Por Lia Bianchini, repórter especial do Cafezinho
Em tempos de emergências, a contra hegemonia parece sobressair-se. É nítido, já há um bom tempo, que os veículos tradicionais de imprensa brasileiros representam muito pouco as ideias da população como um todo. Porém, em momentos críticos da realidade política recente do Brasil, tornou-se mais evidente a necessidade de outra comunicação.
Nas jornadas de junho de 2013, repórteres dos principais veículos tradicionais, como a Globo, foram expulsos das manifestações. Grande parte da população que queria acompanhar as novidades do cenário buscava informações na internet ao invés de recorrer à televisão. Até então, um canal de TV ou um jornal impresso não haviam sido tão desacreditados quanto durante aquele período.
Mais recentemente, as ocupações das escolas de São Paulo mostraram a urgência de narrativas marginais. A cobertura dos acontecimentos feita pela mídia hegemônica distorcia os fatos, em uma nítida intenção de criminalizar a juventude que protestava por seu direito à educação. Não por acaso, nas escolas ocupadas por estudantes, parte da nova “grade curricular” dava foco na comunicação.
No último dia 8, em uma das mesas do Emergências, a jornalista Gloria Muñoz, diretora do Desinformémonos, definiu bem qual é a crise do jornalismo em uma pergunta: “estamos fazendo jornalismo ou propaganda?”
É importante notar que não há crivo ideológico na questão. Obviamente, a mídia hegemônica brasileira alinha-se aos ideais neoliberais de direita. Porém, a provocação feita por Muñoz cabe a qualquer veículo que se reivindique jornalístico. E, mais: deve ser feita por qualquer pessoa que se diga “jornalista”.
O jornalismo defendido pela mexicana é o que ela chama de “periodismo de abajo” (traduzindo, grosso modo: jornalismo de baixo), que, antes de qualquer coisa, pergunta-se: “o que comunicamos e para quem comunicamos?”. É um jornalismo que inova a forma de aplicar as clássicas perguntas ensinadas nas salas de aula das faculdades (o quê? Quem? Quando? Onde? Como? Por quê?), trazendo o foco das indagações para a própria pessoa que as faz.
O “jornalismo de baixo” é o que duvida de si mesmo antes de ousar duvidar de outro alguém. E, talvez, seja exatamente esse tipo de comunicação que falte na mídia brasileira, tão segura de sua indispensabilidade.
E se formos dispensáveis? E se estivermos comunicando para ninguém além de nós mesmos? Ou, pior: e se não estivermos comunicando nada?
Em tempos de nervos aflorados na política nacional e de um cenário intrigante (e instigante) para pessoas que fazem jornalismo, seja profissionalmente ou não, é necessário refletir sobre o próprio exercício de comunicar. Como bem enfatizou Gloria Muñoz, “fazer jornalismo é aceitar a responsabilidade da ideia que você veicula”. E, superando o mito da imparcialidade, é preciso ter ciência de que cada letra teclada para uma matéria não compõe palavras soltas, mas sim um amontoado de fagulhas que, dependendo do local onde são atiradas, podem iniciar um incêndio.