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A economia política de Lula. Por João Sicsú

Foto: Juca Varella / Agência Brasil É nítida a diferença entre o projeto de Lula e o daqueles que querem chegar o governo, não importa o caminho: a direita foca seu modelo no andar de cima por João Sicsú, na Carta Capital Alinhamento da grande mídia, posicionamento de membros do judiciário, ações da polícia Federal, manobras […]

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São Paulo - O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante ato na Avenida Paulista contra o impeachment e a favor da democracia (Juca Varella/Agência Brasil)

Foto: Juca Varella / Agência Brasil

É nítida a diferença entre o projeto de Lula e o daqueles que querem chegar o governo, não importa o caminho: a direita foca seu modelo no andar de cima

por João Sicsú, na Carta Capital

Alinhamento da grande mídia, posicionamento de membros do judiciário, ações da polícia Federal, manobras no parlamento, reações populares e disputas nas redes sociais têm algo que vai muito além da defesa do mandato ou o impeachment da presidente Dilma.

Nesse momento, há na sociedade brasileira uma disputa de projetos para o país. Muita gente quer derrubar a presidente Dilma, mas não é por conta da corrupção. Se fosse, suas lideranças deveriam ser arautos da transparência e da luta contra a corrupção.

Mas não são. São sonegadores de impostos, gente que tem conta na Suíça abarrotada de milhões de dólares, investigados em processos de corrupção ou quem tem no serviço público federal remuneração muito acima das regras. O jogo é outro. Apesar disso, ingênuos amarelados bradam contra a corrupção, mas estão nas mesmas fileiras que estão os grandes corruptos. É fácil perceber quem está de um lado e quem está do outro – e quais são os seus interesses econômicos e sociais.

A favor da derrubada de Dilma e contra a volta de Lula ao governo estão: a FIESP, os bancos, o baronato da grande mídia, a direita, os ricos, as altas classes médias e muitos ingênuos (que bradam sinceramente contra a corrupção).

Do lado oposto estão a Central Única dos Trabalhadores, o Movimento dos Sem-Terra, o Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto, movimentos sociais, os marginalizados das periferias, os partidos de esquerda, gente que é de esquerda e não tem partido, democratas e nacionalistas.

Esses agrupamentos representam interesses sociais e econômicos. Está aqui o objeto da economia política – que estuda a geração de renda, a produção de riqueza, a sua repartição na sociedade e a disputa de cada grupo por uma fatia maior. O que é legítimo. Trabalhador tem que querer maiores salários e empresários, maiores lucros. A questão fundamental é que para uma dada economia, os interesses de uns esbarram ou se confrontam com os interesses do outro lado.

Esse é o jogo que está sendo jogado. Para a direita e seus aliados é necessário o rótulo da luta contra a corrupção porque isso amplia o seu leque de alianças. Entretanto, a luta é pelo governo para que possam implementar um projeto que atenda aos seus interesses econômicos e sociais.

A direita e seus aliados desejam concentrar renda e riqueza em suas mãos. E para tanto, precisam reduzir ou acabar com programas sociais, rebaixar salários, cortar benefícios da Previdência, restringir direitos trabalhistas e reduzir recursos para a educação, cultura etc.

Dessa forma, sobrarão recursos no orçamento federal para que recebam desonerações fiscais, capturem mais juros pelos títulos públicos que possuem, paguem menos impostos sobre seus lucros, recebam incentivos variados para os seus negócios e compartilhem o pré-sal com as petroleiras americanas.

Eles não acreditam na capacidade nacional de desenvolvimento. Tudo deve vir de fora, produtos, multinacionais, capitais financeiros, projetos, ideias e ideais. Não é a toa que um deputado reconhecidamente corrupto, faz poucos dias, disse: “há muita gente disposta a financiar o negócio do impeachment” – ou seja, é um grande negócio e tem investidores.

