Foto: Junior Pinheiro / Folhapress
por Patricia Faermann, no GGN
O histórico dos despachos protocolados na Justiça Federal do Paraná, desde o final de fevereiro até um dia antes da condução coercitiva do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, revela qual é o peso e o papel de cada um dos núcleos – procuradores do Ministério Público Federal, delegados da Polícia Federal e o juiz Sergio Moro – na investigação que busca afetar a imagem de Lula como figura política.
O pedido original da equipe de procuradores da Lava Jato com mira no ex-presidente ocorreu no dia 20 de fevereiro e incluía solicitações de busca e apreensão, conduções coercitivas e prisões temporárias. Até então, Lula era alvo apenas de buscas em sua residência.
Em primeira decisão, do dia 24 de fevereiro, Sérgio Moro autorizou os mandados de busca e apreensão em diversos endereços.
"Os mandados terão por objeto a coleta de provas relativa à prática pelos investigados dos crimes de corrupção, lavagem de dinheiro, evasão fraudulenta de divisas e de falsidade, além dos crimes antecedentes à lavagem de dinheiro", disse o juiz. "As diligências deverão ser efetuadas simultaneamente e se necessário com o auxílio de autoridades policiais de outros Estados, peritos ou ainda de outros agentes públicos, incluindo agentes da Receita Federal", especificou.
No mesmo despacho, o MPF tinha solicitado a prisão temporária de Paulo Tarciso Okamoto, José de Filippi Júnior e Paulo Roberto Valente Gordilho. Em relação a esse pedido, Moro negou: "apesar do requerimento do MPF, entendo que mais apropriado nessa fase o aprofundamento da colheita dos elementos probatórios, sem a imposição da prisão temporária. Não obstante, entendo que se justifica a condução coercitiva dos indicados para que prestem esclarecimentos nas mesmas datas das apreensões".
Com a negativa, o juiz ordenou que os investigados teriam que prestar depoimentos no momento imediato à realização das buscas e apreensões. Tal despacho envolvendo os três citados daria sustentação para a decisão de Moro aceitar, posteriormente, que Lula também sofresse a coerção – se o direito de ampla defesa não é garantido a eles, também não poderia ser no caso do ex-presidente.
O mesmo grupo de procuradores solicitou ao juiz "autorização para a condução coercitiva" de outros investigados "para a tomada de seu depoimento". Para justificar que a ação já adotada desde o início da Lava Jato seguiria o que o juiz federal acredita como "legal", justificou que o instrumento "não implica cerceamento real da liberdade de locomoção, visto que dirigida apenas a tomada de depoimento" e acrescentou que "mesmo com a condução coercitiva, mantém-se o direito ao silêncio dos investigados".
Mas naquele momento, não se registrava a intenção de usar a coercitiva com o ex-presidente.
O pedido era direcionado ao caseiro do sítio de Atibaia, Elcio Pereira Vieira, vulgo Maradona, a Luiz Antônio Pazine e Paulo Marcelino Melo Coelho, pessoas autorizadas por Paulo Tarciso Okamoto, a retirar da Granero os bens do ex-Presidente, e João Henrique Worn, taxista de confiança de José de Filippi Júnior, e encarregado por este de supostamente receber valores em espécie na UTC.
Como os procuradores tinham pedido a prisão temporária e Moro negou de Paulo Tarciso Okamoto, José de Filippi Júnior e Paulo Roberto Valente Gordilho, o juiz autorizou a opção de coercitiva também aos três. E lembrou: "consigne-se no mandado que não deve ser utilizada algema, salvo se, na ocasião, evidenciado risco concreto e imediato à autoridade policial".
No final daquela decisão, Moro demonstrou maior cautela do que já manteve em despachos relativos a outros processos da Lava Jato. Disse que os mandados autorizados por ele não significavam responsabilização do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, uma vez que, até o momento só haveria "cognição sumária", que no direito processual significa probabilidades que não podem gerar a "certeza" da existência do fato.
"Dado o caráter das medidas, algum aprofundamento na valoração e descrição das provas é inevitável, mas a cognição é prima facie e não representa juízo definitivo sobre os fatos, as provas e as questões de direito envolvidas, algo só viável após o fim das investigações e especialmente após o contraditório", enfatizou o juiz, com uma rara demonstração de cautela.
Dois dias depois, os procuradores enviam a Moro novas informações, corrigindo endereços dos pedidos de busca e apreensão. O juiz acata.
Mais três dias se passaram, e novas retificações de endereços sobre os mandados foram autorizadas por Moro no dia 29 de fevereiro, uma segunda-feira, às 10:20 da manhã. Até então, o tempo entre os requerimentos da PF ou do MPF e respostas de Moro ocorreram com agilidade.
Mas naquela segunda, três horas depois do primeiro despacho, por algum motivo, o juiz Sergio Moro recupera um pedido de Deltan Martinazzo Dallagnol, até então não respondido.
A solicitação do procurador e de sua equipe do MPF na Lava Jato ocorreu no dia 22 de fevereiro, antes mesmo da primeira decisão do juiz Moro sobre as buscas e apreensões. Era o pedido de coerção ao ex-presidente Lula e dona Marisa. E era um acréscimo da solicitação original de buscas e apreensões do MPF, entregues no dia 20 de fevereiro.
Conforme havia adiantado o GGN, Moro seguiu a cautela de autorizar a coerção, "caso o ex-Presidente, convidado a acompanhar a autoridade policial para depoimento, recuse-se a fazê-lo". A adição do trecho era uma garantia de Moro para que a reação momentânea de Lula em sua defesa, consciente das suposições de que seria preso pela Lava Jato nos dias seguintes, provocasse nos delegados da PF a liberdade para a coerção.
Os agentes da PF precisariam, apenas, serem avisados da estratégia. A declaração do delegado Luciano Flores de Lima, de que Lula afirmou que "não sairia daquele local, a menos que fosse algemado" prova que a ordem foi seguida. Em seu relato, o policial admite que apressou o ex-presidente, antes de ele anunciar que não sairia da residência. A sustentação jurídica estava posta.
Após aquele despacho de Moro, a orquestração da Lava Jato seguiu. É possível verificar que, nos pedidos seguintes, quem entra em cena é a Polícia Federal, e saem das solicitações osprocuradores. A atuação dos delegados comprova que, a partir daquele momento, eles foram integrados nas estratégias da nova fase.
No dia seguinte, dia 1o de março, os agentes pediram a Moro que incluísse nos mandados a sede da Odebrecht, em São Paulo, onde estariam computadores da empresa que poderiam armazenar provas. Os delegados solicitaram, também, a condução coercitiva do Chefe do Setor de Tecnologia da Odebrecht, Alessandro Tomazela, para auxiliar os investigadores a extrair os dados do computador.
Nessa coerção, Moro atenta que o mandado "só deverá ser cumprido se houver recusa ou demora voluntária do referido empregado no auxílio da Polícia Federal".
Na quarta (02), a Polícia Federal voltou a pedir a Moro novos requerimentos. Esclarece endereços e solicita busca e apreensão em novos pontos, que o juiz não acata por não terem as localizações confirmadas. Um dia antes da nova fase da Operação Lava Jato que conduziu coercitivamente Luiz Inácio Lula da Silva, são os delegados da PF que requerem, ainda,"mandados de condução coercitiva faltantes" em nova e última petição a Sergio Moro.
17Abril2016
14/06/2016 - 17h24
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