Ilustrações por Ole Tillmann
por Ken Silverstein, na Vice Brasil | Tradução: Marina Schnoor
O propósito de uma empresa de fachada é que o dinheiro colocado nela não possa ser rastreado até o dono. Digamos, por exemplo, que você seja um ditador que quer financiar o terrorismo, aceitar suborno ou roubar o tesouro de sua nação. Uma empresa de fachada é uma entidade falsa que te permite guardar e movimentar dinheiro sob um nome corporativo sem que a lei internacional ou as autoridades tributárias saibam que ela é sua. Assim que o dinheiro estiver disfarçado como ativos de um empreendimento – tipicamente feito por um advogado de confiança ou de compadrio num paraíso fiscal sigiloso –, você vai poder gastá-lo ou usá-lo para propósitos nefastos. É essa a definição de lavagem de dinheiro: pegar dinheiro sujo e torná-lo limpo. E empresas de fachada tornam isso possível. Elas são como “o carro de fuga de assaltantes de bancos”, diz o ex-investigador de assuntos alfandegários dos EUA Keith Prager.
Às vezes, no entanto, investigadores internacionais conseguem rastrear o dinheiro. Como no caso de Rami Makhlouf, o mais rico e poderoso empresário da Síria. Muitos acreditam que Makhlouf é um “bagman” (uma pessoa que coleta e gerencia dinheiro sujo) do presidente Bashar Al-Assad, que, durante os últimos três anos, ajudou a causar a morte de mais de 200 mil sírios na guerra civil do país.
Além de Assad, poucas pessoas são mais odiadas na Síria do que Makhlouf. Ele é primo do presidente e irmão do chefe da inteligência síria. Usando essas conexões, esse empresário construiu uma rede de negócios que se espalha por telecomunicações, empresas de energia e bancos: aos 40 anos, já tinha acumulado uma fortuna estimada em bilhões de dólares. Quando o levante contra o regime começou em 2011, manifestantes incendiaram uma filial de sua empresa de telefonia móvel aos gritos de “Makhlouf é um ladrão!”.
Em 2006, a revista britânica New Statesmen disse que “nenhuma companhia estrangeira consegue fazer negócio na Síria sem a aprovação e envolvimento de Makhlouf”. Um documento sigiloso da Embaixada Americana em Damasco, divulgada pelo WikiLeaks, o descrevia como “o garoto da capa da corrupção na Síria”. No mesmo ano, o Departamento do Tesouro americano proibiu que companhias dos EUA fizessem negócios com Makhlouf, dizendo que ele tinha “construído seu império comercial explorando suas relações com membros do regime sírio” e “usado oficiais da inteligência para intimidar os concorrentes”.
Quando a guerra civil na Síria começou em 2011 e as forças de segurança do Estado começaram a apagar os oponentes de Assad, os EUA e a União Europeia colocaram Makhlouf na lista dos comparsas do regime cujos ativos internacionais deveriam ser rastreados e congelados, porque, segundo o Departamento do Tesouro, ele tinha ficado rico subornando e “incentivando a corrupção pública de oficiais do regime sírio”.
Se ele fosse um assaltante de banco, seu carro de fuga seria uma empresa chamada Drex Technologies S.A. Em julho de 2012, o Departamento do Tesouro identificou a Drex (uma entidade fictícia com endereço nas Ilhas Virgens Britânicas) como um veículo corporativo controlado secretamente por Makhlouf e usado “para facilitar e gerenciar suas participações financeiras internacionais”. Em outras palavras, digamos que ele tivesse abocanhado alguns milhões de dólares de um acordo empresarial secreto com um oficial corrupto sírio. Ele não colocaria esse dinheiro num banco, onde a quantia poderia ser ligada a ele; em vez disso, canalizaria isso através da Drex para que o dinheiro não pudesse ser rastreado.
No final de outubro, obtive vários documentos sobre a Drex do escritório de registro de negócios das Ilhas Virgens Britânicas. Os registros revelam muito pouco – o nome de Makhlouf, por exemplo, não aparece em parte alguma. Foi só quando a guerra civil síria desencadeou uma investigação internacional para tentar rastrear e congelar os ativos do empresário e de outros bandidos de Assad que o Departamento do Tesouro dos EUA descobriu que ele controlava a companhia e era seu dono, diretor e acionista. Mas quando o departamento fez isso, já era tarde: a empresa tinha desaparecido dos registros corporativos das Ilhas Virgens Britânicas. Em outras palavras, a Drex Technologies S.A. era um veículo para esconder atividades financeiras escusas de Makhlouf; antes de ser descoberto, o empresário sírio teve muito tempo para mudar suas operações e ativos para outro paraíso fiscal.
“No mundo, há várias firmas competidoras, e muitas delas registram empresas de fachada tão sujas quando a Drex.”
