Análise Diária de Conjuntura – 12/02/2016
A cobertura política está inteiramente tomada pela Lava Jato, e a Lava Jato virou uma investigação puramente político-partidária, com objetivo de realizar todo o tipo de devassa contra o PT e abastecer a imprensa de vazamentos cuidadosamente seletivos.
De vez em quando, a Lava Jato deixa escapar alguma informação contra a oposição, geralmente contra a vontade, mas nenhuma denúncia feita pelos delatores que não se encaixe estritamente na campanha contra o PT tem continuidade ou recebe atenção maior por parte da força tarefa.
Vários delatores já acusaram Aécio Neves, por exemplo. Mas a Lava Jato prefere investigar o sítio frequentado por Lula…
Hoje, a mesma coisa. As seções políticas dos jornalões vieram cheias de denúncias e ilações contra o PT.
A matéria contra João Santana na Folha é um exemplo típico de jornalismo pistoleiro, feito sob encomenda para atingir um objetivo político, auxiliado, como sempre, pela meganhagem.
Pior: o próprio Sergio Moro se aliou aos meganhas, visto que é o padrinho de uma situação em que as informações do processo são mantidas em conveniente sigilo. Sigilo para o público em geral e para a defesa, mas não para a mídia. O sigilo é fundamental para conferir poder para a mídia montar uma linha narrativa. Aí quando as informações vierem a público, a narrativa já estará consolidada na cabeça da opinião pública.
A reportagem da Folha contra João Santana, um texto repugnante, cheio de ilações, de verbos na condicional, de “suposto isso”, “suposto aquilo”, tem um objetivo bem claro: alimentar a narrativa golpista da mídia e a ação do PSDB contra as eleições em 2014, no TSE.
Não vai ter golpe.
Os golpistas serão derrotados novamente, antes do primeiro semestre. O golpe via TSE não vingará porque teria de engolfar o PMDB, e seria ainda mais traumática que o impeachment, porque mais covarde, mais autoritário, deixando o país ingovernável.
Para o PT, um golpe hondurenho seria até útil politicamente, porque sairia como vítima – vítima real – de um processo golpista, o que lhe daria uma aura heroica que poderia assegurar seu futuro político por várias décadas.
Mas seria ruim para o Brasil, manchando severamente nossa imagem, construída com tanta dificuldade, de uma democracia sólida, em que o direito político da maioria é respeitado acima de tudo, não sendo violado pelo covardia de meia dúzia de togados intimidados pela meganhagem midiática.
Em artigo malicioso na Folha, Bernardo Mello Franco diz que o TSE terá que escolher entre a tese de Sergio Moro ou a tese da dupla Dilma e Temer.
Não é nada disso.
O TSE terá que optar pelo justo. E o justo é que o resultado das urnas, o voto da maioria, de 54 milhões de eleitores, deve prevalecer sobre qualquer teoria oportunista defendida por derrotados.
A tentativa de tapetão judicial promoveu a união política – meio forçada, mas nem por isso menos sólida e interessante – entre Michel Temer, presidente do PMDB, e Dilma Rousseff. Ambos agora estão no mesmo barco, o que debilita um bocado uma oposição que contava com a divisão das forças governistas para reinar.
Esse é ponto-fraco dos golpistas, quase todos os instrumentos da democracia tendem em favor da defesa do resultado das urnas. Quanto mais os golpistas se agitam, mas eles se afogam no mar de suas contradições.
Eles precisam provocar caos econômico, revolta social. Ou seja, para derrubar a presidente, precisariam se tornar quase revolucionários, mas aí desperteriam forças que eles não querem, de maneira nenhuma, despertar. As figuras mais esclarecidas do grande empresariado já sabem disso. Os americanos, que já viram de tudo em seus mais de três séculos de democracia, sabem disso. Por isso muitos empresários e os americanos, ao contrário de outras épocas, não estão interessados num golpe aqui.
Um golpe abriria uma caixa de pandora que não seria fechada tão cedo. Se vale tudo para derrubar governante, não o faremos para cumprir agendinha neoliberal para beneficiar os nababos, como querem os tucanos. Se for para derrubar o governo, então será para fazer uma revolução de verdade.
Como os conservadores, alçados subitamente ao poder, sem legimitidade, sem votos, poderão conter as massas insatisfeitas?
Para isso existem movimentos sociais organizados, para canalizar e civilizar a revolta, de maneira que ela não se desencaminhe dos trâmites democráticos.
Há muito os movimentos sociais poderiam, por exemplo, pegar em armas.
Mas não. Eles escolhem o caminho das reinvindicações pacíficas, democráticas.
Um golpe romperia brutalmente esse pacto de confiança, delicado, frágil, contraditório, entre as elites e as massas.
