Segue uma notícia que o oligopólio da mídia não debate: as “Metas do Milênio”. O motivo? Porque o Brasil deu show.
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As Metas do Milênio
Termina agora, em dezembro, o prazo para 191 nações (entre elas, o Brasil) cumprirem as chamadas “metas do milênio”. As 8 metas estabelecidas pela ONU incluem a melhoria de indicadores de pobreza, educação, saúde e meio ambiente, em comparação com o ano de 1990. A avaliação da ONU é positiva: até mesmo os países mais pobres fizeram progressos. Na reportagem especial desta e da próxima semana, vamos fazer um balanço dos resultados do Brasil. Neste primeiro capítulo, a repórter Verônica Lima explica as metas e seus indicadores.
O balanço da atuação do Brasil em relação aos objetivos do milênio é positivo. O País atingiu quase todas as metas e ainda se impôs desafios além daqueles propostos pela ONU. Na verdade, o mundo todo está um pouco melhor graças aos esforços em torno das metas de desenvolvimento do milênio. Quem diz isso não sou eu, claro, é a Ieva Lazareviciute, do PNUD, Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento.
“A adoção dos ODM foi um grande avanço no sentido de ajudar a focar os esforços em algumas metas concretas. Até então se observava que o pessoal estava trabalhando muito com a temática sem necessariamente conseguir focar e estrategiar para onde tem que ser direcionado o investimento ”.
Mas isso não quer dizer que estejamos vivendo num mundo cor-de-rosa. Em todas as metas há muito, mas muito ainda a ser feito. Mesmo porque, na maioria dos casos, as metas eram muito básicas, buscando oferecer apenas condições mínimas para uma existência digna, como acesso a água, alimento e até banheiro. Quem fala disso é o Rafael Osório, do Centro Internacional de Políticas para o crescimento inclusivo do Ipea. O Ipea, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, esteve envolvido com os relatórios de acompanhamento das metas que o Brasil produziu ao longo dos 15 anos dos Objetivos do Milênio. Ao todo foram cinco relatórios, sendo o mais recente, de maio de 2014. E os resultados que vamos apresentar ao longo da série de reportagens estão nesse último relatório e também em um relatório da ONU divulgado em julho de 2015. Bem, vamos, primeiro, ouvir primeiro a ressalva que o Rafael faz sobre as metas.
“Esses indicadores são feitos para serem comparados e levantados no maior número de países possível para a maior parte da população mundial possível. E aí a gente tem que lembrar que há países que estão muito aquém do nível de desenvolvimento do nosso ainda e que não têm muita capacidade estatística, produção regular de dados. Então você tem que manter essas medidas num nível um tanto quanto rudimentar para você poder garantir que você vai conseguir tê-las num maior nível de países do mundo e que você vai conseguir compará-las em alguma medida. Então coisas mínimas são essas: não viver com menos de 1,25 por dia”.
O exemplo da pobreza extrema é mesmo muito bom para entender até onde os objetivos do milênio queriam chegar. A primeira meta era: reduzir pela metade o número de pessoas vivendo com menos de 1,25 dólar por dia. Em 2012, isso correspondia a 71 reais por mês. Estamos falando, portanto, de um mínimo de sobrevivência.
Mas isso não quer dizer que o Brasil tenha se contentado com os mínimos. Em muitos casos, o País se impôs metas muito mais ambiciosas ou metas específicas para a sua realidade. Ainda falando sobre a fome: a meta era reduzir a pobreza extrema à metade do nível de 1990. Essa meta, o Brasil alcançou em 2005. A partir daí, foi estabelecendo metas cada vez menores, chegando em 2015 com um sétimo do que tinha em 1990. Além disso, segundo o Rafael Osório, do Ipea, houve avanço também em outras faixas de renda.
A linha de pobreza que melhor capta esse movimento de melhoria é consideravelmente mais alta: é a linha de quatro dólares por dia. Tinha muita gente e tem muita redução. (…) Importante é ver a tendência, e a tendência é de queda constante da pobreza. O Brasil deu um salto em termos de renda na década passada que foi uma coisa impressionante, nosso padrão de vida passou para outro patamar”.
Agora, para contextualizar e entender os objetivos do milênio, é preciso dar mais uma explicação: a meta era melhorar os indicadores sociais em relação ao ano de 1990. Por exemplo: em 1990, 1,9 bilhão de pessoas vivam em condições de extrema pobreza. Em 2015, o número havia caído para 836 milhões. Portanto, a meta de reduzir pela metade a extrema pobreza foi batida. Ainda assim, uma em cada oito pessoas no mundo vive em extrema pobreza. São 14% da humanidade! Mas antes tínhamos metade da população mundial nessas condições. Portanto, quando o passivo é muito grande, qualquer avanço, ainda que em níveis mínimos, traz impactos positivos.
É o que defende a deputada Margarida Salomão, do PT mineiro. Ela dá o exemplo da educação, em que há críticas sobre a imposição de metas apenas quantitativas, ou seja, que tratam apenas do acesso à escola, sem exigir melhorias relacionadas à qualidade do ensino.
“O avanço quantitativo no Brasil não é uma conquista trivial, porque nós somos um país tardio na postulação de metas educacionais. Em 1950, metade da população era analfabeta. Esses avanços que nós hoje acumulamos decorrem em grande parte da redemocratização brasileira, em que o movimento da sociedade colocou o acesso a educação como meta prioritária. Evidentemente, quando você muda a quantidade, você muda a qualidade, não necessariamente para pior”.
Resumindo: as metas do milênio foram um bom começo, mas a caminhada ainda será muito longa até termos o mundo com que todos sonhamos.
Produção — Lucélia Cristina e Cristiane Baker
Trabalhos técnicos — Carlos Augusto de Paiva
Edição — Marcio Sardi
Reportagens — Verônica Lima