Mas quem torna essas entidades possíveis? Para conduzir negócios, empresas de fachada como a Drex precisam de um agente registrado – às vezes, de um advogado que preencha os documentos exigidos e cujo escritório sirva de endereço de fachada. O processo cria uma camada entre a empresa de fachada e seu dono, especialmente se a companhia fictícia estiver num paraíso fiscal, onde informações sobre os donos ficam atrás de um muro impermeável de leis e regulamentos. No caso de Makhlouf – e, segundo descobri, no caso de vários outros negócios escusos –, a organização que ajudou a incorporar essa companhia de fachada e a protegeu do escrutínio internacional foi uma firma de Direito chamada Mossack Fonseca, que serviu como agente de registro da Drex de 4 de julho de 2000 até o final de 2011.
A organização foi fundada no Panamá em 1977 pelo alemão Jurgen Mossack e por um panamenho chamado Ramón Fonseca, vice-presidente do atual partido no comando do país; mais tarde, acrescentou-se um terceiro diretor, o advogado suíço Christoph Zollinger. Desde os anos 70, a firma expandiu suas operações e agora trabalha com escritórios afiliados em 44 países, incluindo Bahamas, Chipre, Hong Kong, Suíça, Brasil, Jersey, Luxemburgo, Ilhas Virgens Britânicas e – talvez o que seja mais problemático – os seguintes Estados dos EUA: Wyoming, Flórida e Nevada.
A Mossack Fonseca, claro, não é a única a estabelecer empresas de fachada usadas pelos bandidos do mundo. Pelo globo, existem várias firmas competidoras, muitas delas registrando empresas de fachada tão escusas quanto a Drex. Por exemplo, no caso de Viktor Bout, que, nos anos 90, vendia armas para o Talibã através de uma empresa de fachada registrada em Delaware. Mais recentemente, em 2010, um homem chamado Khalid Ouazzani se declarou culpado de usar uma empresa de Kansas City, Missouri; chamada Truman Used Auto Parts, ela movimentava dinheiro para a Al-Qaeda.
Notícias dispersas e investigações internacionais apontam a Mossack Fonseca como uma das criadoras de empresas de fachada de maior alcance no mundo, mas, até agora, ela tinha usado vários truques legais e de contabilidade para que a Mossack e seus clientes voassem abaixo do radar.
(A firma contesta essa afirmação e garantiu num e-mail que “não há tribunal ou registro do governo que tenha identificado a Mossack Fonseca como criadora de empresas ‘de fachada’. Qualquer coisa que ligue nosso grupo a ‘atividades criminosa’ é infundada e, por isso, nunca fomos realmente notificados da existência de nenhum procedimento legal… até agora”.)
Mas um ano inteiro de investigações revelou que a Mossack Fonseca – descrita pela Economist como um líder impressionantemente “discreto” da indústria de finanças de fachada – tem servido como agente de registro para companhias ligadas a uma variedade de mafiosos e ladrões notórios cuja associação, além de Makhlouf, já se estendeu a Muammar Gaddafi e Robert Mugabe, bem como a um bilionário israelense que tem saqueado um dos países mais pobres da África e um oligarca chamado Lázaro Báez, que, de acordo com registro dos tribunais dos EUA e relatórios de um procurador federal da Argentina, teria lavado dezenas de milhões de dólares através de uma rede de empresas de fachada, algumas das quais a Mossack Fonseca ajudou a registrar em Las Vegas.
Documentos e entrevistas que conduzi também mostraram que a Mossack Fonseca fica feliz em ajudar seus clientes a montar essas empresas, que são o vinho vintage do negócio da lavagem de dinheiro: odiadas pelas agências da lei e amadas por vigaristas, porque “envelhecem” por anos antes de serem vendidas, elas parecem ser corporações estabelecidas com registros sólidos – e tem ramos também em Las Vegas. Um gerente internacional de ativos me disse que Mossack Fonseca ofereceu a venda de uma empresa de fachada de 50 anos a ele por US$ 100 mil.
Se empresas de fachada são os carros de fuga de assaltantes de banco, então, a Mossack Fonseca provavelmente é a concessionária de carros mais suja do mundo.
Em março passado, viajei para o Panamá, o lar da Mossack Fonseca. Victor, um jornalista local, me mostrou a cidade; os campos de golfe de luxo e as mansões na Zona do Canal; os prédios sombrios de apartamentos na favela El Chorrillo e os arranha-céus do distrito empresarial central. Na época da minha visita, o Panamá estava se preparando para as eleições nacionais, e cartazes de políticos cobriam todo poste telefônico e muro da cidade. “Este cara é um cuzão”, Victor me explicou enquanto dirigia, apontando para um outdoor de um candidato da Assembleia Nacional que, segundo ele, estava ligado ao tráfico de drogas local. “Bom, são todos cuzões. Mas esse é um verdadeiro cuzão.”
O Panamá vem sendo governado por cuzões há mais de um século. Em 1903, a administração Theodore Roosevelt criou o país depois de pressionar a Colômbia para entregar o que era, então, a província do Panamá. Roosevelt agiu sob ordens de vários grupos bancários, entre eles a J. P. Morgan & Co., apontada como o “agente fiscal” oficial do país, pois estava encarregada de administrar os US$ 10 milhões de auxílio que os EUA injetaram na nação.
