Foto: Oswaldo Corneti/ Fotos Públicas
Diversos líderes da América Latina têm se manifestado contra a iminência de um golpe no Brasil. Por trás das campanhas midiáticas a favor do impeachment de Dilma e da prisão do ex-presidente Lula, ganha força a tese de uma articulação de interesses estrangeiros com movimentos de direita para desestabilizar governos de esquerda no continente
Na sexta-feira (18), o secretário-geral da Organização dos Estados Americanos, Luis Almagro, defendeu a continuidade da Operação Lava Jato, mas reiterou que não há fundamento jurídico para tirar a presidenta Dilma Rousseff do cargo. Segundo ele, a líder da nação demonstra, pelo contrário, um claro compromisso com a transparência institucional e com a defesa dos ganhos sociais alcançados pelo país na última década.
“Neste momento, a sua coragem e honestidade são ferramentas essenciais para a preservação e o fortalecimento do Estado de Direito”, disse Almagro.
Também na sexta-feira, os governos do Uruguai, da Bolívia e da Venezuela se manifestaram contra o golpe orquestrado no Brasil.
Uruguai
"Fiel defensor do princípio de não intervenção nos assuntos internos de outros Estados, mas ao mesmo tempo respeitoso do Estado de Direito e dos valores democráticos, o Uruguai confia que as diferenças internas existentes no Brasil serão resolvidas no marco do regime democrático", afirma o comunicado da chancelaria uruguaia, reproduzido pela agência EFE.
Em entrevista ao jornal La República publicada no domingo (20), o ex-vice-chanceler uruguaio Roberto Conde, candidato à presidência do país pela coalizão de esquerda Frente Ampla, também disse que uma das “prioridades imediatas” que Montevideo deve encarar é a agressividade crescente dos movimentos de direita, tanto no Uruguai como no contexto internacional, de onde, segundo ele, agiria uma direita “muito agressiva” que provoca divisões territoriais e guerras e viola reiteradamente o princípio de não-intervenção que rege a relação entre Estados soberanos.
Bolívia
"A direita no Brasil quer voltar por meio de um golpe no Congresso e um golpe judicial para castigar o Partido dos Trabalhadores, o partido do companheiro Lula, e para tirar e julgar a companheira Dilma", pronunciou-se o presidente da Bolívia, Evo Morales, em reunião com mineiros no povoado de Colquiri, no oeste do país, acrescentando que a "direita sul-americana e a direita americana" querem "castigar" Lula para que um dirigente sindical nunca mais volte a ser presidente.
Equador
Segundo afirmou o chefe de Estado do Equador, Rafael Correa, em entrevista veiculada na televisão estatal do país, está em curso no continente latino-americano um "novo plano Condor" contra os governos progressistas da região, do qual faria parte o ataque jurídico-midiático ao governo Dilma.
"Já não se precisa mais de ditaduras militares, se precisa de juízes submissos, se precisa de uma imprensa corrupta que inclusive se atreva a publicar conversas privadas, o que é absolutamente ilegal", disse Correa.
Venezuela
O presidente da Venezuela Nicolas Maduro, por sua vez, já havia se pronunciado na quinta-feira (17) sobre o assunto.
"Há um golpe de estado midiático e judicial contra a presidente Dilma Rousseff e contra Lula da Silva, líder do Brasil e da nossa América", disse Maduro, discursando no Palácio de Miraflores.
Segundo ele, "vários presidentes latino-americanos" estão "muito preocupados" com a situação no Brasil.
Argentina
Até mesmo o líder argentino Mauricio Macri defendeu, em entrevista ao jornal La Nación publicada no domingo, a decisão de Dilma de nomear Lula ministro da Casa Civil, manifestando um "apoio institucional" de Buenos Aires à presidenta.
"Quero crer que ela fez isso para fortalecer seu governo do ponto de vista operacional, não para encobrir uma causa judicial. Desse ponto de vista, é absolutamente válido. Agora, não cabe a segunda intenção, que não me consta", disse Macri, expoente da direita liberal.
Em todos esses países, a popularidade de partidos e movimentos da direita aparenta estar crescendo, ensejada pelo aprofundamento da crise econômica regional — na qual a queda internacional dos preços do petróleo, patrocinada pelos EUA em conluio com a Arábia Saudita, exerce papel de considerável destaque — e pela crise política, em meio às denúncias de corrupção que, apesar do escopo fenomenal, têm sido acompanhadas seletivamente pela grande mídia.
Segundo muitos analistas, de fato, a crise vai além das dificuldades econômicas e políticas particulares a cada nação e envolvem interesses de grandes corporações e o respaldo velado dos EUA.
O jornalista Glenn Greenwald, que ajudou o ex-analista da NSA Edward Snowden a denunciar ao mundo o escândalo dos programas de espionagem civil dos EUA a nível global, afirmou na sexta-feira, em matéria no jornal The Intercept, que "as corporações de mídia" do Brasil agem como "organizadoras de protestos" e "máquinas de relações públicas de partidos da oposição". "Os interesses mercadológicos representados por esses veículos midiáticos", destacou Greenwald, "são quase que totalmente pró-impeachment e estão ligados à história da ditadura militar".
?"De forma simples, essa é uma campanha para subverter as conquistas democráticas brasileiras por grupos que por muito tempo odiaram os resultados de eleições democráticas, marchando de forma enganadora sob uma bandeira anti-corrupção: bastante similar ao golpe de 1964. De fato, muitos na direita do Brasil anseiam por uma restauração da ditadura, e grupos nesses protestos “anti-corrupção” pediram abertamente pelo fim da democracia”, observou o jornalista.