Em outros tempos, a oposição teve de apelar para violentíssima repressão, numa onda crescente de truculências, praticando tortura, censura, assassinato político, proibindo qualquer tipo de reunião, aterrorizando a sociedade – sempre com auxílio e apoio das mesmas empresas de mídia que hoje se arvoram, hipocritamente, paladinas da liberdade.
Se a oposição repetir essa fórmula, explodirão o país, e nos transformarão em motivo de vergonha para o resto do mundo, após os anos em que fomos o orgulho do planeta, sob a gestão Lula, por causa do admirável e acelerado processo de ascensão social que promovemos.
Não, não podem fazer isso, porque não combina com os dias de hoje, mais transparentes em tudo.
A tese de Temer, que é a mesma de Dilma, é simples e lógica como uma rocha: as doações de campanha para Dilma foram registradas, carimbadas, protocoladas. É caixa 1. Criminalizar o caixa 2, tudo bem. Agora… criminalizar o caixa 1, é ridículo.
Ainda mais que Aécio recebeu ainda mais dinheiro, das mesmas empreiteiras às quais se acusa de terem doado ao PT como propina.
Como assim, propina? As empreiteiras sabiam que o PT venceria as eleições presidenciais? Não.
Além do mais, a tese embute um teoria absolutamente bizantina, para não dizer surreal: a de que as empreiteiras estavam mancomunadas para manter o PT no poder ad eternum.
Ora, a própria imprensa já vazou que executivos de algumas empreiteiras postavam mensagens nas redes sociais em favor de Aécio Neves.
As empreiteiras doam dinheiro para ambos os lados, tentando manter as boas relações com o vencedor das eleições, seja qual for.
Apenas o risco de golpe já provoca imenso estrago na economia, e a culpa recai, mais uma vez, numa imprensa historicamente golpista e que, em caso de golpe, terá feito justiça à sua fama, aliada aos meganhas da hora, um punhado de procuradores ultracoxinhas, com apoio expresso de um juiz ultratucano, sob o olhar intimidado ou cúmplice de outros juízes.
A “força-tarefa” da Lava Jato está prevaricando, manipulando uma investigação para agir de maneira criminosa, pautando a mídia a partir de “indícios” sem base alguma.
É óbvio que, na atual conjuntura, apenas a publicação da matéria já é uma condenação política em si.
A força tarefa “vê indícios”?
Como assim?
A reportagem não traz uma mísera informação sobre quais seriam estes indícios, a não ser que João Santana tem contas no exterior, contas não secretas, declaradas, porque ele presta serviços a vários países, como todos sabem.
Diz a matéria que João Santana fez campanhas políticas onde a Odebrecht tem obras. Ora, a Odebrecht tem obras em vinte e um países! E é lógico que tanto ela como Santana tendem a operar em países onde há abertura para a venda de serviços brasileiros.
A Lava Jato não apenas tenta criminalizar a política, como também o marketing?
Não tenho nenhuma simpatia por João Santana, mas ele é um cidadão brasileiro de talento que está vendendo seus serviços para o exterior, ou seja, trazendo recursos para o país. Não é um procurador coxinha fazendo de tudo para sabotar a economia nacional.
Hoje, no Valor, vemos uma série de notícias que desmente cabalmente a narrativa vira-lata, patrocinada pela grande mídia, de que o mundo estaria muito bem, e que todos os nossos problemas derivam-se exclusivamente de nossa incompetência.
Os mercados estão derretendo e quase todas as principais economias do mundo tem fundamentos menos sólidos do que os do Brasil. Tem menos reservas, tem mais dívidas, suas taxas de juros estão negativas (ou seja, não tem mais o que fazer neste sentido).
O Brasil precisa, por sua vez, vencer o vira-latismo e apostar no crescimento e no combate ao desemprego.
Ainda no Valor, há uma matéria sobre o Banco Central americano (Fed), que traz alguns depoimentos da presidente da instituição, Janet Yellen. Ela afirma que o “Fed fará o que for necessário para cumprir seus mandatos de inflação estável e pleno emprego”.
Ou seja, o Banco Central americano não age apenas contra a inflação. A sua política está atrelada ao emprego.
Aqui, não.
Aqui, o Banco Central não pensa no emprego e os economistas neoliberais defendem abertamente aumento do desemprego como estratégia para melhorar a economia.
É algo que lembra muito os problemas que alguns navios negreiros enfrentavam em sua dura travessia do atlântico, trazendo escravos da África para o Brasil. Quando havia problemas de navegação, o capitão apelava para uma solução simples: livrar-se do peso excessivo, lançando ao mar dezenas, quiçá centenas, de seres humanos.