Os bancos americanos ajudaram a transformar o Panamá num centro financeiro: assim, o país emergiu como um paraíso fiscal e de lavagem de dinheiro nos anos 70 depois de o governo aprovar algumas das leis de sigilo financeiro mais restritas do mundo. Provavelmente foi isso que encorajou a Mossack Fonseca a se estabelecer ali em 1977. As leis de sigilo financeiro não só prometem confidencialidade aos investidores estrangeiros – elas proíbem os bancos de liberar qualquer informação sobre os clientes, a não ser a mando de um tribunal em casos que envolvam terrorismo, tráfico de drogas e outras ofensas sérias (evasão fiscal foi especialmente excluída dessa categoria). Essas leis atraíram toda uma linhagem de vigaristas e ditadores, que usaram o Panamá para esconder seus fundos roubados, incluindo Ferdinand Marcos, “Baby Doc” Duvalier e Augusto Pinochet.
Quando Manuel Noriega, comandante das Forças de Defesa do Panamá, tomou o poder em 1983, ele essencialmente nacionalizou o negócio de lavagem de dinheiro, fazendo uma parceria com o cartel de Medellín e dando carta branca ao grupo para atuar no país. Noriega apoiava a política externa americana na região – e, por anos, esteve na lista de pagamento da CIA –, mas os EUA perderam a paciência quando ele se opôs aos esforços americanos para derrubar o governo sandinista da vizinha Nicarágua. Essa foi uma das razões para a invasão do Panamá em 1989, o que fez Noriega ser deposto e o poder devolvido às antigas elites bancárias, os herdeiros do legado J.P. Morgan.
O novo governo do presidente Guillermo Endara, um advogado corporativo empossado numa base militar americana algumas horas depois de a invasão começar, em 20 de dezembro de 1989, oferecia um rosto mais gentil que o regime de Noriega. Mas, desde então, ele e seus sucessores democraticamente eleitos fizeram muito pouco para abordar os problemas mais óbvios do país: a corrupção e a pobreza. Um relatório recente do governo americano diz que o Panamá é “atormentado” por fraudes e evasão de impostos internacional, o que gera “grandes fontes de fundos ilícitos”.
“Em qualquer firma de advocacia da cidade, da menor à maior, você pode abrir uma empresa de fachada sem ter de responder perguntas.”
Hoje, as leis de finanças do Panamá continuam extremamente relaxadas. Empresas estrangeiras podem trazer somas ilimitadas para o país sem pagar impostos. Um relatório do Fundo Monetário Internacional do começo do ano afirma que, dos 40 passos recomendados para combater lavagem de dinheiro e financiamento do terrorismo, o Panamá implementou completamente apenas um. Em setembro, o New York Times informou que comparsas do presidente russo Vladimir Putin tinham canalizado dinheiro através de estruturas de fachada registradas no Panamá.
“Quando se trata de lavagem de dinheiro, oferecemos serviço completo: lavagem, enxágue e secagem”, disse Miguel Antonio Bernal, um importante advogado e analista político local. “Você pode ir a qualquer firma de advocacia da cidade, da menor à maior, e abrir uma empresa sem ter de responder perguntas.”
Na Cidade do Panamá, eu estava confortavelmente instalado numa suíte no 16º andar do hotel Waldorf Astoria, uma torre espelhada com vista panorâmica para a Baía do Panamá. Eu tinha agendado minha chegada para coincidir com uma conferência de dois dias no hotel, um evento com 70 consultores financeiros internacionais dos uber-ricos – indivíduos high-net-worth, na linguagem financeira industrial –, e descobri que um dos palestrantes era Ramses Owens, um advogado e especialista financeiro que já trabalhou para a Mossack Fonseca.
No meu segundo dia no país, acordei, ergui a cabeça do travesseiro de plumas da minha cama king size, me levantei, me vesti e tomei o elevador até o local da conferência: o Salão Diamante do hotel.
Apesar de o evento ser fechado, dei um jeito de me infiltrar e conseguir uma lista dos participantes e cópias das palestras e apresentações. Sentados em mesas com jarras de água gelada e vasos com flores, os participantes eram, na grande maioria, homens de meia-idade, de cabelo grisalho e pança, vestidos em ternos escuros que seriam insuportáveis no calor das ruas da Cidade do Panamá, mas perfeitos para o Salão Diamante, agradavelmente resfriado pelo ar-condicionado ligado no máximo.
Essas pessoas eram advogados fiscais corporativos, contadores, banqueiros e administradores de fundos, todos encarando um pequeno palco com um pódio para os palestrantes e uma tela mostrando apresentações em PowerPoint. Cerca de metade dos participantes eram panamenhos; um quarto deles, dos EUA, Europa e América do Sul; o outro quarto, de paraísos fiscais tradicionais, como as ilhas Turcas e Caicos, Bahamas, Santa Lúcia e Belize. “Gente realmente má”, me contou Jack Blum, ex-investigador do Senado americano e advogado de Washington especializado em lavagem de dinheiro, antes da minha viagem. “E eles querem aprender a ser ainda piores.”
