Em meio à tempestade semiótica em que vivemos, eu desconfio de tudo que vem da grande mídia.
Prefiro me tornar um pouco paranoico a ser enganado pelas astúcias de uma imprensa comprovadamente corrupta, sonegadora (de impostos e informação) e golpista.
Enquanto tigrada e mídia fazem um carnaval contra Lula por causa de dois pedalinhos, uma canoa de lata e meia dúzia de armários de cozinha num apartamento que não é dele, e isso gera semanas e semanas a fio de notícias, quando o escândalo é com tucano, mesmo sendo a coisa mais cabeluda do mundo, nunca prospera muito.
Por exemplo, já foram encontrados 19 quilos de pasta base de cocaína na fazenda do senador tucano Aloysio Nunes. A matéria saiu na Folha, mas evidentemente nunca houve investigação profunda sobre o caso. A polícia disse que os traficantes usaram a fazenda por engano… Ah, imagine se tivessem usado, "por engano", o sítio em Atibaia?
Os petistas devem orar todas as noites para nenhum traficante de cocaína usar, "por engano", um sítio seu ou de seus amigos.
Depois tivemos o incrível caso do helicóptero do senador Perrela, amigão do peito de Aécio Neves, apreendido com meia tonelada de pasta base de cocaína. O helicóptero parou ali do lado de Claudio, onde Aécio mandou construir, com verba pública, aeroporto em terras da família, para uso exclusivamente privado.
Pasta base de cocaína significa que o produto final será bem mais pesado. A pasta é como se fosse um xarope ultraconcentrado.
Voltando à denúncia contra Aécio na Época, observe uma coisa na reportagem assinada pelo enfant terrible da direita platinada, Diego Escosteguy: Ministério Público e Polícia Federal sabiam há tempos das contas no exterior de Aécio Neves.
Por que o vazamento para a Época agora, neste momento?
Não se enganem. A reportagem da Globo (a Época é da Globo) não visa denunciar Aécio Neves.
É uma reportagem para defender o tucano, para controlar a narrativa sobre suas contas secretas: visto a ênfase que dão no valor – irrisório – encontrado por lá: pouco mais de 30 mil dólares (não se sabe quanto foi movimentado antes).
Faz parte da estratégia midiática denunciar um tucano de vez em quando (muito de vez em quando), seja para atenuar um pouco as denúncias de parcialidade, seja para controlar a narrativa e salvá-lo.
Sem contar que dá vontade de rir ver uma das revistas da Globo fazer matéria sobre conta no exterior. Em nossas investigações sobre a sonegação da Globo, provamos que o grupo usa e abusa de contas offshore para burlar o fisco no Brasil. E movimenta centenas de milhões de dólares.
A mídia, porém, até onde for possível evitar, não fará uma campanha para derrubar Aécio Neves.
Não usará as contas no exterior para criar uma narrativa diabólica sobre o tucano e sua família, contectando esse a outros escândalos.
Eu estou muito curioso.
Por que a Época fala de contas em Liechtenstein exatamente no momento em que aparecem novas informações sobre Furnas, este sim, ao que parece, o principal escândalo de Aécio Neves, em vista da farta quantidade de documentos e delações envolvendo o nome do senador?
Já são cinco denúncias na Lava Jato, quase todas ou todas envolvendo Furnas, e a Época vem com matéria sobre Liechtenstein?
Claro, essa conta pode ter sido usada para receber o dinheiro sujo de Furnas… Mas a ênfase tinha que ser em Furnas.
É claro que, se não mais for possível (e talvez isso esteja quase acontecendo), a mídia irá rifar Aécio Neves, e usará o fato para aumentar sua pontuação. Mas se for rifar Aécio, ele será derrubado sozinho. Não haverá campanha para arrastar o PSDB junto, como fazem sempre com o PT.
Eduardo Azeredo, ex-presidente do PSDB, acaba de ser condenado por corrupção. A notícia recebeu pouquíssimo destaque na mídia e, sobretudo, não se tornou mote para campanhas investigativas sobre a corrupção política crônica dentro do PSDB.
A narrativa de que a corrupção é patrimônio exclusivo do PT precisa ser mantida no imaginário social por mais algum tempo, ao menos até a derrubada do governo e consolidação do próximo.
Quando o próximo governo se consolidar, então a mídia tentará derrubá-lo ou enfraquecê-lo também, para arrancar chantagens ou forçá-lo a seguir as ideias estritamente neoliberais, que são as ideias que a mídia representa no Brasil.
É importante observar que a Época é a revista que, ontem mesmo, publicou a seguinte reportagem, que já virou chacota na internet (inclusive entre os comentaristas da matéria na própria revista).