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A loucura com método dos golpistas

Análise Diária de Conjuntura – 10/03/2016 Vivemos um período revolucionário, mas infelizmente não no bom sentido. Talvez fosse melhor usarmos um neologismo: período involucionário. Ou retrovolucionário.  O único lado bom que eu consigo ver em todos esses atentados contra a democracia e contra a Constituição é que agora a esquerda organizada despertou de vez para […]

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Análise Diária de Conjuntura – 10/03/2016

Vivemos um período revolucionário, mas infelizmente não no bom sentido. Talvez fosse melhor usarmos um neologismo: período involucionário. Ou retrovolucionário. 

O único lado bom que eu consigo ver em todos esses atentados contra a democracia e contra a Constituição é que agora a esquerda organizada despertou de vez para o problema da mídia. 

Meia dúzia de barões da mídia, mesmo em declínio rápido, ou justamente por causa desse declínio, assumiram o papel de vanguarda de um movimento golpista, que vem sendo construído há muito tempo, quiçá desde a redemocratização. Ou melhor, vem sendo construído desde a sua origem, dado que hoje sabemos que as únicas empresas de grande porte que conseguiram sobreviver a 80 anos de solavancos econômicos foram aquelas que foram subsididadas pelo imperialismo, contra o Brasil.

Essa é a raíz histórica do viralatismo e do golpismo, os dois grandes males do século XX em nosso país. 

Na verdade, é doloroso constatar, o golpe de 1964 não terminou ainda. Não terminou porque a democracia não conseguiu acertar as contas com os seus principais responsáveis, que não foram os militares e sim a mídia. 

A mídia deu o golpe em 1964, e a esquerda organizada falhou miseravelmente em relatar isso ao povo brasileiro. As comissões da verdade se limitaram a contar historinhas sobre a tortura feita a um punhado de militantes políticos de classe média. 

As comissões da verdade não contaram a história mais importante da ditadura: como a opinião pública foi envenenada e manipulada pela imprensa da época (a mesma de hoje) para acreditar que o governo Jango era antidemocrático e preparava um golpe comunista no Brasil. 

As grandes manifestações de rua que antecederam o golpe, com apoio dos governadores de oposição e, principalmente, da mídia, são as mesmas que tem acontecido desde o ano passado, e que voltará a ocorrer no domingo próximo.

O golpismo está tão ansioso para consumar um ataque letal ao governo que alguns de seus soldados batem cabeça. É ilegal que um cidadão seja perseguido pelo Estado, pelo mesmo motivo, em duas investigações distintas. É o que faz o ministério público: investiga o triplex que não é de Lula em duas frentes, na Lava Jato e no inquérito do Dr. Conserino. 

Tudo é ilegal nessas operações.

Hoje sabemos que o promotor Conserino, do Ministério Público de São Paulo (MP-SP), pediu a prisão de Lula. A decisão ficará em mãos de um juíza, que agora passará a ser pressionada pela mídia e pelo fascismo.

Um amigo advogado matou a charada. A denúncia é inepta, o pedido de prisão é bizarro. A tendência é o seguinte: chantagear a juíza. Ela não aceita a prisão, mas terá que aceitar a denúncia. 

A loucura dos golpistas, como diria o bardo, tem método!

Qual o sentido em mandar prender um ídolo nacional, um homem de 70 anos, por conta de um apartamento que não é dele? 

Tudo faz parte do golpe, é claro. 

As elites, agora que se sentem terem assumido o controle das forças armadas civis (a polícia federal), decidiram patrocinar uma espécie de fuzilamento político das esquerdas. 

O timing do golpe é certeiro. Ele tenta criar uma atmosfera insuportável de medo e opressão, com objetivo de pressionar os deputados a votarem pelo impeachment. 

São duas frentes agora: o impeachment e a casssação no TSE. 

É um quadro triste, desesperador, para quem ama a democracia. 

Em 2013, eu e mais três companheiros fomos à Polícia Federal protocolar uma denúncia contra a sonegação da Globo. 

Publicamos na internet um documento com centenas de páginas, e nada. Ninguém se aventurou a se aprofundar naquela denúncia.  

Estamos denunciando o golpismo da mídia há mais de dez anos. 

O governo nunca fez nada. Nem sequer verbalmente. Com Dilma, então, o retrocesso foi profundo. 

A própria Dilma e seu grupo mais íntimo de ministros, como Mercadante, Cardozo, pareciam olhar para aqueles que alertavam para o golpismo da mídia como um bando de radicais. 

Não éramos radicais, mas sempre estivemos na linha de frente das guerras midiáticas e, portanto, sempre soubemos que a mídia era, é e continuará sendo profundamente golpista. E se é golpista, ela representa um perigo para a nossa democracia, como agora está bem claro.

O Brasil está sendo ameaçado por meganhas enlouquecidos: meganhas do ministério público, meganhas da polícia federal e meganhas da mídia. 

Todos os tipos de arbitrariedade e violência estão sendo cometidos em nome de objetivos políticos obscuros. 

Grandes empresas nacionais, que vinham ganhando mercados lá fora, estão sendo destruídas por estes meganhas. 

O principal partido popular do país vem sofrendo ataques profundamente antidemocráticos pelos meganhas. 

Agora a meganhagem ameaça vir para cima dos sindicatos.

Soubemos que a Istoé vem para cima dos blogueiros. Aliás, a Lava Jato já tentou vir, por algumas vezes, para cima dos blogueiros, e agora, com a armadilha montada contra o Eduardo Guimarães, tentam um novo ataque. Naturalmente, querem quebrar os sigilos eletrônicos do Eduardo Guimarães, e expô-lo a execração midiática, juntamente com todos os blogueiros.  