“Eu vi você aí bancando o Cavaleiro Solitário”, me falou Edward Brendan Lynch, um corado consultor financeiro, que atua nas Bahamas, durante o coffee break. Eu estava sentado no bar espionando os participantes, e ele esperava seu uísque on the rocks. “De onde você é?”
Quando disse que era de Washington, Lynch, que parecia o Thurston Howell III do A Ilha dos Birutas, me disse que tinha visitado a cidade muitos anos atrás. “Vi as cerejeiras florirem”, ele relembrou. “Almocei no Jockey Club. Um lugar agradabilíssimo.”
“Estima-se que americanos detenham mais de US$ 1 trilhão em paraísos fiscais, com perdas anuais de US$ 100 bilhões apenas em imposto de renda.”
De volta ao Salão Diamante, Ramses Owens subiu ao pódio. Vestido imaculadamente e com o cabelo repartido de maneira perfeita, ele encarnava a banalidade do mal financeiro moderno. Anunciado no programa da conferência como um mestre do “planejamento de impostos”, ele brincou com o público dizendo que preferia descrever seu trabalho como “otimização de ativos”.
Quando trabalhou na Mossack Fonseca, Owens direcionava seu conhecimento para as vantagens competitivas de incorporar empresas da ilha Niue, no Sul do Pacífico. Em 1996, a firma ganhou direitos exclusivos para a criação de empresas na ilha; em quatro ano, 6 mil delas já estava registradas lá, algumas supostamente controladas por sindicatos do crime do Leste Europeu e cartéis de drogas internacionais, de acordo com investigadores. A descoberta disso levou a sanções internacionais em 2001 que forçaram a ilha a fechar seu negócio de registro de empresas cinco anos mais tarde. Aí, a Mossack Fonseca transformou limões em limonada para seus clientes, transferindo as contas de Niue para outros paraísos fiscais, incluindo Samoa e – conforme revelado por documentos que a Mossack Fonseca foi obrigada a entregar – o Estado americano de Nevada. (Não há provas de que as empresas transferidas estavam envolvidas em atividades criminosas apesar das identidades dos donos continuarem desconhecidas.)
A repressão em Niue foi parte de um grande esforço internacional conduzido pelos EUA, Inglaterra e outras nações ocidentais. Originalmente desencadeada por preocupações com o terrorismo e o crime organizado, a iniciativa se intensificou recentemente devido a uma hemorragia de déficit que tem aumentado graças à evasão fiscal generalizada. Estima-se que americanos detenham mais de US$ 1 trilhão em paraísos fiscais, com perdas anuais de US$ 100 bilhões apenas em imposto de renda. Em 2010, o governo aprovou a Foreign Account Tax Compliance Act depois de multar a gigante suíça UBS em US$ 780 milhões por ajudar milhares de americanos a esconder seus ativos (em um caso, um banqueiro da UBS contrabandeou diamantes de um cliente pela fronteira num tubo de pasta de dente). A FATCA, que está sendo implementada em etapas e cuja ativação completa tem sido retardada devido à oposição feroz da indústria financeira, já exige que bancos estrangeiros notifiquem a Receita Federal americana sobre contas abertas por contribuintes americanos.
Naturalmente, a FATCA era uma preocupação para as pessoas presentes no Salão Diamante – entre elas, Marie Fucci, consultora de clientes americanos e europeus que denunciou a nova lei como um “apartheid” financeiro –, mas Owens procurou acalmar esses temores. Enquanto clicava no PowerPoint para mostrar slides com imagens de cofres de bancos, pilhas de notas de US$ 100 e outras fotos de estoque de pornô financeiro, ele destacou maneiras de evitar regulamentações internacionais onerosas e irritantes. A FATCA, ele assegurou confiante, não ia derrubar o sistema dos paraísos fiscais, menos ainda no Panamá, onde advogados, consultores e outros facilitadores têm poderosos aliados políticos (como o ministro das finanças do país na época, que também palestrou no evento). Owens estimou que nove em dez entidades financeiras registradas no país eram de propriedade estrangeira e disse que fundações privadas panamenhas – uma criação local que, no mundo dos paraísos fiscais, é tão amada quanto a tradicional conta na Suíça – ainda conseguiriam reter dinheiro anonimamente, mesmo quando a FATCA estivesse totalmente implementada. O público balançou as cabeças em aprovação.
Na manhã seguinte ao discurso de Owens, fui até o escritório da Mossack Fonseca. Eu não esperava encontrar ninguém da firma, já que tinha feito vários pedidos de entrevista educada mas firmemente negados. “Decidimos não participar dessa entrevista”, me explicou a porta-voz Lexa de Wittgreen num e-mail curto, provando que a Mossack Fonseca consegue ser diligente – pelo menos com jornalistas.
