Marcelo Freixo: ‘Combate à corrupção não pode ferir regras básicas do direito’

por Marcelo Freixo, em sua página oficial

Faço uma apologia ao diálogo. O mundo não pode ser dividido em coxinhas e petralhas. Não ergamos muros. Muros são surdos e podem soterrar a democracia.

Não é possível que as pessoas contrárias ao impeachment ou que criticam as atitudes do juiz Sergio Moro, apesar da gravidade de todas as denúncias contra o governo, sejam simploriamente acusadas de defenderem a corrupção.

O combate à corrupção é fundamental, mas não pode ferir regras básicas do Estado democrático de Direito. As investigações não podem ser empurradas pela lógica do “custe o que custar”, violando os limites legais.

Nossa democracia é uma conquista recente que custou muito caro. Enfrentamos o chumbo de oito anos de Estado Novo e 21 anos de ditadura civil-militar. Todos somos responsáveis pela preservação do Estado democrático de Direito.

Por mais importantes que sejam as investigações da Lava Jato e por maior que seja o clamor popular, as instituições não podem agir sob o calor dos acontecimentos e atropelar os ritos legais em nome do combate à corrupção. Não é pelo governo, é pela democracia.

Todas as manifestações são legítimas, sejam de esquerda ou direita, verdes, amarelas ou vermelhas. As ruas são o espaço da política e das nossas diferenças, mas as instituições não podem funcionar sob o ímpeto da mesma lógica.

É preocupante ver um juiz trocar a toga pela carapuça de herói nacional e extrapolar as exigências de seu cargo, publicando notas de caráter político, autorizando e divulgando escutas telefônicas juridicamente questionáveis e vazando informações de forma seletiva. O conteúdo dos diálogos é tão importante quanto o modo como eles foram obtidos.

A democracia não é construída com heróis, mas com instituições fortes e equilibradas que funcionem de forma soberana e transparente e que atuem dentro dos limites das garantias constitucionais.

A crença no salvacionismo judiciário é perigosa porque tolera arbitrariedades e reflete não apenas o completo esvaziamento da política, mas a sua total negação.

O messianismo pode ser sedutor aos espíritos cansados, mas não nos conduzirá ao paraíso. A reposta para a crise não é judicialização, mas a reafirmação da política enquanto espaço do diálogo, do convívio da diferença e da construção pública.

Precisamos criar formas de baratear campanhas eleitorais, acabar com o sequestro da soberania pela oligarquia político-econômica, fortalecer a transparência e garantir a participação das pessoas nas decisões de interesse comum.

Democracia não combina com salvadores da pátria. Como dizia o dramaturgo alemão Bertolt Brecht, pobre do povo que precisa de heróis. O futuro cabe a nós mesmos.

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