As armadilhas midiáticas por trás da Lava Jato

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Análise Diária de Conjuntura – Tarde – 05/11/2015

Por Miguel do Rosário, editor do blog.

O vazamento de novos trechos da delação de Carlos Rocha, o Ceará, em que ele diz ter ouvido Alberto Yousseff mencionar o nome do ex-ministro da Saúde, Alexandre Padilha, como eventual beneficiário de um esquema de propinas ligadas à Labogen, empresa de Alberto Yousseff, tem uma utilidade importante: repor à Lava Jato em seu devido lugar, que é o de servir de fornecedor de conteúdo para detonar o PT. [/s2If]

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O mesmo delator também ouviu sobre propinas dadas à Aécio Neves. Aliás, o próprio Yousseff, um dos delatores centrais da Lava Jato, afirmou que também “ouviu falar” que Aécio Neves ganhava algumas centenas de milhares de dólares por mês num esquema entre a Bauruense e a Furnas.

Nunca existiu uma conspiração mais fácil de ser montada. Pega-se um punhado de delatores, espreme-se seus depoimentos a custa de ameaças sem fim à sua liberdade. Eles não precisam provar nada. Basta afirmarem que ouviram dizer e pronto: os estamentos golpistas podem fazer o joguinho sujo com a imprensa, vazando isso ou aquilo conforme as conveniências.

Vale até vazar, de vez em quando, um podre tucano, apenas para legitimar outros vazamentos e outras delações.

Os petistas caem como patinhos em qualquer armadilha. Qualquer denúncia contra o PSDB, e eles já se jogam, furiosamente, no abismo do punitivismo penal-midiático.

A Lava Jato serve para respaldar a grande mídia. Os vazamentos se dão apenas para um conjunto muito seleto de jornais: Globo, Folha, Estadão. Os proprietários das informações podem barganhar e fazer o jogo que quiserem. As próprias delações se tornaram objeto de brincadeira de mau gosto de mídias e polícias.

Um dia ou dois atrás, a Folha noticiou que um alto executivo de uma empreiteira havia se tornado motivo de chacota de policiais federais por causa de suas mensagens privadas abordando suas idas frequentes à um prostíbulo de São Paulo.

Estamos diante do que o jurista Pedro Serrano chamou de novo estalinismo. Dessa vez é um estalinismo midiático-judicial, em que até mesmo informações íntimas dos cidadãos são usadas descaradamente para humilhar, intimidar e manipular cidadãos, forçando-os a fazer o jogo das autoridades repressivas.

O sujeito afirma ao juiz que ouviu dizer isso e aquilo e pronto, está livre!

A opinião do vulgo, por sua vez, é facilmente manipulada pela mídia, que estabelece uma narrativa demolidora contra o réu.

Ah, finalmente estão prendendo ricos e poderosos, diz a mídia, retomando o velho populismo golpista que sempre a caracterizou. Foi assim em 1954, em 1964, e ao longo de toda a sua existência.

E daí a mídia, que jamais fez qualquer denúncia contra os arbítrios de um judiciário que sempre prendeu antes de investigar, de uma polícia que sempre matou antes de perguntar, uma mídia, enfim, que nunca denunciou as truculências assassinas do Estado, sente-se à vontade para oferecer aos pobres, vítimas constantes dessa violência, o espetáculo de sacrifício de alguns empresários.

A truculência estatal precisa mudar um pouquinho para continuar o que sempre foi.

Discutir o aprofundamento de valores democráticos, consolidar as liberdades civis contra a violência do Estado, isso ninguém quer fazer.

E Pinheirinho, por que nunca houve um documentário, no Fantástico, sobre o episódio, um exemplo grotesco de arbítrio judicial?

Uma juíza de São Paulo, uma coxinha de direita, determinou a desocupação de um terreno vazio, onde milhares de famílias haviam se estabelecido há vários anos, em benefício de Naji Nahas, fraudador da Bolsa do Rio, e dono do terreno.

Todas as ditaduras foram assim.

A ditadura midiático-judicial que se prepara não só no Brasil, mas em toda a América Latina, é igual. A ditadura militar brasileira perseguiu e destruiu inúmeros empresários que não pertenciam ao núcleo duro do golpe. Alguns empresários ficaram muito ricos com o golpe, como os barões da mídia.

Muitos outros, porém, foram destruídos: TV Excelsior e Panam são os exemplos mais notórios. Há muitos outros.