Eu estava usando um mapa do hotel e logo me perdi no distrito comercial movimentado da Cidade do Panamá, que lembra uma Hong Kong tropical em miniatura. Olhando em volta a fim de me orientar, vi um jovem de calça escura e camisa de risca de giz verde sair de um prédio comercial (o Edifício Omega) e entrar numa picape Mitsubishi Sportero preta.
“Não é longe”, ele me contou, num inglês perfeito, quando perguntei se ele sabia onde ficava o prédio da Mossack Fonseca. “Você tem uma reunião marcada com eles? Porque faço um trabalho similar ao deles e posso te ajudar.” Ele tirou um cartão de visitas do bolso e me entregou com um sorriso de orelha a orelha.
Por coincidência, ele era Alejandro Watson Jr., da Owens & Watson, empresa na qual Ramses Owens é sócio. “Eu trabalho ali”, ele frisou, apontando para um escritório no segundo andar do prédio. “Estou atrasado para uma reunião, mas posso falar com você mais tarde hoje ou te levar agora e apresentar um dos meus colegas.”
Antes da minha viagem, fiquei imaginando se conseguiria contatar uma firma de direito local para testar a facilidade de abrir uma empresa de fachada. Essa era uma boa oportunidade para colocar isso em prática.
“Vim dos EUA para ver uma propriedade aqui”, menti enquanto nos misturávamos ao tráfego. “Preciso abrir uma empresa para fazer a compra. Que tipo de informação você precisa?”
“Só preciso do seu passaporte, carteira de motorista, algo que tenha seu endereço e uma carta de qualquer banco”, destacou Watson. “Não pedimos informações do seu negócio. Só queremos te ajudar a fechar o acordo para que você continue trabalhando com a gente.”
“Meu nome precisa aparecer no documento?”, perguntei.
Achei que minha franqueza desencadearia pelo menos uma leve desconfiança – afinal de contas, foi essa mesma promessa de anonimato que atraiu todos os clientes desonestos para Niue quando o atual patrão de Watson trabalhava para a Mossack Fonseca. Mas ele continuou com a mesma empolgação. “Você tem o problema da FATCA”, Watson pontuou com um sorriso. “Podemos contornar isso. Recomendo que você abra um fundo, porque isso pode ser de propriedade de qualquer outra pessoa.”
Perguntei se eu poderia abrir uma conta bancária para minha empresa de fachada para ter acesso ao dinheiro. Afinal de contas, qual a vantagem de escondê-lo num paraíso fiscal se você não puder gastá-lo?
“Claro”, devolveu Watson, entusiasmado. Ele puxou uma brochura de uma pasta colocada entre os assentos do carro. “Temos uma rede global de bancos”, contou, apontando uma página que listava algumas dezenas de instituições financeiras com que sua firma trabalhava.
A rede incluía bancos pequenos em países e repúblicas como Panamá, Ilhas Caimã, Mônaco e Andorra até nomes como HSBC, além dos traficantes de diamantes da UBS. Um relatório de um comitê do Senado americano descreve essa última instituição como um grande condutor para “chefões do tráfico e nações párias”; no ano passado, o banco assinou um acordo de US$ 1,92 bilhão com o Departamento de Justiça depois de admitir ter lavado milhões de dólares através de empresas de fachada para cartéis colombianos e mexicanos. Havia até um componente americano na rede da Owens & Watson: o Helm Bank, em Miami. Em 2012, reguladores americanos deram uma ordem de consentimento ao Helm por várias violações do Bank Secrecy Act e das leis contra lavagem de dinheiro.
Era uma lista que inspirava confiança – pelo menos, se eu fosse um vigarista querendo esconder meu dinheiro da Receita Federal ou das agências da lei.
O processo levava apenas alguns dias e, segundo Watson, os custos seriam desprezíveis: cerca de US$ 1.200 para incorporar minha empresa de fachada, US$ 300 para cobrir os impostos do governo e algumas centenas a mais para que a Owens & Watson fornecesse os diretores, se necessário. Se eu quisesse comprar uma empresa de fachada do tipo envelhecida, isso custaria um pouco mais.
“E meu nome não vai aparecer em nenhum lugar, certo?”, perguntei, decidindo que devia pressionar o máximo possível.
“Não, não, não”, exclamou Watson. “Isso não é problema.”
Logo depois da minha conversa com Watson, me vi em frente ao escritório da Mossack Fonseca. Ele ocupa três dos quatro andares de um prédio envidraçado, com uma clínica dentária no térreo. Eu esperava conseguir entrar no prédio, mas abandonei a ideia quando vi um segurança na entrada barrando visitantes.
Achei que pelo menos conseguiria fotografar o edifício, cujo exterior envidraçado refletia a monumental Revolution Tower, um prédio comercial horrível em forma de saca-rolhas. Mas parece que os seguranças da Mossack Fonseca guardam o prédio com o mesmo zelo com que a firma protege a identidade de seus clientes. “Ele está tirando uma foto!”, gritou uma mulher, que voltava para o prédio com uma sacola de restaurante, quando me viu erguer meu celular. Ela gritou de novo e apontou para mim. “Ele está tirando uma foto!”
