A Juventude, novo filme de Sorrentino, mesmo diretor do magistral A Grande Beleza (ganhador de Oscar de melhor filme estrangeiro), e do também aclamado thriller político El Divo (sobre Mussolini), estreia hoje em várias cidades do país, oferecendo mais um grande momento de prazer para os amantes da sétima arte.
O crítico Rodrigo Fonseca, dos blogs Omelete e P de Pop, resume: “Se seu monumental A Grande Beleza (2013) era o cinema da descrença e da ressaca, aqui Sorrentino nos entrega o cinema do encanto e da conciliação, mostrando que Michael Caine pode ultrapassar as fronteiras do sublime quando está afim.”
Veja, na imagem abaixo, em que salas ele estreia.
Clique aqui para assistir ao trailer.
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Abaixo, a crítica mencionada acima, de Rodrigo Fonseca.
Sorrentino e a estética da leveza
Por Rodrigo Fonseca, no blog P de Pop.
30 Março 2016 | 08:26
De uma doçura felliniana ao contextualizar as vicissitudes da “melhor idade” sob a ótica do companheirismo, Juventude (Youth) é um espetáculo de leveza, que arranca da tela grande, a partir da fotografia de Luca Bigazzi, toda a potencialidade física (e até metafísica) oferecida por aquele retângulo no qual sonhos se traduzem em imagens. O cansaço orgânico e mesmo afetivo dos personagens se desenha nos planos do cineasta Paolo Sorrentino (do seminal Il Divo) numa medida oposta, ou seja: com vigor jovial. Se seu monumental A Grande Beleza (2013) era o cinema da descrença e da ressaca, aqui Sorrentino nos entrega o cinema do encanto e da conciliação, mostrando que Michael Caine pode ultrapassar as fronteiras do sublime quando está afim.
Discussão sobre anemias emocionais e ideológicas expressa numa produção de 12,5 milhões de euros, Juventude põe Caine na pele do maestro Fred Ballinger e Keitel no papel do cineasta Mick Boyle. Fred não quer mais reger mais concerto algum. Mick, pelo contrário, ensaia a preparação de um filme sobre rugas emotivas. Os dois estão na casa dos 80 anos, curtindo as memórias e os impasses da idade em um hotel nos Alpes Suíços, enquadrado pela câmera de Sorrentino como uma espécie de paraíso. Ali, os dois terão a chance de rever o que sobrou: de tempo, de tesão, de fome de viver, de disposição para sonhar. Indicada ao Globo de Ouro pelo filme, Jane Fonda entra e sai e rapidinho de cena, no papel de Brenda Morel, uma estrela decadente que tem ataques de afetação.
Brenda quer abandonar o cinema para fazer TV, alegando que um papel na televisão pode lhe “custear uma casa em Miami”. Neste momento no qual o cinema (aquele com “C” maiúsculo) briga pela defesa da excelência da imagem em tela grande, clamando por uma conciliação com outras plataformas de exibição alimentadas por House of Cards e Game of Thrones, a discussão trazida por Juventude sintetiza um brado sobre o esplendor que só a dimensão agigantada do cinema consegue refletir.
De quebra, num flerte com a tradição italiana de diretores como Luchino Visconti e Valerio Zurlini, Sorrentino usa a mulher como um signo de todas as revoluções e todas as essencialidades, sem medo da nudez e sem medo da sensualidade. O Belo, conceito perseguido por toda a história da Filosofia, materializa-se, para o diretor, nas formas do Feminino… e na forma de um estado-nação imune a hierarquias e aristocracias chamado Amizade. Fred perdeu muito: paixões, projetos e até o viço. Mas Mick ficou. E, na lógica italiana, expressa no título de um filme da década de 1980, com Terence Hill e Bud Spencer, quem encontra um amigo encontra um tesouro. É dessa riqueza que Sorrentino fala, na poesia de um filme que aquece o peito.
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Outra crítica boa, publicada hoje, no caderno de Cultura do Globo, ao lado do bonequinho aplaudindo.
‘Para que serve uma boa história se não para contá-la?’
Por André Miranda, no Globo | 15:49h | 30.mar.2016
Num universo de frivolidades, é inútil tentar se apegar a números para definir juventude. A condição jovem tem mais a ver com o que se projeta da vida, um imaginário sobre si próprio e sobre os outros. Algo bem definido por uma frase do compositor e regente Fred Ballinger (Michael Caine), o protagonista do longa-metragem “A juventude”: “Ficar em evidência é uma tentação irresistível”.
No filme de Paolo Sorrentino, a juventude é exposta pelas lentes da fama e do sucesso, mesmo que efêmeros. É um tema presente em outros de seus filmes, pelo menos de “Il divo” (2008) em diante — na sequência, vieram “Aqui é o meu lugar” (2011) e “A grande beleza” (2013). De que adianta você ter feito algo relevante, se ninguém ficou sabendo? Para que serve uma boa história se não para contá-la?
Como em seus outros filmes, Sorrentino conta suas histórias com belíssimas imagens, misturando o clássico com o contemporâneo. Se o italiano Federico Fellini resolvesse largar o cinema para ganhar dinheiro com publicidade, esse personagem improvável seria Sorrentino. Em “A juventude”, ele escala a inglesa pop Paloma Faith como Paloma Faith (e ainda diz que ela é boa de cama), e a soprano sul-coreana Sumi Jo como Sumi Jo. Contrasta a aflição de um velho cineasta (Harvey Keitel) em achar o fim para seu filme com a de um jovem ator (Paul Dano) em ser reconhecido por seu talento. Inclui na trama um ex-jogador de futebol argentino extremamente obeso só porque, ora, Maradona é o exemplo perfeito de como não se apaga um sucesso, por mais besteiras que se faça.
Em paralelo, traz discussões sobre o passado e o futuro. Até os personagens de “Juventude” que pouco aparecem ajudam na ideia de que às vezes se consegue amenizar o efeito do tempo, muitas vezes não. Mas nada impede alguém de tentar, tampouco de não se conformar com o resultado. Definitivamente, a esperança é uma das grandes características da juventude.