecesse e votou-se o texto em questão. Esta foi a vontade aclamada – sem exagero de minha parte – da maioria.

Durante o debate, apenas dois ou três pesquisadores se posicionaram contra o manifesto. Dezenas, como eu, posicionaram-se a favor. Também citado na matéria da Folha, Idelber Avelar, de Tulane University, foi o primeiro a pegar o microfone.

Todos escutaram o que ele arduamente criticava, até ele falar que o manifesto era partidário. Naquele momento, ele foi fortemente vaiado – o único da assembleia a ser vaiado, diga-se de passagem.

Por que Idelber foi vaiado? Há muitas versões, mas o fato é que ele foi vaiado justamente no momento em que mencionou a questão partidária. Entre as vaias, as pessoas gritavam NÃO É PARTIDÁRIO. Curioso que a Folha decidiu dar destaque ao comentário mais rechaçado da reunião.

Idelber foi o primeiro a falar, seguido por uma avalanche de comentários contrários, incluindo o meu, de pessoas que diziam que não era partidário.

Também como eu, muitas pessoas manifestaram que não eram do PT e não apoiavam o governo, mas achavam que o papel da BRASA era se manifestar neste momento – como já fizeram tantas associações científicas.

Membros da BRASA afirmaram que o estatuto da associação dizia que a BRASA só se manifestaria em caso de violação de direitos humanos. Muitos argumentaram que este ato antidemocrático que se anuncia no Brasil está diretamente relacionado a diversas perdas de liberdades individuais e democráticas.

A violação de direitos humanos já é uma realidade do avanço do conservadorismo no Brasil e omitir-se a isso é bastante problemático, em meu ponto de vista.

Eu entendo que o manifesto poderia ser melhorado, incentivando o avanço das investigações anticorrupção e reafirmando o seu caráter apartidário.

A votação foi precedida de debate. A maioria venceu. É simples. No meu caso, acredito que o papel público do intelectual é se manifestar nestes momentos. E termino esta coluna com o meu breve comentário durante a assembleia: a não tomada de posição, em um momento de crise como o que vivemos, é uma tomada de posição.

Segue o manifesto (em inglês):

Since 1985, Brazil has been enjoying the longest period of democratic stability in its history, following a coup d’état in 1964 and a violent military dictatorship that lasted twenty-one years. Under the aegis of the 1988 Constitution, which guarantees a wide range of social and individual rights, Brazil has become a more democratic society, with greater political participation, broader and more inclusive notions of citizenship, and the strengthening public institutions.

In spite of these advances, corruption remains endemic. A series of scandals involving politicians of different party affiliations have outraged the public.

As a result, there have been widespread mobilizations demanding an end to illicit practices. There have also been bold actions by state institutions, such as the Federal Police, the Federal Prosecutors Service, and the Judiciary.

The combat against corruption is legitimate and necessary to improve the responsiveness of Brazilian democracy. But in the current political climate, we find a serious risk that the rhetoric of anti-corruption has been used to destabilize the current democratically-elected government, further aggravating the serious economic and political crisis that the country is facing.

Instead of retaining political neutrality and respecting due process, sectors of the Judiciary, with the support of major media interests, have become protagonists in undermining the rule of law. During their investigations, some public officials have violated basic rights of citizens, such as the presumption of innocence, the assurance of an impartial judiciary, attorney-client privilege, and the guarantee of the right to privacy.

The Lava Jato Operation, led by the federal judge Sérgio Moro, has centralized the principal corruption investigations over the last two years. These investigations have been marred by repeated excesses and unjustified measures, such as arbitrary preventive detentions, dubious and problematic plea-bargaining agreements, selective leaking of information to the media for political purposes, and the illegal wiretapping of both the current President of the Republic and the most recent former president.

All of this has taken place with the sustained support of powerful sectors of the media in an unprecedented effort to influence public opinion for specific political ends. The combat against corruption must be carried out within strict legal limits that protect the basic rights of the accused.

The violation of democratic procedure represents a serious threat to democracy. When the armed forces overthrew the government of President João Goulart in 1964, they used the combat against corruption as one of their justifications. Brazil paid a high price for twenty-one years of military rule.

The fight for a democratic country has been long and arduous. Today, all those who believe in a democratic Brazil need to speak out against these arbitrary measures that threaten to erode the progress made over the course of the last three decades.

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