Depois disso, decidi tentar minha sorte em Las Vegas. A Mossack Fonseca descreve Nevada como “uma das melhores jurisdições” dos EUA para montar uma empresa graças a “versatilidade, baixos custos e serviço rápido” do Estado. O país é um ótimo lugar para a Mossack Fonseca fazer negócio, já que esse é o segundo lugar mais fácil do mundo para se montar uma empresa de fachada – atrás apenas do Quênia –, de acordo com um grupo chamado Global Financial Integrity. E vigaristas adoram registrar empresas aqui, porque ter uma empresa americana fornece um brilho falso de respeitabilidade, o que ajuda a desviar a atenção de suas ações criminosas, segundo me disse Heather Lowe, a diretora de assuntos governamentais do grupo.
Desde que a Mossack Fonseca começou a oferecer serviços no Estado mais de dez anos atrás, ela tem usado uma firma local chamada MF Corporate Services para registrar mais de mil empresas em Nevada, a maioria gerenciada de paraísos fiscais como Genebra, Bangkok e as Ilhas Virgens Britânicas, de acordo com os documentos da Secretaria do Estado. Segundo a lei de Nevada, os únicos nomes que devem aparecer nos registros públicos de uma empresa são de um agente residente e de um “gerente”, e nenhum deles precisa ser um ser humano. O agente residente é tipicamente a companhia que registra a empresa de fachada, e o gerente pode ser outra companhia anônima. Isso torna quase impossível descobrir quem realmente controla uma empresa de fachada em Nevada, a menos que agências da lei e tribunais exijam a divulgação de informações. Tecnicamente, a MF Corporate Services é independente da Mossack Fonseca. Mas, na prática, registros de incorporação e outros documentos confidenciais mostram suas funções como uma filial local da Mossack Fonseca, com os principais empregados respondendo diretamente às ordens vindas da Cidade do Panamá. Essa separação falsa é uma tática empregada por muitos incorporadores de empresas de fachada, porque permite que a empresa-mãe negue qualquer conexão com seu escritório local se a merda chegar ao ventilador, falando de um ponto de vista legal. É mais ou menos como o Walmart deve operar em Bangladesh, se distanciando das fábricas clandestinas por uma longa e complexa cadeia de abastecimento. (Como o Walmart, a Mossack Fonseca nunca foi diretamente processada por ações de suas afiliadas.) “Essas são organizações verticalmente integradas de cima para baixo até o minuto em que um policial ou investigador aparece”, explica Jack Blum, especialista em lavagem de dinheiro. “Aí, elas se desintegram numa série de entidades não conectadas e todo mundo jura que não sabe nada sobre o sistema. É como um castelo de cartas que está montado, mas que desmorona de repente quando alguém começa a investigar.”
De fato, é exatamente assim que a Mossack Fonseca tem respondido quando questionada sobre as atividades escusas ligadas a ela em Las Vegas. Mesmo sendo impossível saber precisamente quem está por trás da maioria das empresas de fachada que a firma vem ajudando a criar ali, uma investigação em andamento na Argentina e um caso da Corte Distrital de Nevada envolvendo o oligarca Lázaro Báez oferecem uma ideia. A investigação e registros judiciais alegam que Báez é o dono secreto de mais de 100 empresas de fachada que a Mossack Fonseca ajudou a estabelecer em Nevada. Todas são gerenciadas pela Aldyne Ltd., uma companhia anônima que a Mossack Fonseca registrou nas Ilhas Seychelles, segundo os procuradores. (A Mossack Fonseca não foi acusada até agora nem na Argentina nem em Nevada, mas um de seus agentes em Las Vegas foi destituído no caso legal e o tribunal distrital pediu que a firma entregasse registros relacionados às empresas de Báez, uma ordem que ela se negou a obedecer completamente.)
Ex-bancário, Báez construiu um vasto império através de contratos ganhos por seus amigos Cristina e Néstor Kirchner, a atual e o ex-presidente da Argentina, além de outros aliados políticos, de acordo com reportagens e investigações internacionais. Báez ficou tão sentido com a morte de seu patrono Néstor, em 2010, que ergueu um mausoléu de três andares para seu corpo. Procuradores alegam que as empresas de fachada de Nevada são parte de uma rede que Báez usa para mover mais de US$ 65 milhões em fundos desviados de projetos de infraestrutura pública.
As empresas ligadas a Báez em Nevada foram registradas pela MF Corporate Services, cuja gerente, Patricia Amunategui, seguindo ordens do quartel-general da Mossack Fonseca, também atua como secretária da Aldyne Ltd., de acordo com uma fonte próxima da questão. Quando questionada sobre as atividades ilegais de empresas clientes no passado, a resposta da Mossack Fonseca foi me lembrar por e-mail que “agentes registrados não são, de forma alguma, responsáveis pelas transações ou qualquer outro negócio das companhias que incorporam”. De sua parte, Amunategui (uma chilena que anteriormente trabalhava como garçonete num cassino e que, pelo que vi em sua página no Facebook, gosta de ioga, espiritualismo, caminhadas, o Dalai Lama, o Tea Party e o ex-ditador chileno Augusto Pinochet) afirma que a MF Corporate Services “não tem, nem nunca teve, nenhum relacionamento com Lázaro Báez”. Ela também assevera não ter nenhum vínculo empregatício com a Mossack Fonseca, mesmo tendo dado um testemunho para um catálogo da Universidade de Las Vegas, logo depois de se formar, dizendo que “conseguiu um ótimo emprego como vice-presidente da Mossack Fonseca, uma firma de direito internacional”. (Ela alega que foi citada incorretamente.) Amunategui era a pessoa que eu mais queria encontrar quando fui a Las Vegas no começo de novembro.
