por Fernando Brito, no Tijolaço
Não há como escapar.
Ou a delação de Nestor Cerveró é um maço de papel imprestável, onde ele fala de casos de corrupção a torto e a direito mas sem apresentar qualquer indício que possa levar à responsabilização dos corruptos ou os “vazamentos” de sua confissão foram expurgados dos detalhes que o permitissem.
Partindo do princípio de que os repórteres do Estadão e da Organizações Globo, que divulgaram, coincidentemente ambos hoje, o teor da delação, a primeira hipótese deixa muito mal aos senhores promotores – que a negociaram – e ao juiz Moro, que a homologou.
Porque como é que se vai reduzir pena de quem roubou e se dispõe a delatar com – ao menos em parte – com informações vagas, genéricas e sem elementos fáticos para sustentar aquilo que diz?
Pois enquanto estamos a esperar que suas excelências dêem a conhecer não pedacinhos, mas o cartapácio de acusações do ex-diretor-ladrão, ficamos, para dar serventia ao pesado Houaiss que me habita a estante, na louçania de linguagem com que os dois jornais se esmeraram em descrever a acusação de que “a venda da Perez Companc (à Petrobras) envolveu pagamento de propina no valor de US$ 100 milhões ao governo de Fernando Henrique Cardoso”.
O verbo é o mesmo, “cita” que, segundo o dicionário é ” citar é “transcrever, referir ou mencionar como autoridade ou exemplo ou em apoio do que se afirma” ou, neste caso, “mencionar; fazer referência a”.
Bem diferente, claro, de “relata”, aponta”, “revela” ou, como seria de esperar numa delação, “delata”.
Como foram os títulos usados quando as menções de Cerveró foram a Jaques Wagner, tão pouco detalhadas – ou menos, porque nem o nome da empreiteira que teria doado recursos ao candidato diz – quanto no caso dos US$ 100 milhões (ou R$ 1 bi, com a correção de 2002 para cá).
A Fernando Henrique, cita-se.
O português é mesmo a bilaquiana “última flor do Lácio, inculta e bela/ És, a um tempo, esplendor e sepultura”!