O nosso Judiciário está por trás da violência que nos assola, porque à violência das ruas se soma a violência do Estado. As polícias brasileiras estão entre as mais assassinas do mundo, e tudo isso é chancelado por um judiciário que jamais iniciou campanhas em favor da vida e da liberdade.

O judiciário não pune a violência assassina do Estado. Juízes se tornaram sócios do Ministério Público, em seu objetivo de classe comum: subjugar pobres e políticos.

Quem tem de mandar no país são os grandes empresários proprietários de meios de comunicação.

Cada vez mais membros do judiciário se envolvem no lado mais sórdido da política, fazendo o jogo dos poderosos, dos violentos, da mídia, dos banqueiros, dos sonegadores. Os adversários: pobres, pretos e partidos de esquerda.

Cadê os grandes sonegadores? Essa é a grande pergunta que todos nós fazemos, e o que nos levou a ter tantas esperanças (ingênuas) na Operação Zelotes.

A mídia conseguiu rebaixar a Zelotes, transformando-a numa conspiração vagabunda para pegar o Lula. Ao invés de dar sequência às investigações contra os grandes esquemas de sonegação, tornou-se mais uma seçãozinha midiática, uma sub-Lava Jato.

Entretanto, há um elemento que a mídia não consegue mais controlar: antes a mídia tinha a ditadura a seu favor, uma ditadura que conseguia sufocar o debate às custas de muita censura e violência. Hoje isso é bem mais difícil. Eles conseguem manter as mentiras no ar, através de táticas goebellianas de repetição, somadas à uma organização ao estilo máfia, em que nenhuma informação que trinque a narrativa coletiva é jamais veiculada.

Esse estilo mafioso já tinha ficado bastante claro durante o processo do mensalão, em que qualquer informação que atrapalhasse a narrativa golpista era bloqueada. Depois ficou ainda mais evidente com a denúncia da sonegação da Globo. O pacto de silêncio das grandes mídias acerca da sonegação foi algo sinistro.

Com a Zelotes, a mesma coisa.

Setores importantes da sociedade já entenderam que a mídia se tornou um partido político corrupto e violento, adepto da mentira, da manipulação, da violência judicial.

Falta apenas o próprio governo, vítima principal dessas manipulações, entender também isso e tomar iniciativas democráticas para oferecer à sociedade uma luz no fim do túnel.

Artigos exclusivos para a Folha, como fez Dilma, apenas reforçam o capital político dessas grandes mídias, deixando o governo refém de suas estratégias golpistas.

Agora, se a mídia é golpista e manipuladora, o governo é pusilânime. Não há nenhuma iniciativa visível, por parte do governo, para oferecer uma narrativa diferente à sociedade, como se PT e governo houvessem desistido, há muito tempo, de produzir conteúdo político. A direita produz conteúdo político, com orgulho. Criaram think tanks. Seus jornais fazem campanha diária. A esquerda brasileira ficou estagnada.

Hoje eu recebi email comercial do editor da Folha, Sérgio D´Ávila, em que ele dá o “resumo” das notícias de hoje: o governo Haddad fracassou em sua principal bandeira, transporte urbano, e esclarece que os hotéis cheios em todo o Brasil, durante o Réveillon, não significam nada: a crise é terminal, definitiva, e pronto.

Sobre o impeachment, talvez fosse o caso de citarmos Thomas Jefferson, na compilação feita por John Dewey:

A vontade da sociedade, quando enunciada pelo sufrágio universal, é tão sagrada como se fosse unânime. Ou seja, os 54 milhões de votos de Dilma Rousseff correspondem à vontade de uma população de 205 milhões de habitantes. Essa é a lei suprema da democracia.

A onda conservadora que cresce ao sul do continente (na contramão do progressismo que avança no norte, nos Estados Unidos) já deixou claro: é uma onda lastreada nos grandes grupos de mídia, que são a fonte legitimadora de todas as teses neoliberais. Para se ter uma ideia, a coluna de Ancelmo Gois agora abre, todos os dias, com notinhas laudatórias ao ex-ministro Levy. Levy em NY, Levy em Miami, Levy em tal lugar. Sempre na figura de bom moço, gente boa, pai de família, bom marido, etc.

É uma onda que, como todas as ondas, vai refluir, cedendo a um outro movimento, infinitamente maior, que é o crescimento da tomada de consciência política dos povos latino-americanos, um movimento que, do ponto-de-vista da sociedade civil e da cultura política, está apenas em seu início, mas avança rapidamente.

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Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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