“Seu carro está na vaga B-15”, me disse a funcionária da Avis no Aeroporto Internacional McCarran. “B de bordel.”
O rosto dela não continha nenhuma expressão; então, fiquei na dúvida se deveria me sentir insultado ou meramente divertido. Mas eu tinha viajado um dia inteiro, desde Washington, em dois longos voos na classe econômica, então, não estava dando a mínima para nada naquele ponto. Era bom ter finalmente pousado em Las Vegas, mesmo num aeroporto batizado em homenagem a Pat McCarran, o político antissemita e amante de cassinos que supostamente teria inspirado o senador corrupto de Nevada de O Poderoso Chefão II.
“Nevada se tornou o quartel-general de vários esquemas Ponzi, de evasão fiscal e de criminosos corporativos e estelionatários da internet.”
Em 2001, os legisladores consideraram aprovar uma lei que ia encorajar empresas a se incorporar no Estado, as protegendo de leis de divulgação e responsabilidade. “Estamos segurando um cartaz que diz: ‘Bem-vindos, canalhas e golpistas'”, disse a então senadora Dona Titus durante o debate da lei, que, segundo os apoiadores, traria uma receita muito necessária ao Estado.
Titus, que hoje atua na Câmara dos Representantes dos EUA, acabou bizarramente votando “Sim” e viu sua profecia se realizar completamente. Alguns anos depois, Nevada se tornou o quartel-general de vários esquemas Ponzi, de evasão fiscal e de criminosos corporativos e estelionatários da internet. Entre eles, Donald McGhan, que, em 2009, recebeu uma sentença de dez anos por fraudar investidores em quase US$ 100 milhões através de um golpe imobiliário com a empresa Southwest Exchange; e o empreiteiro de defesa Mitchel Wade, que usou uma empresa de fachada registrada em Nevada para canalizar suborno para o então congressista Randy Cunningham. (Os dois foram pegos durante um almoço em que Cunningham diagramou, em seu próprio material de escritório do Congresso, uma lista fatal de subornos que ele tinha recebido de Wade e os contratos federais correspondentes.)
O site da Secretaria do Estado oferece várias razões para incorporar sua empresa em Nevada, alardeando a inexistência de imposto de renda e uma quase impossibilidade de se perfurar o “véu corporativo”. Essas coisas ajudaram a atrair cerca de 300 mil empresas ativas para o Estado, uma para cada nove residentes, gerando uma receita de US$ 133 milhões só em 2012. E como boa parte dessa atividade é ilegal, o secretário-adjunto do Estado, Scott Anderson, diz que seu gabinete tomou vários passos para acabar com os abusos, incluindo uma lei que proíbe a criação de uma empresa para cometer um crime. “Mas, claro, se alguém está fazendo algo ilegal”, admitiu Anderson, “a pessoa provavelmente não vai divulgar isso”.
No primeiro dia da minha viagem, entrevistei Cort Christie, chefe do Nevada Corporate Headquarters, uma das incorporadoras mais prolíficas do Estado. Sua companhia fica num prédio enorme e estéril numa área chamada Spring Valley. Christie é ex-membro da diretoria da poderosa e politicamente bem conectada Nevada Registered Agent Association (a MF Corporate Services é um dos membros), que “está trabalhando para assegurar o futuro do Estado como um centro de incorporações nos EUA”, de acordo com o site do grupo. Ele alertou que, se “o ambiente atual de benefícios fiscais se perder, a reputação do Estado… também se perderá. Quando a confiança do público é danificada, ela não pode ser reparada facilmente”.
Ano passado, a NRAA fez lobby contra uma proposta da Secretaria de Nevada que teria reforçado leis que desencorajam o sigilo corporativo. A lei, que, segundo Christie, “teria diminuído a aparência de que qualquer um pode chegar aqui e se esconder”, foi esmagadoramente rejeitada.
Na manhã de 4 de novembro, desci a S. Casino Center Boulevard, no centro de Las Vegas, passando pelo Golden Nugget, o El Cortez (o cassino original da máfia) e pela maior concentração de restaurantes oferecendo costeletas prime por US$ 9,99. Aí peguei a Interstate 15 na direção sul até Henderson, um subúrbio onde shoppings gigantes dão lugar a um borrão infinito de casas de estuque branco. A MF Corporate Services se situa no Parc Place Complex, lar de muitos prédios térreos idênticos cobertos por telhas vermelhas. Havia poucos carros no estacionamento, e não vi ninguém do lado de fora. Um letreiro de metal vermelho e branco, onde se lia MF Corporate Services, plantado entre pedras e cactos, balançava com a brisa morna.