Todos os monstros do golpismo, da truculência, da reação, despertaram de uma só vez, furiosos por terem sido obrigados a se ocultar em armários durante tanto tempo após a redemocratização. 

Não vivemos tempos apenas sombrios. Vivemos tempos dramáticos. 

Mas eles também estão cometendo muitos erros.  

O primeiro é esquecer que há muita gente, cada vez mais gente, que não engole suas mentiras. 

Quero acreditar – é minha derradeira esperança – que o golpe midiático que tentam aplicar no Brasil se tornará um marco mundial na luta contra esse novo tipo de conspiração.

Com George Bush, o mundo viveu o ápice do belicismo imperialista norte-americano. O orçamento militar americano multiplicou-se em várias vezes, com ênfase em guerras e armamento pesado.

Com Obama, usou-se o orçamento principalmente para operações de informação e inteligência. 

E aí pegar o Brasil foi a coisa mais fácil. Um governo ingênuo, que deliberadamente desmontou sua estrutura de inteligência. Um governo que nunca se preocupou em montar um estrutura mínima de comunicação política, e isso num país com a mídia mais concentrada do mundo.

Quantos erros, meu Deus!

A ingenuidade e estupidez com que os governos petistas lidaram com a questão da mídia, entrará para a história como um erro trágico, pelo qual o povo brasileiro paga hoje um preço terrível.  O próprio PT foi o primeiro a pagar por esse erro. Suas lideranças mais importantes foram presas depois de processos judiciais medievalescos, profundamente contaminados pela mídia. 

É um erro para o qual não faltaram alertas. Quando o processo do mensalão saiu da esfera parlamentar e entrou na seara judicial, muitos avisavam que o sacrifício de Genoíno, Dirceu, Pizzolato criaria uma jurisprudência perigosa. Houve ainda o velho sectarismo político.  Os empresários ligados ao mensalão também foram vítimas. É o embrião da Lava Jato: prender empresários para subsidiar a narrativa golpista com vilões ricos. A troco de que condenar publicitários mineiros, que sempre estiveram envolvidos com o PSDB, como partícipes de uma conspiração que visava manter o PT no poder? 

Empresários raramente são santos. Mas prendê-los preventivamente por nove, dez meses, como forma de torturá-los, ameaçá-los com condenações exageradas, de 15, 20, 30 anos (Moro acabou de condenar Marcelo Odebrecht a 19 anos, o mesmo tempo de prisão recebido pelo psicopata noruego que matou dezenas de jovens), expô-los a execração pública, destruir suas empresas, isso evidentemente não está certo.

O outro erro, evidentemente, foi a perda gradativa de controle sobre a polícia federal. Evidentemente, o governo deveria, desde o início, ter criado centros de inteligência para manter o espírito e a moral da polícia federal alinhados ao pensamento político do governo eleito pelo povo.

É para isso que elegemos um presidente! Para manter a ascendência política sobre o poder armado do Estado. 

Nisso, Dilma falhou miseravelmente. Ela nem sequer tentou construir alguma coisa. O discurso era sempre no sentido de fortalecer a autonomia das burocracias. 

Em seu discurso da última sexta-feira, o ex-presidente Lula mencionou o método que passou a aplicar na escolha dos procuradores gerais da república: levou para o governo a sua experiência sindical, nomeando sempre o primeiro nome escolhido pela burocracia. 

Só que o Ministério Público não é um sindicato, Lula! Um sindicato não tem o poder de pedir a prisão de outros cidadãos. 

Isso foi um erro trágico, porque aí o governo ajudou a alimentar o espírito corporativista de uma instituição que, por suas características, já tinha uma forte tendência ao corporativsmo.

Mas talvez o corporativismo do MP viesse mesmo sem os erros – que foram bem intencionados – de Lula.

O MP hoje abriga um exército semi-fascista. Por alguma razão, e isso evidentemente é um erro de todos nós, um erro da própria Constituição, que não pensou em investir na pluralidade política dos membros do MP, por alguma razão o perfil médio de promotores e procuradores é de reacionários de extrema direita.

O mesmo acontece com o judiciário. 

Tudo isso deveria ter sido discutido em fóruns, e para isso servem os governos e partidos políticos. 

E nada foi feito. Ao contrário, o PT encheu os tribunais superiores de juízes antipetistas e reaças, sabe-se lá com base em que cálculos políticos aloprados. 

Tantos erros!

Mas todos os golpes se alimentam dos erros da democracia. 

Os golpes, aliás, redimem os erros da democracia. 

Tocqueville ensina que o principal trunfo da democracia é justamente a sua flexibilidade para suportar erros de todo o tipo. 

Afinal, sempre há tempo de corrigi-los! 

Essa também é minha esperança. 

Sobre as ruínas de todos os erros que cometemos até aqui, sobre as ruínas de um golpe que nasce moralmente natimorto, iremos construir, finalmente, uma democracia sólida. 

Não será fácil, todavia. Enfrentaremos ainda uma longa noite de autoritarismo. 

Mas se tudo tinha que acontecer assim, que seja. Viver não é sempre perigoso?

Os diamantes se forjam sob a pressão dramática das rochas mais duras e das temperaturas mais altas. 

Assim nasceu Lula, sob a pressão terrível de séculos de opressão social. 

Com a prisão, real, política ou moral, de Lula, surgirão milhões de Lulas. Milhões de lideranças corajosas, intuitivas, que imitarão as virtudes de Lula, mas não os seus erros! 

Essa é a minha maior esperança! 

E as minha esperanças, eles não podem matar!

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Miguel do Rosário

Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.

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