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Análise Diária de Conjuntura – Edição Manhã – 24/02/2016
Hegel costumava elogiar os jornais, dizendo que eles eram como um “café da manhã de realidade”.
Foi-se o tempo!
Hoje poderíamos dizer que os jornais são um café da manhã de pesadelo e mentiras.
Ao invés de nos facilitar a compreensão da realidade, eles – os jornais – a dificultam. Se há crise, eles a aumentam ou a diminuem, ao sabor de seus interesses políticos. Não dá para disfarçar nem uma crise nem um período de bonança, mas é possível lançar sombras sobre suas origens, causas e consequências. A manipulação dos contextos e das circunstâncias na divulgação de uma notícia econômica gera uma dificuldade enorme de assimilá-la corretamente, sem histerismos catastróficos ou otimismo cego. Não é preciso mentir. A mentira é uma forma rudimentar de manipulação da informação. Os profissionais da mentira sempre souberam que a melhor maneira de veiculá-la é através da meia verdade.
Em se tratando do noticiário político, a coisa é mais fácil, porque se pode apelar para a mentira mais direta e mais pura. Se houver desmentido em seguida, ignore-se, porque a mentira já terá entrado no caldeirão geral, e se convertido em “sentimento”, em “ódio” e não se pode desmentir o ódio.
Esses são os fatores de realidade fantástica. Mas há os fatores propriamente de pesadelo. O principal é a ausência de qualquer esperança.
Nem Dante foi tão cruel com seus leitores. Ao atravessarmos o Inferno, já tínhamos sido avisados, pela inscrição à sua porta, que deveríamos abandonar toda a esperança, mas os dois personagens principais nos mantém atrelados a um constante pensamento positivo. Virgílio, guia do poeta pelos rincões sombrios, não para de transmitir a Dante coragem e serenidade para enfrentar as visões dilacerantes do inferno. E o próprio poeta, ao não perder jamais a sua sensibilidade e compaixão perante os espíritos condenados pelos crimes mais horrendos, nos ajuda igualmente a encarar as imagens brutais do poema. E, sobretudo, o poema se encerra com um belíssimo verso, de esperança:
(…) salimmo su, el primo e io secondo,
tanto ch’i vide de le cose belle
che porta ‘l ciel, per un pertugio tondo;
e quindi uscimmo a riveder le stelle.(…) subimos, ele primeiro eu em segundo,
e pude ver, num relance, as coisas belas
que há no céu, por uma fenda aberta;
e então saímos, a encontrar estrelas.
É um momentos daqueles, portanto, em que o noticiário político adquire de tal maneira a aparência de um bombardeio que nos parece prudente tomar bastante cuidado ao nos aproximar dele.
Há uma famosa frase de Clausewitz, de que a guerra é a continuação da política, por outros meios, que hoje me parece algo estúpida. Guerra é guerra, e a política é, ou deveria ser, o seu oposto.
Digo isso para perguntar: como iremos resolver nossos impasses políticos? Por uma guerra civil?
Não, evidentemente.
Os diferentes atores sociais em conflito deverão, em algum momento, estabelecer um pacto de convivência pacífica, ou mais precisamente, convivência política.
A crise política hoje, por sua vez, reflete a instabilidade estrutural da sociedade brasileira. Em Décadas de Espanto e Uma Apologia Democrática, o professor Wanderley Guilherme dos Santos fala do surgimento da UDN, nascida dessa fusão entre o liberalismo doutrinário e o autoritarismo instrumental, ambos irmanados na mesma hipocrisia e nas mesmas contradições, a saber, de serem liberais apenas pró-forma, mas autoritários em estratégia, em sentimento e, por fim, na práxis.
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Lembrei disso porque a campanha PSDB/Mídia/Alta burocracia estatal apenas repete a velha cantilena golpista que persegue a nossa história política desde a república velha.
Os udenistas contemporâneos, assim como seus ancestrais, não vêem qualquer legitimidade em seus adversários no poder. Com este pensamento, vale tudo para destruí-los. As próprias regras constitucionais tornam-se um estorvo enquanto dificultam este caminho.
Por outro lado, é inegável que o governo Dilma cometeu erros profundos, trágicos. Ainda há tempo de corrigi-los, mas parece faltar disposição.
Desmantelar os conselhos que reuniam empresários, governo, trabalhadores e movimentos sociais foi um desses erros trágicos, porque hoje está evidente que estes conselhos não tinham importância apenas como centro de produção de ideias econômicas, mas sobretudo como um campo de interação ideológica fundamental para que não se criasse a ruptura do debate, como parece ter ocorrido.
Não só eram fundamentais como eram insuficientes. O governo Dilma deveria ter ampliado o seu alcance, e criado mais conselhos de debate, conectando-os de maneira mais direta aos centros de tomadas de decisão, para fazer com que diferentes setores sociais se sentissem corresponsáveis pelas políticas públicas.
Isso deveria ser ligado a construção de um sistema mínimo de comunicação direta entre o Planalto e a população. Dilma fez o contrário. Desmantelou a única coisa que possuía, o programa Café com a Presidenta.
Esvaziando os conselhos, desmantelando canais de comunicação, Dilma criou um vazio de poder que contribuiu de maneira essencial para produzir a crise política atual. Tudo isso já tinha ficado bastante claro em 2013, e se tornou bastante visível em 2014. O processo eleitoral obrigou o governo a criar canais de diálogo, o que ajudou a estabilizar a política e a elevar o prestígio do Planalto.
Mas assim que a vitória eleitoral foi garantida, Dilma novamente voltou à estratégia da não-política, interrompida apenas em momentos de crise aguda, quando a presidenta topa fazer reuniões com um outro grupo de interesse.
O vazio de poder foi ocupado, como era de se esperar.
Com uma oposição fraca, o poder se transferiu naturalmente para setores da burocracia estatal, que assumiram um poder militar de facto. A operação Lava jato, em sua última fase, mobilizou 300 agentes da polícia federal, altamente armados, para prender em casa empresários idosos que sempre se dispuseram a colaborar com a justiça.
A mídia aproveitou a oportunidade, como sempre fez, para montar no cavalo do golpe.
Mudar isso requer, reitere-se, política. Interessa à mídia convocar o espírito de confronto, porque isso justificará o uso de poder militar, hoje em mãos do Judiciário. É preciso estimular a política, através da comunicação, onde os recursos da ironia, da verve, do humor, podem ser usados para desmontar narrativas golpistas.
Dilma, ao que parece, teve coragem para lutar contra a ditadura. Mas não tem para usar um simples “meme”, em suas redes sociais, que possa criticar o autoritarismo, a seletividade, e a desonestidade midiática.
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