Até onde entendi pelos registros públicos e documentos legais, a MF Corporate Services tem o único propósito de criar empresas de fachada no Estado para clientes da Mossack Fonseca – e a sede distante não ajudava a dispersar essa impressão. Amunategui comanda as operações cotidianas: documentos da companhia que encontrei em registros de tribunal mostram que ela trabalha diretamente com os empregados da Mossack Fonseca no Panamá, gente como Leticia Montoya, a guardiã de registros de dezenas de empresas de fachada ligadas a Lázaro Báez.
Montoya tem uma carreira e tanto, tendo anteriormente registrado ou servido como diretora nominal para pelo menos seis companhias anônimas envolvidas em grandes escândalos de corrupção internacional. Entre eles, o caso de uma empresa de fachada panamenha chamada Nicstate, que tinha como um dos donos o presidente na Nicarágua, Arnoldo Alemán. Ele usou a Nicstate e outros veículos para desviar aproximadamente US$ 100 milhões em fundos do país para o próprio bolso. Montoya também ajudou a montar a Mirror Development Inc., usada pela Siemens da Alemanha para canalizar subornos para oficiais do governo argentino, que ajudou a empresa alemã a vencer um contrato de US$ 1 bilhão para produzir os cartões de identidade do país. Esse era apenas um componente do esquema global da Siemens, que usou o mesmo esquema para pagar oficiais do governo em Bangladesh, Venezuela e Iraque, sendo um dos beneficiados Saddam Hussein.
Achei que minha melhor chance de conversar com Amunategui seria aparecendo inesperadamente. Quando bati na porta de vidro da MF Corporate Services, um homem segurando uma prancheta, sentado numa cadeira azul posicionada aleatoriamente no hall do escritório, acenou para mim. Um saco de lixo branco cheio de documentos picados estava do lado da porta e um mapa-múndi enquadrado estava pendurado na parede. Acima dele, quatro relógios mostravam as horas em Las Vegas, Hong Kong, Suíça e Panamá.
O homem da cadeira azul – que era apenas um chaveiro – ligou para Amunategui quando pedi para falar com ela, e ela saiu de uma das salas no fundo do prédio. Ela tinha um rosto sardento e usava o cabelo castanho preso num coque. Ela franziu a testa suavemente e se recusou a falar quando eu disse que era um jornalista interessado no trabalho da MF Corporate Services para Báez. “Me dê seu nome, depois vejo se nosso advogado pode falar com você”, ela respondeu.
“O advogado da Mossack Fonseca?”, perguntei.
“Não, o advogado da minha companhia”, ela devolveu, se referindo à MF Corporate Services. “São duas empresas separadas.”
Fiquei parado lá, tentando desesperadamente continuar a conversa. Tinha tanta coisa que eu ainda queria saber, e Amunategui era o mais perto que eu tinha chegado de falar diretamente com alguém realmente afiliado à Mossack Fonseca.
Eu queria perguntar para ela sobre pessoas específicas ligadas à Mossack Fonseca – empresas de fachada incorporadas do governo americano, registros judiciais, investigadores internacionais e meu ano de pesquisa: Billy Rautenbach, um suposto bagman de Robert Mogabe, o comandante de longa data do Zimbábue; Yulia Tymoshenko, ex-primeira-ministra ucraniana e uma oligarca apelidada de “princesa do gás”; Beny Steinmetz, um bilionário israelense que teria usado uma empresa de fachada, incorporada pela Mossack Fonseca nas Ilhas Virgens Britânicas, para pagar suborno à esposa do ditador homicida da Guiné, onde Steinmetz conseguiu uma grande concessão de mineração. Eu até queria falar com ela sobre as páginas da Mossack Fonseca no Facebook e no Twitter, que postam fotos dos beneficiários sorridentes das contribuições de caridade da firma e platitudes de figuras como Thomas Edison e Dr. Seuss (“Hoje, você é você! Isso é mais verdade que a verdade!”).
Mas Amunategui não disse mais nenhuma palavra depois de anotar minhas informações pessoais. Prometeu que passaria tudo para o advogado dela. Ela nem se importou em me escoltar até a porta: simplesmente entrou em seu escritório, sentou a uma mesa coberta de folders e pacotes da FedEx e pegou o telefone. Eu conseguia ouvi-la falando no corredor e, apesar de não conseguir entender o que ela estava dizendo, percebi que falava de maneira agitada, provavelmente com o tal advogado da firma (de quem nunca tive notícias). A recusa de Amunategui em responder minhas perguntas foi frustrante, mas não uma surpresa. Quando você trabalha para a Mossack Fonseca, há muitos segredos sujos para guardar; então, ficar de bico fechado é a parte mais essencial do seu emprego.
Ken Silverstein é um repórter da First Look Media.