Um repórter ligando para a octogenária mãe de uma juíza para perguntar qual o palpite dela sobre a posição da filha em relação à possível prisão de um ex-presidente remete a duas questões: a indulgência jornalística e a ação política em si
por Leandro Fortes, na Revista Fórum
O repórter de O Globo liga para a mãe da juíza Maria Priscilla Ernandes Veiga Oliveira, a quem foi enviado o patético pedido de prisão de Lula feito pelo Ministério Público de São Paulo, e pergunta:
– Qual é o palpite da senhora, ela prende ou não o ex-presidente?
A mãe da juíza, uma mulher de 80 anos, responde:
– Meu filho, ligue mais tarde e pergunte pra ela.
E tira o telefone do gancho.
Um repórter (imagino, um jornalista) ligando para a mãe de uma juíza para perguntar qual o palpite (!) dela sobre a posição da filha em relação à possível prisão de um ex-presidente.
Há duas questões relevantes a serem tratadas, a partir dessa reportagem abjeta.
Primeiro, a indigência jornalística, e não apenas de um repórter que se dispõe a fazer um perfil de quem quer que seja a partir de duas respostas desconexas arrancadas de forma cretina de uma octogenária.
Isso, esse lixo, passou pelas mãos de mais de um editor, por ser uma óbvia encomenda da direção do jornal.
E, ainda assim, foi publicado.
Segundo, a ação política, em si.
O Globo, sempre ele, saiu na frente do processo de cooptação da juíza Maria Priscilla, a quem, como no caso de Sérgio Moro, dará duas alternativas:
1) O paraíso: o prêmio Faz Diferença, aparições no Faustão, cobertura laudatória no JN etc etc etc ou
2) O inferno: será jogada no canil de seus colunistas hidrófobos e passará a ser odiada, toda noite, por William Waak.
Como aperitivo, ofereceu uma fofura, ao lembrar que a juíza é apaixonada por gatos.
Mas também arreganhou os dentes: publicou o endereço da mãe da juíza, para um eventual esculacho de retardados online; e lembrou que a magistrada já condenou um homem a três anos de prisão, apesar de ele não ter sido reconhecido pela vitima.
Prepare-se, meritíssima, chegou a sua hora.