Estava na praia, trabalhando ao celular (vantagens de ser blogueiro), quando vejo notícias sobre os “Panamá Papers”, chamado de “o maior vazamento da história”.
Os arquivos da Mossack Fonseca, a maior parideira de offshores do mundo, foram vazados.
Minha empolgação, porém, não durou muito.
Os vazamentos estão em mãos de um jornal alemão e do ICIJ – The International Consortium of Investigative Journalists…
O ICIJ é uma organização que, ao que tudo indica, é controlada por interesses ligados ao governo americano.
Aparentemente, o status quo global arrumou uma maneira de lidar com os vazamentos a la Wikileaks e Snowden. Agora eles mesmo o fazem, mas de maneira controlada e seletiva, cumprindo uma série de interesses geopolíticos.
Pode ser um pouco de paranoia, mas eu estou convicto que entramos em tempos de tanta guerra de informação que a paranoia se tornou uma necessidade.
Tanto é assim que, no Brasil, apenas Fernando Rodrigues, do UOL, e o Estadão, jornalão da direita golpista, além de duas figuras da Rede TV, terão acesso aos dados do vazamento.
É um escárnio: a ICIJ tinha obrigação de incluir membros da imprensa progressista em seu rol de parceiros: alguém da Carta Capital, da Caros Amigos, um blogueiro, etc.
Se puderem, mandem email para contact@icij.org, pedindo mais pluralidade entre seus parceiros no Brasil.
Não tenho ilusões: os membros brasileiros do ICIJ só irão catar dados que possam alimentar suas narrativas golpistas.
Já começaram, aliás. O foco é o mesmo: as “empresas da Lava Jato”. É ridículo. É o mesmo modus operandi dos vazamentos do HSBC, também fornecidos pelo ICIJ ao UOL: focaram apenas nas “empresas da Lava Jato”.
Descobriu-se que os barões da mídia tinham contas secretas na Suíça, informação divulgada, estrategicamente, no dia seguinte a uma grande manifestação antigoverno.
Divulgaram um monte de coisa e abafaram imediatamente.
As “empresas da Lava Jato” se tornaram, para a imprensa brasileira, as únicas contra as quais se pode publicar denúncias, pois isso ajuda a fortalecer politicamente uma operação que se tornou a ponta-de-lança do golpe.
E a Lava Jato precisa ser constantemente fortalecida. Tem de ser endeusada pela mídia, como algo acima do bem e do mal. É a única maneira de salvá-la das denúncias inúmeras que enfrenta, de abusos, irregularidades, crimes de todo o tipo.
As “empresas da Lava Jato” são as mesmas que fizeram obras para governos tucanos, e estão envolvidas em todos os grandes escândalos, pelo simples fato de que são as principais indústrias brasileiras do setor de construção civil, o único setor que sempre se mistura, por razões óbvias, por razões inclusive democráticas, eu diria, com a política, porque são os governos que as contratam.
Elas poderiam ser chamadas também de “empresas do trensalão”, por exemplo.
As empresas têm nome. Não são “empresas da Lava Jato”.
Qual o sentido jornalístico em ligar os documentos da Mossack Fonseca à Lava Jato, uma operação ilegal, golpista e acusada inclusive de nascer de um grampo ilegal? Nenhum.
A imprensa não poderia fazer reportagens independentes sobre os vazamentos da Mossack Fonseca?
É incrível: tudo, absolutamente tudo, é usado em prol do golpe.
Neste momento, jornalistas do UOL e do Estadão devem estar passando um pente fino nos dados, para ver se acham qualquer coisa que possam ligar ao governo.
São 20:44 e a Globo até o momento não publicou uma palavra sobre um escândalo que está na capa de todos os jornais do mundo. A Folha tem publicado sobre o caso desde as 15 horas. O silêncio da Globo explica-se pelo fato de ainda não terem encontrado algo que possa ligar o escândalo à Dilma ou Lula.
Como não encontraram nada, não publicam nada.
Internacionalmente, a coisa vai na mesma linha: o alvo principal é Putin, presidente da Rússia, um dos inimigos principais dos Estados Unidos, não mais por razões ideológicas, mas porque a Rússia se tornou o principal exportador de petróleo e gás do mundo.
Até o momento, não aparece nenhuma empresa americana ou alemã nos Papers, o que acentua a impressão de que o “maior vazamento do mundo” está vazando de maneira bastante seletiva.
Se depender dessa turma, esse vazamento será inteiramente manipulado com objetivo de beneficiar os interesses políticos das economias centrais e de seus satélites.
A esperança, portanto, é que comecem a acontecer vazamentos do vazamento, que tirem da ICIJ o monopólio dessas informações.
A notícia supostamente boa é que o ICIJ prometeu divulgar a lista completa ainda em maio deste ano, ou seja, daqui a um mês.
Prefiro permanecer cético.
O leitor deve se lembrar que uma das etapas da Lava Jato, a Triplo X, que visava pegar o “triplex”- que não é – de Lula em Guarujá, acabou por investigar a Mossack Fonseca. Quando se descobriu que algumas das offshore investigadas pela Lava Jato, em especial a própria Mossack Fonseca, tinham ligações com a Globo, Sergio Moro mandou soltar os presos – mesmo tendo sido descoberto que eles estavam destruindo provas – e a investigação foi completamente abafada. A mídia não publicou quase nada e a Lava Jato seguiu em outra direção.
O jornalista Luis Carlos Azenha, do blog Viomundo, publicou no twitter uma imagem que eu gostaria de comentar. É um dos documentos da Lava Jato que perderam o sigilo.
Na tabela em anexo, que aparentemente trata de pagamentos feitos à Mossack Fonseca por seus clientes, vemos ao final o nome da Vaincre LLC, uma offshore que tem como sócia a Agropecuária Veine.
A Veine é dona do “triplex em Paraty”, aquele que a família Marinho diz que não é dela.
Mas reparem na coluna da esquerda, intitulada Clientes. Ao lado da Vaincre aparece o nome Glem Participações, que pertence ao ex-genro de João Roberto Marinho, Alexandre Chiappetta de Azevedo, ex-marido de Paula Marinho Azevedo, filha de João Roberto Marinho.
Todas essas empresas ligadas ao triplex em Parati, ao genro de João Roberto Marinho, tem conexões na Mossack Fonseca.
A eclosão do escândalo da Mossack Fonseca, caso não haja ocultação de documentos por parte dos membros brasileiros da ICIJ, e caso eles esqueçam um pouco a obsessão de endeusar a Lava Jato e se debrucem sobre os documentos como um todo (deixando de lado essa palhaçada de “empresas da Lava Jato”), pode nos ajudar a descobrir e desbaratar grandes e antigos esquemas de corrupção e sonegação.
Desde que tudo seja feito com responsabilidade, sem espetáculo, sem abuso de poder, sem uso de tortura, sem prisões desnecessárias, sem terrorismo judicial, sem o intento de destruir as empresas nacionais e, sobretudo, sem o desejo de transformar a investigação numa ação político-partidária, os vazamentos vindos do Panamá podem nos ser úteis.