Foto: Douglas Magno/AFP
por Marcio Tenembaum, no Democracia e Conjuntura
Jorge Bornhausen durante a crise do chamado mensalão disse que o “país ficaria livre por um bom tempo dessa raça “, se referia ao PT. Se Lula teve uma infância difícil, pobre, passou fome, não muito diferente dos milhares iguais a ele excluídos desse país, felizmente não perdeu a família dizimada em campos de concentração nazista. Felizmente.
Porque o resultado e suas consequências dessa infeliz experiência que 6 milhões de pessoas tiveram durante a 2ª Guerra Mundial nortearam os herdeiros dessas pessoas massacradas no holocausto e qualquer sinal ou aviso que alguém pretende destruir, aniquilar os herdeiros que compõem esse povo outrora perseguido, acende o sinal amarelo que o autor da ameaça possa não estar brincando, possa não ser uma simples bravata e possa, de fato, querer levar isso adiante.
Pois esse sentimento “paranoico” adquirido com os séculos de perseguição condicionou essas pessoas que sofreram expulsões, impedimentos profissionais, proibições de ocuparem terras, etc. Mas nunca antes na história da humanidade houve uma formatação industrial para aniquilamento de um povo em um curto espaço de tempo. Nunca antes na história houve uma solução final.
Portanto, quando no início da perseguição nazista a reação natural era que seria a mesma perseguição “leve” feita durante séculos na Europa, isto é, uma expulsãozinha aqui, uma proibiçãozinha ali, mas depois que o governo ditatorial fosse derrubado as coisas voltariam ao “normal”, como também ocorreu durante séculos. Mas aquela perseguiçãozinha era muito diferente das anteriores, original e maculou seus herdeiros e os sobreviventes.
Mas felizmente Lula não teve essa experiência e, infelizmente o sinal amarelo não acendeu quando em 2006 começaram os ataques contra ele e o PT no mensalão. Não perceberam que os sinais de início do aniquilamento dito pelos empresários mais importantes do país, havia começado.
As principais lideranças do PT foram destruídas, José Dirceu, José Genoíno, Luiz Paulo, para ficarmos apenas nos que ocupavam cargos mais importantes na República, foram presos e suas carreiras destruídas.
O mensalão foi superado porque não atingiu Lula que conseguiu se reeleger com relativa folga, graças ao povo brasileiro que ainda carregava a esperança para vencer o medo no governo que recém começara com as mudanças na economia.
Os bons ventos da economia internacional traziam os alentos e os dólares necessários para impulsionar a nossa esperança, com os preços das comodities na estratosfera, adquirimos reservas internacionais polpudas que garantiriam qualquer solavanco futuro que houvesse no capitalismo, tão fadado a solavancos.
E eles vieram em 2007 com a crise das hipotecas nos EUA que contaminaram todas as economias dos países dos chamados primeiro mundo com uma recessão que lembrava a depressão de 1929. Nos países emergentes a crise do outro lado do Atlântico não chegava e Lula dizia que se tratava de uma marolinha. Superamos aquele momento, mas a crise mundial que inevitavelmente chegaria, chegou em 2014.
A crise política que tem sua origem na eleição de Eduardo Cunha para presidência da Câmara dos Deputados e nas investigações da Lava Jato sobre desvio de recursos da Petrobrás, tem essa origem somente na aparência, pois o real pano de fundo é o mesmo que vemos desde 1954 com a derrubada de Getúlio.
As elites brasileiras não toleram a divisão do poder com os excluídos da vida política que ousam serem incluídos e parte para a sua aniquilação, como um animal que fica à espreita esperando o melhor momento para dar o bote.
E esse momento foi dado com as investigações feitas pelo juiz Sergio Moro na operação Lava Jato. Se na década de 50 e 60 os militares foram os instrumentos para essa perseguição contra excluídos que ousavam ascender, hoje esse papel foi transferido ao judiciário.
Os protagonistas são os mesmos desde aquela época. Os grupos econômicos midiátiocs que lideraram aqueles golpes contra a democracia e os setores populares são os mesmos que capitaneiam esse ataque, agora, contra PT, contra Lula, e contra Dilma.
Ontem tivemos a segunda prisão de Lula. A primeira, no início dos anos 80, quando o metalúrgico ousava liderar a classe operária na reivindicação de seus legítimos direitos políticos e trabalhistas, teve como resposta a prisão por 31 dias.
Ontem, o agora ex presidente que ousou construir uma ponte para o futuro para os excluídos e ousa retornar em 2018 para continuar e sedimentar a sua obra, foi novamente preso, não pelos mesmos intermediários daquela época, mas por seus novos prepostos, agora travestidos da legitimidade do poder judiciário.
Em 24/09/2015 o Estadão publicava um debate ocorrido naquela tarde, em São Paulo, com a presença do juiz Sergio Moro e 600 convidados do LIDE (Grupo de Líderes Empresarias). Naquele evento, quatro empresários questionaram o juiz Sérgio Moro, da Lava Jato, se a prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva era uma ‘questão de tempo’. Moro disse que ‘não fala sobre o que acontece ou não acontece na investigação para o futuro’. Esse questionamento de setores da elite brasileira ocorreu 5 meses antes da segunda prisão.
Portanto, os sinais estavam dados há muito tempo, mas infelizmente a luz amarela não acendeu, seja por estes exemplos, seja pelos exemplos da história de 54 e 64.
Os atores são os mesmos. Sergio Moro, os promotores federais, a polícia federal e agora o novo personagem apresentado ontem, a Receita Federal, são meramente os intermediários da execução da pena de morte, como em 64 foram os militares. Mas os agentes intelectuais, os criminosos que fornecem os elementos materiais para a prisão de Lula e o golpe contra o PT e a democracia que se avizinha, são os mesmos desde aquela época. A elite industrial e financeira brasileira.
O antídoto, como fizeram todos os países no mundo que em um dado momento sofreram a mesma agressão de suas elites, é colocar o povo como ator principal da reação.
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