Conforme o tempo passa, a hipocrisia midiática se torna mais gritante. A revista Forum revelou que FHC acaba de comprar, de presente, para sua namorada, um apartamento de 1 milhão de reais. Tudo bem. Não há crime nisso. Na reportagem da Forum, porém, descobrimos que FHC mora num apartamento de 450 metros quadrados, num bairro nobre de São Paulo.
E a mídia fazendo aquele carnaval todo em cima de um triplex de 290 metros quadrados, num prédio fulero em Guarujá, e que, diga-se de passagem, não é do Lula!
A Camargo Correia pode fazer estrada apenas para melhorar o acesso à fazenda do FHC. Pode fazer um aeroporto ao lado desta fazenda, usado exclusivamente por familiares de FHC. E isso DURANTE o mandato de FHC, não depois. A filha de FHC pode trabalhar sete, oito anos, no Senado como funcionária fantasma. A filha de Serra pode ser citada na Forbes como sócia do homem mais rico do Brasil.
FHC pode frequentar, praticamente morar por um tempo, um apartamento de 20 milhões de reais em Paris que pertence a um sócio enredado em várias tretas.
Lula? Lula não pode nem visitar um apartamento que pensava em adquirir em Guarujá.
Não pode nem frequentar um sítio em Atibaia…
A mídia faz de tudo, com um sucesso relativo e com o qual ela se embriaga precocemente, para lançar suspeitas sobre fatos normais da vida. Visitar um apartamento que se deseja comprar? Normal, não? Para a mídia, é muito estranho. Então ela faz reportagens e mais reportagens, com depoimentos de gente que confessa ter visto o presidente visitar o apartamento. Só que o presidente jamais negou que o tenha visitado.
A mesma coisa vale para o sítio em Atibaia. Procura-se pintar o trivial com tintas sombrias. Lula jamais negou que frequentasse a propriedade. E aí, quando o presidente publica mais um texto dizendo que, sim, que frequentava o sítio, a mídia publica manchetes escandalosas, dizendo que “o presidente agora admite” que frequentava o sítio. A Época faz matéria sensacionalista, com informações “exclusivas” sobre quantas vezes Lula visitou o sítio…
É a mesma coisa que eu publicar no Cafezinho: “Exclusivo! FHC visitou 100 vezes o apartamento de seu amigo em Paris!”
O que que tem isso? Nada. Mas com a linguagem certa, o contexto bem ajeitado, ficará parecendo a revelação de um grande crime!
É uma guerra semiótica tocada por profissionais.
Dá até pena ver o governo, o PT e o próprio Lula tentando correr atrás do prejuízo.
O PT virou um partido dos tuitaços, um esforço bonitinho e simpático, mas insuficiente no embate político. Tanto que a mídia e oposição até permitem que o PT faça seus tuitaços tranquilamente, sem contraparte.
Enquanto isso a mídia constrói cuidadosamente, junto a seu exército de zumbis coxinhas, o ódio político a Lula, porque ele “frequenta” o sítio de um amigo em Atibaia, reformado por empreiteiras do “petrolão”.
A informação de que Lula visitou o sítio mais de cem vezes em pouco tempo deveria servir de atestado de simplicidade do presidente. Sim, porque ele poderia estar curtindo férias em praias suntuosas do Caribe, desfrutando de longas temporadas em hoteis de luxo em Londres, Paris e Hong Kong.
Afinal, segundo o coxinhato furibundo, ele não é o maior ladrão do Brasil?
Como assim ele prefere passar tanto tempo num sitiozinho fulero em Atibaia, cuidando da horta, preparando comida caseira, comprando pão na padaria, pescando numa canoa de lata?
A Lava Jato se tornou caricatural, porque ela parece ter perdido o foco. Uma hora investiga o triplex de Lula, dias depois esquece o triplex e já está no sítio frequentado por Lula; na semana seguinte “vê indícios” nas contas de João Santana, “marketeiro ligado ao PT”…
Onde querem chegar? Atiram para todo lado, como que desesperados para achar alguma coisa contra Lula, contra o PT. Não acham aqui, não importa, abandona-se tudo, e parte-se para outra.
E tudo isso – milhões de reais em helicópteros, jatinhos, diárias de hotel – bancado com nosso dinheiro, em plena crise econômica?
Não fariam melhor combatendo os grandes sonegadores, incluindo aí a Rede Globo?
A teoria de que o caldo pode ter entornado é arriscada, porque a truculência da meganhagem judicial não tem limites quando é chancelada pela mídia. Procura-se implementar uma justiça política inteiramente centrada no arbítrio, na publicidade opressiva, na intimidação midiática.
Eles não são bobos, além disso. Quando o caldo se encontra prestes a entornar, eles vazam uma delaçãozinha contra um tucano, apenas para diminuir o fogo.
Mas nenhuma denúncia contra a oposição é analisada em profundidade.
É coisa de profissional.
De bandidos.