O presidente da Câmara atropelou ritos, regimentos e leis, como é de seu feitio, para aprovar a comissão do golpe que ela queria.
O procedimento correto seria aprovar uma comissão cujos membros fossem indicados pelas lideranças partidárias.
Cunha criou a figura da “chapa avulsa”, pela qual lideranças do PSDB e DEM podem indicar, por exemplo, que deputados do PMDB comporão a comissão que analisará o impeachment.
E, numa prova de que o golpe se torna cada vez mais sinistro, impôs o voto secreto.
Por que secreto?
O impeachment não era um clamor das ruas?
Por que então os deputados quiseram esconder seu voto?
O ministro Luiz Fachin, do STF, no entanto, suspendeu os atos da comissão do impeachment, pelo menos até o dia 16, quando o tema será analisado pelo plenário do tribunal.
É uma derrota para Eduardo Cunha.
Vários leitores ressalvaram, todavia, que ele – Cunha – também pode ter pensado nisso.
A oposição agora quer postergar o impeachment, para dar tempo para a mídia produzir mais manipulação.
Ou seja, ao arrastar o impeachment até o ano que vem, Cunha também ganhou.
Tudo que possa prejudicar a economia brasileira, trazendo sofrimento aos trabalhadores, aprofundando a crise política, beneficia Cunha.
O país, cuja economia precisa se recuperar, está à mercê de um bandido.
Cunha usa o país inteiro como instrumento de chantagem para não ser preso e não ser cassado.
E a oposição, embriagada pelo furor maligno do golpe, vai atrás de Cunha, na direção do maior abismo moral de que se tem notícia nas últimas décadas.
Mesmo na mídia, notam-se já fissuras no apoio ao golpe.
O apoio ao golpe vem sobretudo da Globo.
A Folha, por outro lado, principal jornal de São Paulo, não está conseguindo mais segurar a crescente insatisfação de seus colunistas com a maneira suja e ilegal como o processo vem sendo conduzido.
Bernando Mello Franco, disciplinado colunista da Folha, escreveu um texto hoje em que, suponho, foi o mais longe possível nas críticas ao golpe:
(…) “o impeachment nasce com base frágil. Até que se demonstre o contrário, Dilma não praticou crime de responsabilidade. As chamadas pedaladas fiscais são reprováveis, mas não justificam a interrupção do mandato presidencial. Se fosse assim, FHC e Lula teriam ido para casa mais cedo.
Em países divididos como o Brasil pós-2014, a estabilidade da democracia depende do comportamento dos derrotados. A oposição já atacou a urna eletrônica, estimulou teorias conspiratórias e tentou diplomar Aécio Neves no tapetão. Ao abraçar Cunha e seu impeachment duvidoso, arrisca-se a fraturar um sistema político que já está desacreditado.
Não há dúvida de que Dilma mentiu na campanha, montou uma equipe medíocre e faz uma gestão abaixo da crítica. Nada disso, no entanto, justifica cassá-la. Para trocar governantes ruins, o caminho é o voto. “
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Ao darem curso a mais este atentado contra a democracia, Cunha e seus cúmplices do PSDB não fazem mais do que cavar uma grande fossa na qual serão enterrados vivos em pouco tempo – porque se o golpe for derrotado, eles serão derrotados; se o golpe vingar, eles serão… culpados.