Lula representou, no período 2006-2010, o oposto disto tudo. O grande temor que Lula volte ao governo enquanto ministro da Casa Civil é que o seu projeto possa voltar. O período de 2006-2010 foi um período de forte crescimento econômico, de redução de desigualdades e de ampliação de oportunidades sociais (principalmente, na área da educação). Naquela fase, os empresários e banqueiros também ganharam.

Eles preferem, contudo, muito mais um modelo parecido com o modelo da ditadura (1964-1985): além de considerarem politicamente mais seguro (inclusive para manter a corrupção), há crescimento com concentração de renda/riqueza e com liberdades democráticas restritas para que não possa haver contestação ao projeto em curso. Uma observação: os militares eram muito mais nacionalistas do que é a direita contemporânea e seus aliados.

Aqui é fundamental sabermos que para a viabilização de projetos que concentram renda e riqueza e eliminam oportunidades sociais é necessário também limitar liberdades democráticas. É preciso ter leis e a justiça no mesmo projeto. A insatisfação dos de baixo deverá ser contida pela polícia e pelas forças armadas que cumprirão ordens dadas pela legalidade judicial.

Em sentido oposto, Lula no ministério poderá recuperar a governabilidade, recuperar a economia e se tornar um candidato competitivo em 2018. Bastaria Lula fazer o governo reencontrar o modelo econômico e social do crescimento com geração de empregos, inclusão e distribuição de renda.

E isso é possível. O foco de Lula é nos pobres e nos trabalhadores que fazem com que as políticas econômicas sejam potencializadas. É fácil entender. São milhões gastando tudo o que recebem e com isso fazendo o roda gigante da economia (que está parada) girar rapidamente.

É exatamente aqui que fica nítida a diferença entre o projeto de Lula e o projeto daqueles que querem chegar ao governo já, não importa o caminho. A direita e seus aliados focam o seu modelo econômico no andar de cima: multinacionais, latifundiários, bancos, os ricos, milionários e as altas classes médias. Além da concentração de renda e de riqueza que pretendem realizar, deixarão a condução do Estado brasileiro e da economia para os mercados financeiros, as multinacionais e os latifundiários.

Tudo indica, entretanto, que Lula nomeado ministro fará o governo esquecer a reforma fiscal e da Previdência anunciadas pelo ministro da Fazenda. Lula contaminará o governo e agentes econômicos e sociais para um grande projeto de geração de empregos e renda, tal como provou que é capaz de fazê-lo no seu segundo mandato.

Isso não significará irresponsabilidade fiscal ou desconsiderar a necessidade de manter a inflação sob controle. Muito pelo contrário, a recuperação da economia fará a receita tributária aumentar e haverá o reequilíbrio das contas públicas. Além disso, Lula sabe que a inflação faz muito mal para a base social que pretende animar transformando-a em agente da dinamização econômica. 

Lula tentará conduzir o governo para governar para 175 milhões de brasileiros, enquanto o projeto da direita e seus aliados é governar apenas para 30 milhões. Lula desejará reduzir desigualdades de renda e de oportunidades.

A direita e seus aliados pretendem concentrar a renda, a riqueza e para tanto precisam conter a rebeldia dos debaixo reduzindo a liberdade de manifestação para fazer contestação. Portanto, o que está em jogo são projetos para as próximas décadas, mais que um governo ou dois governos. O jogo é muito mais sério do que o combate à corrupção que para ser reduzida não é necessário destituir a presidente, já que contra ela não existe nenhuma acusação dessa natureza.

Em conclusão, milhares, talvez milhões, de inocentes poderão ser vítimas dos seus gritos e atos de violência caso não percebam que o que está em jogo são projetos – cada qual com a sua economia política que busca atender interesses de segmentos sociais específicos. É preciso saber de que lado cada um estará. Do lado da redução das desigualdades e da busca por justiça social ou do lado oposto. Não existe terceira via.

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