por Tadeu Porto, colunista do Cafezinho
Confesso que tento não ligar tanto para a fofoca em si entre o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e a ex-jornalista da Globo, Miriam Dutra. Aliás, a minha parte que se importa, na verdade, é um lado que se manifesta acerca de interesses como o BBB, o tipo de beijo de cada signo, celebridades trocando farpas e afins.
Sempre que sobra um tempinho dou uma espiadela. Acho o maior barato seguir o “Catraca Livre” ou o “Hugo Gloss” no Facebook e saber mais sobre esse tipo de entretenimento (um parênteses pra fazer justiça: o trabalho das páginas é muito mais que simples passatempo e traz a tona debates progressistas que acho essencial. Recomendo).
Bom, voltando ao FHC, a história do affair atrai algum interesse. Parece filme baseado em fatos reais e, por isso, é preciso ter cautela para tratar o assunto, afinal, estamos falando de dois seres humanos que querem (e devem) ter direito a uma vida privada de respeito e não serem objetos de entretenimento.
Contudo, como aquela mão no bolso que vai buscar um ticket de estacionamento e acaba achando dez reais ou aquele pote sem rótulo de sorvete aberto a procura de feijão que, na verdade, tem sorvete mesmo, muitas coisas são descobertas por acaso.
A relação conturbada Mirinando (ou Fernandiriam, não sei qual shippada fica melhor) serviu para corroborar, na realidade, com revelação de uma elo promíscuo entre a mídia tradicional, empresas em paraísos fiscais, políticos e empresários que pertencem à camada social privilegiada.
Claro, a lambança do Moro com o triplex do-Lula-que-não-é-do-Lula já tinha ajudado a trazer a tona alguma desconfiança acerca dos Marinho, por exemplo, e operações como a Zelotes, o Swissleaks e o Fifagate também ajudam a jogar uma luz nas obscuras relações burguesas.
Uma fascinante curiosidade dessa conjuntura é justamente o fato desta elite nacional ter saído as ruas ano passado com tintas guaches verde e amarela traçadas paralelamente na bochecha, como duas retas que se encontram no infinito do combate a corrupção.
As manifestações de março foram tidas como históricas pelos participantes e tem tudo para efetivamente ser, afinal, escancarou o retrato de uma burguesia que desceu do play sem ter a mínima ideia de como brincar.
A nata da sociedade se juntou a demais insatisfeitos (pra mim é muito claro que não tinham somente coxinhas ou corruptos nas manifestações antigoverno) para pedir “mais saúde”, sem nunca ter pisado ou concordado com o SUS, ou “mais educação”, sem questionar professores e estudantes sendo massacrados pela opressão policial.
Cria-se uma situação muito inusitada: a elite luta contra a corrupção sem ter a menor noção das atitudes indecentes que ela mesma pratica, defendendo, no limite da hipocrisia, um sistema de méritos que só existe nos discursos de uma camada social que não mede esforços para aumentar a riqueza que já lhe é abundante.
Assim, nossa nobreza está tão nua quanto o rei do conto “a roupa nova do imperador” do dinamarquês Hans Andersen (dizem por aí que só quem é honesto de verdade, pessoa do bem de raiz, consegue ver os crimes que a presidenta Dilma cometeu).
Figuras políticas que desfilaram nas manifestações estão envolvidas em escândalos que vão desde o superfaturamento de merenda, até doações não declaradas no TSE, passando por manutenção de funcionários fantasmas em gabinetes.
Ademais, os bonecos que inflaram ódio ao Lula e à Dilma, infelizmente acabaram murchando quando o assunto foi o herói da “marcha pela liberdade”, o presidente da câmara, prestes a ser cassado, Eduardo Cunha.
Eu sei, existem muitos exemplos de moralistas sem moral! Se eu fosse pontuar todos, precisaria, provavelmente, de uma coluna diária em uns dez blogs sujos. Mas dentre tantas opções, arrisco dizer (com certa folga) que o caso mais emblemático talvez seja o da família mais rica do país.
Donos de um canal de comunicação que dedicou cobertura integral aos desfiles da nobreza contemporânea – como o do dia 15 de março de 2015 – os Marinhos não só são investigados como exímios sonegadores de impostos, como também possuem uma mansão num paraíso, construída “no peitaço” como brilhantemente apontou o jornalista Fernando Brito.
E como até um naked cake tem cereja, as relações conturbadas dos proprietários da Globo com a política nacional apontam inclusive para “favorzinhos” junto ao BNDES, aquele mesmo banco ideológico que irriga as contas vermelhas de Cuba, Venezuela e Angola.
Uma a uma, algumas figuras presentes no histórico grito de liberdade contra corrupção vão sendo desmascaradas a ponto de esclarecer o óbvio: para acumular renda de maneira tão expressiva e injusta, nossa burguesia explorou, roubou, barganhou, subornou, enfim, corrompeu ou destruiu quem estivesse impedindo a sua passeata rumo a uma vida de privilégios e concentração de capital.
Todavia, lá de longe, assistindo ao nobre desfile, parece que alguma coisa se mexeu, levantou a cabeça, apertou os olhos, franziu a testa e soltou a garganta para dizer:
“Ei, mas péra aí… A elite está nua!”
E como está!
Tadeu Porto é Diretor do Sindicato dos Petroleiros do Norte Fluminense (Sindipetro-NF)